Gilberto Melo

Brasil, império dos bancos

O Senado da República Federativa do Brasil, em meio a atoleiro de escândalos e corrupção sem fim, acaba de chancelar a conversão da Medida Provisória nº 459/09 em lei.
 
Essa MP, de autoria do governo do presidente Lula, tem por objetivo a construção e financiamento bancário de um milhão de moradias à população de baixa renda (três salários mínimos), por meio de investimento de 34 bilhões de reais. Trata-se do Programa Minha Casa, Minha Vida – PMCMV.
 
Com esta aprovação, o Senado Federal consentiu com a legalização da prática do anatocismo pelos bancos e demais integrantes do Sistema Financeiro Nacional. Isto está acontecendo, graças ao acolhimento pela Câmara dos Deputados, da Emenda nº 259 de autoria do deputado federal Fernando Chucre (PSDB/SP), que retificou a redação do artigo 74 da MP nº 459/09: “acrescenta, onde couber, dois dispositivos que alteram respectivamente o art. 4º do Decreto nº 22.626, de 1933, e o art. 591, do Código Civil, dispondo sobre a cobrança de juros em empréstimos e financiamentos”.
 
Daqui por diante, se o presidente Lula não vetar esta excrescência financeira, os juros de todos os financiamentos bancários serão pagos pelo regime de exponencialização. Em outras palavras, o consumidor bancário estará obrigado a pagar juros dos juros que está pagando ao banco! Verdadeiro absurdo!
 
Mais uma vez fica nitidamente claro para a população brasileira esta triste realidade: Brasil, império dos bancos! Aliás, título de livro que estamos escrevendo a passos largos.
 
Não é de hoje que os bancos vêm tentando aprovar a cobrança de juros de juros. Conseguiram convencer e foi incluído na Medida Provisória nº 1963-17 do ano de 2000, que trata do Caixa do Tesouro Nacional, o artigo 5º, com seguinte redação: “nas operações realizadas pelas instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional, é admissível a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano”. Modo perverso e traiçoeiro de legislar, pois engana a todos, ao incluir matéria totalmente estranha (anatocismo) no bojo desta MP nº 1963-17/00.
 
Também por intermédio da Lei nº 10.931/04, que disciplina oito matérias distintas – portanto, absolutamente inconstitucional por ofensa ao processo legislativo (CF/88, artigo 59, incisos I a VII c/c Lei Complementar 95/98, artigo 7º, inciso I a III) – ao estabelecer a cédula de crédito bancário com cobrança dos juros remuneratórios com prazo de capitalização a bel prazer dos bancos (artigo 28, § 1º, inciso I).

Registre-se que este título de crédito foi concedido aos bancos, porque vinham suportando verdadeira enxurrada de improcedência nas ações de execução de cheque especial, conforme Súmula nº 233/STJ: “o contrato de abertura de crédito, ainda que acompanhado de extrato da conta-corrente, não é título executivo”.
 
O artigo 74 da MP nº 459/09, se não for vetado pelo presidente Lula, imporá situações de agonia e endividamento célere à população dependente de acesso ao crédito (bem público). Os tribunais que já estão abarrotados de processos, em poucos anos não suportarão avalancha de ações judiciais que sobrevirão desta inconsequente aprovação legislativa.
 
Se sancionado o artigo 74 como está, não vingará diante do ordenamento jurídico vigente protetivo das relações de consumo, pois é flagrantemente inconstitucional e ilegal, segundo artigo 5º, inciso XXXII, da Constituição Federal de 1988: “o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor” e artigo 51, inciso IV, da Lei nº 8.078/90 (CDC), pelo fato de que o anatocismo não traduz relação de consumo: cobra sem nada oferecer em troca ao consumidor bancário. Excessividade pura!
 
O presidente da República precisa avaliar o que fará com o povo brasileiro dependente do crédito. Não deve esquecer o que seu ministro da Fazenda, Guido Mantega, prometeu à sociedade: acabar com a moleza dos bancos (*).
 
A conta dos juros elevados e manipulados passou dos limites já faz muito tempo, o consumidor bancário não aguenta mais pagá-la.

Autor: Mauro Sérgio Rodrigues

Fonte: www.espacovital.com.br