Gilberto Melo

Da inconstitucionalidade do art. 5º da medida provisória 2.170-36/2001 que autoriza a capitalização de juros

É sabido que o Superior Tribunal de Justiça tem entendido que a capitalização mensal dos juros é legal, desde que expressamente pactuada, nos contratos bancários ASSINADOS após o a edição do artigo 5º da Medida Provisória 2.170-36/2001. Todavia, a Súmula 121 do STF proíbe a capitalização de juros mesmo que convencionada, sem falar que tal tema é peculiar ao Sistema Financeiro, por disposição expressa do art. 62, §1º, III, da CF, ou seja, tal matéria somente pode ser tratada por LEI COMPLEMENTAR E NÃO POR MEDIDA PROVISÓRIA.

Ressalta-se, ainda, o fato que o art. 5º da Medida Provisória 2.170-36/2001, É TOTALMENTE INCONSTITUCIONAL pelo fato da mesma ter sido editada tratando tema de matéria antiga, ou seja, sem qualquer urgência, pois tal fato há anos é debatido no Judiciário, não podendo esquecer que a matéria foi encaixada na medida provisória que aborda tema totalmente diverso da questão de juros.

Para por fim a questão deve-se frisar que a Medida Provisória acima informada vem sendo discutida pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, na ADIn 2.316-DF, sendo o relator o Min. Sydney Sanches e acompanhado pelo Ministro Carlos Velloso, no qual: votaram pela suspensão cautelar da eficácia do art. 5º, caput e parágrafo único, “por aparente falta do requisito de urgência, objetivamente considerada, para a edição de medida provisória e pela ocorrência do periculum in mora inverso, sobretudo com a vigência indefinida da referida MP desde o advento da EC 32/2001, com a possível demora do julgamento do mérito da ação“, sendo que a decisão final ainda encontra-se pendente de julgamento (1). Logo, a mesma não pode ser aplicada.

Há que se dizer ainda, que fora proferido Voto (2) recente do Ilustre Ministro Marco Aurélio acompanhando o voto do Ministro relator e esclarecendo ainda:
Inicialmente, que a medida provisória sob análise teria sido apanhada com várias outras pela nova regência da matéria decorrente da EC 32/2001, a qual prevê, em seu art. 2º, que as medidas provisórias editadas em data anterior a da sua publicação continuam em vigor até que medida provisória ulterior as revogue explicitamente ou até deliberação definitiva do Congresso Nacional. Asseverou ser necessário interpretar teleologicamente esse dispositivo, presente a regência pretérita – em que as medidas provisórias estavam sujeitas à vigência de 30 dias – e a atual – em que as medidas provisórias vigem por 60 dias, podendo ser prorrogadas por igual período. Diante disso, entendeu, além da problemática alusiva à falta de urgência, ante o tema tratado, não ser possível haver uma interpretação que agasalhe a vigência indeterminada de uma medida provisória, e conceber que um ato precário e efêmero – que antes era editado para vigorar por apenas 30 dias, e, agora, por 60 dias, com prorrogação de prazo igual – persista no cenário normativo, sem a suspensão pelo Supremo, passados 8 anos“.

E não é outro o entendimento dos Tribunais Pátrios, senão vejamos:
Apelação cível. Negócios jurídicos bancários. Ação revisional. Contratos de financiamento e de abertura de crédito em conta corrente (cheque especial). Possibilidade de revisão do contrato. (…) Capitalização de juros. A legislação vigente e a jurisprudência dominante permitem a capitalização apenas e, periodicidade anual, salvo legislação específica, que não é o caso em tela. A capitalização na forma disposta no art. 5º da Medida Provisória 2.170-36, de 23 de agosto de 2001, não se aplica às operações financeiras comuns, nas quais se enquadram os contratos bancários e de administração de cartão de crédito, tendo em vista que a jurisprudência do egrégio STJ fixou entendimento que o referido dispositivo legal destinou-se, tão-somente, a fixar regras sobre administração dos recursos do tesouro nacional. Vedada é, portanto, a capitalização diária ou mensal dos juros.” (TJ/RS, 10ª Câm. Cív., Ap. Cív. 70.021.995.790, rel. Pedro Celso Dal Pra, j. 22.11.2007, DJ 30.11.2007).

Civil e processual civil. Revisão de cláusula contratual. Código de Defesa do Consumidor. Aplicabilidade. Tabela Price. Capitalização mensal de juros. Capitalização mensal de juros deve ser afastada, eis que o art. 5º, caput, da Medida Provisória 2.170-36/2001, o qual estaria a legitimar tal prática, foi declarado inconstitucional, incidenter tantum, nos autos da argüição de inconstitucionalidade 2006.00.2.001774-7, deste eg. Tribunal de Justiça.” (TJ/DF, 4ª T., Processo 20.050.110.482.023-APC, Rel. Sérgio Bittencourt, j. 10.10.2007). (grifamos).

E assim já se manifestou o Egrégio Superior Tribunal de Justiça, no Acórdão sob a lavra do Eminente Ministro Carlos Alberto Menezes Direito no julgamento do REsp n.º 811.456/RS:
…a demora na apreciação de uma liminar em controle concentrado de constitucionalidade não pode causar prejuízo às partes hipossuficientes frente às instituições financeiras, quando já se mostra aquela Corte, pelo menos em parte, favorável à suspensão da vigência da norma. Reforça esse entendimento o julgamento da Reclamação n.º 2576, em 23.6.04, onde o Plenário da Corte Excelsa entende não ser necessário aguardar o trânsito em julgado de acórdão de ADin para que a decisão comece a produzir efeitos, pois no sistema processual brasileiro se permite o cumprimento de decisões judiciais em razão do poder geral de cautela sem que tenha ocorrido o transito em julgado ou o julgamento final da questão. Portanto, considero inaplicável a Medida Provisória 2.170-36/2001, porque presente posicionamento do Supremo Tribunal Federal favorável à sua inconstitucionalidade, evitando-se, assim, prejuízos aos consumidores“. (Grifamos).

Diz o acórdão da Reclamação (3) n.º 2576/04:
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. CUMPRIMENTO DA DECISÃO. 1. Desnecessário o trânsito em julgado para que a decisão proferida no julgamento do mérito em ADI seja cumprida. Ao ser julgada improcedente a ação direta de inconstitucionalidade – ADI nº 2.335-SC – a Corte, tacitamente, revogou a decisão contrária, proferida em sede de medida cautelar. Por outro lado, a lei goza da presunção de constitucionalidade. Além disso, é de ser aplicado o critério adotado por esta Corte, quando do julgamento da Questão de Ordem, na ADI 711-AM em que a decisão, em julgamento de liminar, é válida a partir da data da publicação no Diário da Justiça da ata da sessão de julgamento. 2. A interposição de embargos de declaração, cuja conseqüência fundamental é a interrupção do prazo para interposição de outros recursos (art. 538 do CPC), não impede a implementação da decisão. Nosso sistema processual permite o cumprimento de decisões judiciais, em razão do poder geral de cautela, antes do julgamento final da lide. 3. Reclamação procedente. (Destacamos).

E ainda, esse diploma legal (MP) afronta o artigo 192 da Constituição Federal, pois trata de questão que só poderia ser disciplinada por Lei Complementar, e padece do vício da ilegalidade, pois ao tratar da questão da administração dos recursos de Caixa do Tesouro Nacional, no artigo 5º fala sobre a possibilidade da cobrança de juros capitalizados, texto este destinado a regular o Sistema Financeiro em geral, o que é vedado pela Lei Complementar n.º 95/98, no seu artigo 7º.

O Artigo 192 da Constituição Federal com a redação que lhe deu a Emenda Constitucional n.º 40: “o sistema financeiro nacional, (…) será regulado por leis complementares que disporão…“. Portanto, percebesse que a medida provisória é totalmente inconstitucional, PRIMEIRO, POR FALTA DO REQUISITO DA RELEVÂNCIA E URGÊNCIA, SEGUNDO, POR AFRONTA DIRETA AO ARTIGO 192 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, E POR ÚLTIMO O ARTIGO 7º DA LEI COMPLEMENTAR 95/98.

A inconstitucionalidade do artigo 5º da Medida Provisória 2.170-36/2001, foi declarada por inúmeros Tribunais Pátrios senão vejamos:
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL:
ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. ART. 5º DA MEDIDA PROVISÓRIA N.º 2170-36. OPERAÇÕES REALIZADAS PELAS INSTITUIÇÕES INTEGRANTES DO SISTEMA FINANCEIRO. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS COM PERIODICIDADE INFERIOR A UM ANO.MATÉRIA PREVISTA EM LEI COMPLEMENTAR. ART. 192, CAPUT, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL COM A REDAÇÃO DADA PELA EMENDA CONSTITUCIONAL N.º 40. A matéria inserida em Medida Provisória que dispõe sobre “a administração dos recursos de caixa do Tesouro Nacional”, consolidando e atualizando a legislação pertinente, não pode dispor sobre matéria completamente diversa, cuja regulamentação prescinde de Lei Complementar. Declarada, incidenter tantum, a inconstitucionalidade do art. 5º, da Medida Provisória 2170-36.” (Tribunal de Justiça do Distrito Federal, Argüição de inconstitucionalidade suscitada na Apelação Cível n.º 20060020011774-7).

Civil e processual civil. Revisão de cláusula contratual. Código de Defesa do Consumidor. Aplicabilidade. Tabela Price. Capitalização mensal de juros. Capitalização mensal de juros deve ser afastada, eis que o art. 5º, caput, da Medida Provisória 2.170-36/2001, o qual estaria a legitimar tal prática, foi declarado inconstitucional, incidenter tantum, nos autos da argüição de inconstitucionalidade 2006.00.2.001774-7, deste eg. Tribunal de Justiça.” (TJ/DF, 4ª T., Processo 20.050.110.482.023-APC, Rel. Sérgio Bittencourt, j. 10.10.2007).

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RIO GRANDE DO SUL:
ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. APELAÇÃO CÍVEL EM AÇÃO DE REVISÃO CONTRATUAL DE CONTRATO BANCÁRIO. INCOMPATIBILIDADE DO ARTIGO 5º DA MEDIDA PROVISÓRIA N. 1963-17/2000, REEDITADA SOB N.2170-36/2001 COM A CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988. CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS NOS CONTRATOS BANCÁRIOS. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS DE URGÊNCIA E RELEVÂNCIA. MATÉRIA RESERVADA À LEI COMPLEMENTAR. AFRONTA AOS DIREITOS DO CONSUMIDOR. PROCEDÊNCIA DO INCIDENTE. (Arguição deInconstitucionalidade n.° 2007.059574-4, Órgão Especial, Relator Des. Lédio Rosa de Andrade, julgado em 16-12-2011, publicado no DJ n. 1112, em 10-3-2011).

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RIO DE JANEIRO:
Ação de revisão de cláusula de contrato de alienação fiduciária de veículo, com pedidos cumulados de obrigação de fazer, consignação em pagamento e declaração de nulidade de venda casada e de cláusula que prevê a capitalização de juros. Prática de anatocismo demonstrada no laudo pericial contábil produzido. Embora não se aplique às instituições financeiras a limitação dos juros no patamar de 12% ao ano, conforme entendimento consolidado na jurisprudência pátria, a cobrança de juros capitalizados é vedada nos termos da Súmula nº. 121, do Supremo Tribunal Federal. O verbete nº. 596, da Súmula do STF refere-se, exclusivamente, às taxas de juros e aos encargos cobrados por instituições financeiras, não se estendendo à capitalização de juros, que continua proibida, acorde à orientação da aludida Súmula nº. 121, que não exclui as instituições financeiras de sua incidência. A constitucionalidade da Medida Provisória nº. 2.170-36, de 23/08/01 encontra-se em discussão no STF, através a ADIn nº. 2.316-DF, já havendo sido proferidos dois votos no sentido da suspensão de sua eficácia. Decisão proferida pelo colendo Órgão Especial deste Tribunal de Justiça, na Arguição de Inconstitucionalidade nº. 2003.017.00010, que concluiu, por unanimidade, pela inconstitucionalidade do artigo 5º, da referida Medida Provisória. A cobrança de encargos abusivos no período da normalidade do contrato enseja a descaracterização da mora, impondo a improcedência da ação de busca e apreensão em apenso. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça. Negativa de seguimento do recurso da ré e provimento do apelo do autor. (TJRJ – APELAÇÃO: APL 200900128719 RJ 2009.001.28719 – Relator(a): DES. DENISE LEVY TREDLER – Julgamento: 31/08/2009 – Órgão Julgador: 19ª CÂMARA CIVEL).

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RIO GRANDE DO NORTE:
INCIDENTE DE INCONSTITUCIONALIDADE. ARTIGO 5º DA MEDIDA PROVISÓRIA Nº 2.170, DE 23 DE AGOSTO DE 2001. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. IMPOSSIBILIDADE. OBRIGATORIEDADE DE LEI COMPLEMENTAR PARA REGULAMENTAR O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL. ARTIGOS 192 E 62, § 1º, INCISO III, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DO DISPOSITIVO. PROCEDÊNCIA DO INCIDENTE. …Cabe ressaltar, em princípio, que vem emergindo o entendimento no Superior Tribunal de Justiça no sentido de que a capitalização mensal dos juros, desde que pactuada, é legal a partir dos contratos de mútuo bancário, celebrados a partir de 31 de março de 2000, data da primitiva publicação do artigo 5º da medida provisória nº.1.963-17/2000, atualmente reeditada sob o nº. 2.170-36/2001. A perenização da sua vigência se deve ao artigo 2º da Emenda Constitucional n.º 32, de 12 de setembro de 2001. No entanto, data maxima venia, não comungo com o posicionamento adotado pelo Superior Tribunal de Justiça e por alguns Tribunais pátrios, pelos motivos a seguir expostos. Inicialmente, invoco a Súmula 121 do Supremo Tribunal Federal, em plena vigência, que assevera: “É vedada a capitalização de juros, ainda que expressamente convencionada“. Convém explicitar que, em observância ao artigo 192 da Constituição Federal, alterado pela Emenda Constitucional 40/2003, o Sistema Financeiro Nacional deve ser regulado por Lei Complementar, devendo aqui ser destacado que o artigo 62, § 1º, também da Carta Magna, veda a edição de Medidas Provisórias quando destinadas a regular matéria reservada à Lei Complementar, sob pena de restar evidenciada sua flagrante inconstitucionalidade. De se destacar, ainda, que a norma alvejada autoriza o credor a cobrar juros não apenas do valor principal, mas também sobre o que não emprestou, obtendo, portanto, receita sem trabalho, sem contraprestação, agredindo brutalmente o artigo 170 da nossa Lei Magna que assim estabelece: “A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna conforme os ditames da justiça social observados os seguintes princípios: V. defesa do consumidor;“. Vale lembrar, por oportuno, que a constitucionalidade desta Medida Provisória que permite a capitalização mensal dos juros, vem sendo discutida pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, na ADIN n.º 2.316-1/DF, cuja relatoria coube ao Ministro Sydney Sanches, que suspendeu a eficácia do artigo 5º, caput, e parágrafo único e a decisão final encontra-se pendente de julgamento. Embora não tenha sido concluído o julgamento da liminar da Medida Cautelar, aquele eminente Relator deferiu a suspensão cautelar dos dispositivos impugnados com fundamentos na “aparente falta de urgência“, objetivamente considerada, para a edição de medida provisória, e pela ocorrência do “periculum in mora inverso“, sobretudo com a vigência indefinida da referida MP desde o advento da EC 32/2001, com a possível demora do julgamento do mérito da ação. Portanto, há de se reconhecer não só a inconstitucionalidade material, mas, também, a formal, na medida em que, segundo o artigo 192 da Constituição da República, a norma combatida está reservada a lei complementar, sendo, por conseguinte, insuscetível de ser disciplinada pela via da medida provisória… (TJRN – Argüição de Inconstitucionalidade em Apelação Cível n° 2008.004025-9/0002.00 – Relator: Desembargador Amaury Moura Sobrinho – Julgamento: 08/10/2008).

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO:
INCIDENTE DE ARGÜIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. ADMINISTRATIVO. CONTRATO DE CRÉDITO ROTATIVO. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS EM PERIODICIDADE INFERIOR A UM ANO. SUSCITADA A INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 5º DA MP Nº 2.170, DE 23/08/2001, PERANTE A CORTE ESPECIAL. 1. Até o advento da indigitada MP nº 1.963-17, publicada em 31/03/2000 (MP nº 2.170, de 23/08/2001 – última edição), a capitalização dos juros mês a mês, nos contratos de abertura de crédito rotativo em conta-corrente – cheque especial – e nos contratos de renegociação, à míngua de legislação especial que a autorizasse, estava expressamente vedada. 2. Estavam excluídos da proibição os contratos previsto no Decreto lei nº 167, de 14/02/67, no Decreto-lei 413, de 09/01/69 e na Lei 6.840, de 03/11/80, que dispõe sobre títulos de crédito rural, título de crédito industrial e títulos de crédito comercial, respectivamente. 3. O Executivo, extrapolando o permissivo constitucional, tratou de matéria antiga, onde evidentemente não havia pressa alguma, eis que a capitalização de juros é matéria que remonta à época do Decreto nº 22.626/33 (Lei de Usura). A gravidade é ainda maior quando se tem em conta que a capitalização de juros em contratos bancários e financeiros tem implicações numa significativa gama de relações jurídicas. 4. Não verificado o requisito “urgência” no que se refere à regulamentação da capitalização dos juros em período inferior a um ano. Especialmente quando se trata de uma MP que, dispondo sobre a administração dos recursos de caixa do Tesouro Nacional, dá providências sobre a capitalização de juros para as instituições financeiras. 5. Não se pode reputar urgente uma disposição que trate de matéria há muito discutida, e que, ardilosamente foi enxertada na Medida Provisória, já que trata de tema totalmente diverso do seu conteúdo. Além disto, estatui preceito discriminatório, porque restringe a capitalização de juros questionada unicamente às instituições financeiras. A urgência, portanto, só se verifica para os próprios beneficiados pela regra, já que, para todos os demais, representa verdadeiro descompasso entre a prestação e a contra-prestação, além de onerar um contrato que por natureza desiguala os contratantes (de adesão). (TRF4, Incidente de Arguição de Inconstitucionalidade 2001.71.00.004856-0, Corte Especial, Relator Luiz Carlos de Castro Lugon, DJ 08/09/2004).

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO PARANÁ:
INCIDENTE DE DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE – MEDIDA PROVISÓRIA – PRESSUPOSTOS FORMAIS – URGÊNCIA E RELEVÂNCIA – VÍCIO MATERIAL – MATÉRIA RESERVADA A LEI COMPLEMENTAR. 1. São pressupostos formais das medidas provisórias a urgência e a relevância da matéria. Há de estar configurada a situação que legitime a edição da medida provisória, em que a demora na produção da norma possa acarretar dano de difícil ou impossível reparação para o interesse público, notadamente o periculum in mora decorrente no atraso na cogitação da prestação legislativa. 2. Os vícios materiais referem-se ao próprio conteúdo do ato, originando-se de um conflito com regras estabelecidas na Constituição, inclusive com a aferição do desvio do poder. 3. É vedada a edição de medidas provisórias sobre matéria reservada a lei complementar. 4. A Súmula Vinculante sob nº 07 da Corte Suprema, reproduzindo o teor da Súmula nº 648, proclama que “a norma do § 3º do art. 192 da Constituição, revogada pela Emenda Constitucional 40/2003, que limitava a taxa de juros reais a 12% ao ano, tinha sua aplicabilidade condicionada à edição de lei complementar“. (TJPR – Órgão Especial – IDI 0579047-0/01 – Foro Central da Região Metropolitana de Curitiba – Rel.: Des. Lauro Augusto Fabrício de Melo – Por maioria – J. 05.02.2010). (grifei).

Parece bem claro que a Inconstitucionalidade da Medida Provisória não é um ato isolado de um único Tribunal, mas da maioria deles inclusive o Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo já se manifestou sobre o tema conforme acórdãos abaixo transcritos:
JUROS – Capitalização – Inadmissibilidade, em período inferior ao anual, à míngua de previsão na legislação de regência da matéria – Súmula 121 do E. STF – Inaplicabilidade do art 5o da Medida Provisória 1963-17/2000 (atualmente reeditada sob o n.° 2170-36/2001) – Embargos à monitoria parcialmente procedentes – Recurso não provido – Voto vencido. (.,.) Com efeito, não se pode olvidar que a Súmula 596, do Supremo Tribunal Federal, consagrou o entendimento jurisprudencial, de que são livres as instituições integrantes do Sistema Financeiro, Nacional na fixação das taxas de juros, sendo inaplicável a espécie, o disposto no Decreto n° 22.626/33. No entanto, a capitalização de juros, consistente no cálculo de juros sobre os juros já adicionados ao capital, em período inferior a um ano, só é admitida nos casos em que é expressamente prevista em lei, inocorrente à espécie. Neste sentido, a Súmula 121 do colendo Supremo Tribunal Federal: É vedada a capitalização de juros, ainda que expressamente, convencionada”. Nem mesmo a edição da Medida Provisória 1.963-17/2000 (atualmente reeditada sob o n° 2.170-36/2001), que permitia a capitalização mensal dos juros nos contratos bancários, pode servir de aparato para tal cobrança. (…) De mais a mais, o art. 591 do novo Código Civil, norma hierarquicamente superior, apenas permite a capitalização anual de juros.”(Apelação n° 7.232.641-9; Mirassol; 14ª Câmara de Direito Privado; Rei. Des.MELO COLOMBI, j. em 14.05.2008; v . u . ).

JUROS – CAPITALIZAÇÃO – INADMISSIBILIDADE – CONFIGURAÇÃO DE ANATOCISMO – NÃO INCIDÊNCIA DO ART. 5° DA MP N. 1.963-17, DE 31.03.00 (REEDITADA SOB O N. 2.170-36/2001) – REGRA – POSTERIOR. À CONTRATAÇÃO – ART. 4° DO DECRETO Nº 22.626/33 – SÚMULA 121 DO SUPREMO TRTBUNAL FEDERAL – SÚMULA N. 93 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA – NÃO INCIDÊNCIA. (…) Tem-se reconhecido inadmissível a prática do anatocismo, salvo na forma anual, ante a vedação contida no art. 4° do Decreto n. 22.626/33. Ainda que se trate de instituição financeira, a capitalização dos juros somente é admitida nas hipóteses reguladas em leis especiais, que a prevêem expressamente, como no caso das cédulas de crédito rural, comercial e industrial (DL 167/67, 413/69 e Lei 6.840/80). Nessa medida, aplica-se integralmente aos contratos bancários a proibição do anatocismo, consubstanciada na Súmula 121 do STF. E não se diga que prevalece sobre esta a Súmula 596 do STF, pois, ambas têm áreas de abrangência diferentes, e portanto coexistem. A Súmula 596 do STF refere-se unicamente ao valor das – taxas de juros. Em suma, não se admite a capitalização, salvo em situações excepcionais (STJ, Súmula n.° 93; STF, Súmula n.° 121; cfr. AgRg. no REsp. n. 646.475-RS, STJ, 3ªT. , Rel. Min. Castro Filho, j : 22.2.05, v.u, in DJU de 21.3.05, p. 376; AgRg. no REsp. n. ,416.336-SP, STJ, 4ª T., Rei. Min. Fernando Gonçalves, j . 28.9.04, v.u:, in DJU de 48.10.04, pág. 281; REsp. n. 298.369-RS, STJ, 3ªT., Rei. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, j . 26.6.03, m.v, in DJU de 25.8.03, p. 296; v. , tb: Apel. n.° 1.220.656-3, Santa Izabel; TJSP, 22ª Câm. Dir. Priv., j 7 3.10.06, v.u.; Apel., n. 1.052.322-5, Ribeirão Preto/ v.u, TJSP, 22ª Câm. Dir. Priv., j . 26.9.06, v.u.; Apel. N.° 7.051.889-. 5, Jacareí, TJSP, 22ª Câm. Dir, Priv., j .-11.4.06). MESMO SE ADMITIDA A CONSTITUCIONALIDADE DO ART. 5º DA MP N.° 1.963-17, DE 31.3.00,(REEDITADA SOB O N.° 2.170-36/2001), SERIA ELA INAPLICÁVEL AO CONTRATO SOB EXAME, REALIZADO ANTERIORMENTE A 2000.” (Apelação n° 7.127.381-3; Jaboticabal; 22a Câmara de Direito Privado; Rei. Des. ROBERTO BEDAQUE; j . em 22.07.2008, v.u:).

Sendo assim, não se pode admitir a capitalização de juros em termo inferior a um ano, sob pena de violação ao texto do artigo 192 da Constituição Federal e ainda, ao artigo 591 do Código Civil, norma hierarquicamente superior a MP, que apenas permite a capitalização anual.

Por outro lado, não há dúvidas que a mal fadada Medida Provisória também AFRONTA O DISPOSTO NO ARTIGO 7º DA LEI COMPLEMENTAR N.º 95/98, valendo-se dos ensinamentos do Ilustre Desembargador Luís Fernando Lodi, no julgamento da Apelação n.º 7.358.896-6, do Tribunal de Justiça de São Paulo, como abaixo transcrevemos:
REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO – CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR – CAPITALIZAÇÃO – Afirmação quanto à possibilidade de aplicação das disposições contidas na Medida Provisória 2.170-36 – Afastamento ante a vedação legal, sendo somente admitida a capitalização anual. (…) 2. Relativamente à capitalização, a instituição financeira apelada nega sua existência, entretanto, defendendo a aplicação das disposições contidas na Medida Provisória 2.170-36.

Tem-se, pois, como certo o anatocismo. Só que é ele expressamente vedado, como regra; é o que dispõe as Súmulas 121 STF, que o proíbe ainda que convencionado, e 93 STJ, que elenca as leis que o admite.

A única capitalização que é admitida é a anual (artigo 4º, parte final, do Decreto 22.626/33), por certo aplicável já que a Súmula 596 STF se refere ao percentual das taxas de juros e não ao cálculo de incidência.

Não se admite, portanto, capitalização mensal, ainda que a Medida Provisória 2.170-36, que reeditou a Medida Provisória 1.963-17, disponha de forma diversa.

Primeiramente não se pode olvidar que as Medidas Provisórias são editadas quando há urgência na regulamentação de determinadas matérias.

A Medida Provisória n.º 2.170-36 foi editada para dispor sobre os recursos de caixa do Tesouro Nacional, matéria que cuidou em seus quatro primeiros artigos; sendo esta a ementa da Medida, entendo que aí residia a urgência para a sua edição.

No artigo 5º, houve radical mudança de assunto, passando a Medida a cuidar de capitalização de juros.

À evidência, ao lado da mudança de assunto, passou a ser tratada matéria que não ostentava qualquer urgência, gerando periculum in mora inverso.

Dentro deste cenário, se faz necessário analisar o contido na Lei Complementar de n.º 95, que dispõe sobre a elaboração, a redação, a alteração e a consolidação das Leis, promulgada em atenção ao contido no artigo 59 da Constituição Federal.

Em seu artigo 7º, seu “caput” é claro:
“Art. 7º. O primeiro artigo do texto indicará o objeto da lei e o respectivo âmbito de aplicação, observados os seguintes princípios:”.

E segue em seu inciso II:
II – A lei não conterá matéria estranha a seu objeto ou a este não vinculada por afinidade, pertinência ou conexão;”

Ora, não há como deixar de constatar a visível discrepância entre esta determinação e a elaboração da já citada Medida Provisória.

No cotejo entre os dois diplomas, fica visível que as disposições contidas no artigo 5º da Medida Provisória violam aquilo que determina a Lei, o que não permite a sua aplicação.” (Tribunal de Justiça de São Paulo, 37ª Câmara de Direito Privado, Julgado em 30/09/2010, D.J.U 20/10/2010). (Grifamos).

Portanto, por todos os enfoques é proibida a CAPITALIZAÇÃO DE JUROS resultante da aplicação do Sistema de Amortização TABELA PRICE (ver artigo Capitalização de Juros nos Contratos Bancários), e o artigo 5º da MP 2170/36 não autoriza a sua prática, pois padece de vício de constitucionalidade, logo, não pode ser aplicada.

Notas:
(1)Informativo STF n.º 262 e D.O.U. de 06/02/2006, (www.stf.jus.br/arquivo/informativo/documento/informativo262.htm)
(2)Informativo STF n.° 527 (http://www.stf.jus.br//arquivo/informativo/documento/informativo527.htm)
(3)(Rcl 2576-SC, Relator(a):  Min. ELLEN GRACIE, Tribunal Pleno, julgado em 23/06/2004, DJ 20-08-2004 PP-00038 EMENT VOL-02160-01 PP-00105 RTJ VOL-00193-01 PP-00103)

Autor: Henrique Cantoia, advogado sócio na advocacia Cantoia & Nascimento
Fonte: www.artigonal.com