Gilberto Melo

Reflexão sobre a Lei de Recuperação

No Brasil, as estatísticas recentes mostram que mais de 95% das empresas em recuperação judicial vão à falência. Uma avaliação de casos de recuperação judicial americanos, publicada pela Harvard Business Review em 2015, em que foram analisados 350 casos protocolados entre 2002 e 2011, mostra que 89% das empresas continuaram em operação após concluir os procedimentos legais previstos no capítulo 11. Passados mais de 10 anos da lei de recuperação judicial, vale a pena uma reflexão sobre sua eficácia. A diferença conceitual básica entre a antiga lei das falências de 1945 e a atual lei de recuperação judicial, é que na antiga lei a “recuperação” ou falência da empresa era regulada unicamente pelo Judiciário, que fixava os prazos de pagamento (40% no primeiro ano e 60% no segundo ano), os juros e as demais condições para a liquidação dos débitos.

Na nova lei, o conceito básico é que as formas de recuperação são, ou deveriam ser, negociadas livremente entre os credores e a recuperanda, com algumas limitações e regulações do Judiciário, mas sempre visando à continuidade das operações da companhia. Só em caso de falência o Judiciário tomaria as rédeas do processo, já que a atividade empresarial não mais pode ser preservada.

Mas a verdade é outra, como se vê no artigo 49 da lei, apesar de, no seu preâmbulo, destacar que “Estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos“, nos seus parágrafos ressalta que “todos os créditos” não são todos os créditos, e exclui, além das operações de câmbio, também o proprietário fiduciário de bens móveis ou imóveis; o arrendador mercantil; o proprietário ou promitente vendedor de imóvel cujos respectivos contratos contenham cláusula de irrevogabilidade ou irretratabilidade; o proprietário em contrato de venda com reserva de domínio; e, o crédito garantido por penhor sobre títulos de crédito, direitos creditórios, aplicações financeiras ou valores mobiliários, além dos créditos de natureza trabalhista, que deverão ser pagos no máximo em 12 meses.
Na prática, quase todas as operações bancárias estão excluídas dos efeitos da lei, e é isso que inviabiliza a efetiva recuperação das empresas.

Fonte: www.jcrs.uol.com.br