Gilberto Melo

Atualização monetária de débitos da Fazenda e precatórios. Resolução 303/2019 CNJ e EC 113/2021

O CNJ publicou em 18/12/2019 a Resolução 303/2019, com vigência a partir de 01/01/2020, que dispõe sobre a gestão dos precatórios e respectivos procedimentos operacionais no âmbito do Poder Judiciário (Justiça Estadual, Federal e do Trabalho), com diferente sequência de indexadores para precatórios federais, estaduais e municipais emitidos pela Justiça Estadual, e estaduais e municipais emitidos pela Justiça do Trabalho, no seu artigo 21, transcrito mais abaixo.

A regra geral para precatórios é que a TR – Taxa Referencial foi julgada inconstitucional e substituída pelo IPCA-E no período de 10/12/2009, mas a partir da modulação dos efeitos da ADI 4357 e da ADI 4425, passou-se a admitir a aplicação da TR entre 10/12/2009 e 25/03/2015 apenas para precatórios estaduais e municipais expedidos ou pagos até 25/03/2015 pela Justiça Estadual.

Esta nova sequência introduzida pela Resolução 303/2019 corresponderia à tabela de ações condenatórias em geral da Justiça Federal (diferente da sequência adotada na Justiça Estadual), mas com a aplicação da TR de 10/12/2009 a 25/03/2015, tabela que estamos denominando como CNJJEmmaaNPM (Justiça Estadual, Não expurgada, Precatórios, Modulada). No entanto a sequência de indexadores da Resolução 303/2019 CNJ contém um erro material, que se refere à supressão da inflação do ano de 2000, que corresponde a 6,036%. Ocorre que a UFIR foi extinta no ano 2000 e o Manual de Cálculos da Justiça Federal supre esta lacuna aplicando o IPCA-E:

Nas tabelas de fatores de atualização monetária que apresentaremos mais abaixo estamos corrigindo este erro material, aplicando também a inflação do ano 2000 pelo IPCA-E.

Como consequência da previsão da Resolução 303/2019 CNJpara os precatórios estaduais e municipais expedidos a partir de 26/03/2015 deve ser adotada, salvo melhor juízo, a mesma sequência de indexadores mencionada no artigo 21, com a reparação do erro material citado e com a aplicação do IPCA-E em lugar da TR, cuja tabela denominamos CNJJEmmaaNP (Justiça Estadual, Não expurgada, Precatórios, não modulada).

Quanto aos débitos da fazenda antes que se tornem precatórios, tendo em vista que o RE 870.947, Tema 810/STF, foi julgado em 03/10/2019 e o acórdão correspondente publicado em 03/02/2020, aplicando o IPCA-E/IBGE em lugar da TR, a partir de 30/06/2009, mas sem explicitar qual seria a sequência de indexadores anterior a 30/06/2009, entendemos que antes de 30/06/2009 deverá ser aplicada a mesma sequência aplicada anteriormente para o período pelo respectivo Tribunal, sem a aplicação da TR em qualquer período, ou, alternativamente, a tabela de precatórios não modulada da Resolução 303/2019 CNJ, denominada CNJJEmmaaNP, já mencionada. Concluindo, tanto para débitos da Fazenda Pública em execução, quanto para precatórios,  não cabe mais a aplicação da TR – Taxa Referencial, a exceção se faz para os precatórios expedidos até 25/03/2015.

Segue a transcrição do artigo 21 da Resolução 303/2019 CNJ:

“Art. 21. Os valores requisitados serão atualizados monetariamente até a data do efetivo pagamento, devendo ser utilizados os seguintes indexadores para atualização do valor requisitado em precatório não tributário:

I – ORTN – de 1964 a fevereiro de 1986;
II – OTN – de março de 1986 a janeiro de 1989;
III – IPC / IBGE de 42,72% – em janeiro de 1989;
IV – IPC / IBGE de 10,14% – em fevereiro de 1989;
V – BTN – de março de 1989 a março de 1990;
VI – IPC/IBGE – de março de 1990 a fevereiro de 1991;
VII – INPC – de março de 1991 a novembro de 1991;
VIII – IPCA-E/IBGE – em dezembro de 1991;
IX – UFIR – de janeiro de 1992 a dezembro de 2000;
X – IPCA-E / IBGE – de janeiro de 2001 a 09 de dezembro de 2009;
XI – Taxa Referencial (TR) – de 10 de dezembro de 2009 a 25 de março de 2015;
XII – IPCA-E/ IBGE – de 26 de março de 2015 em diante. (critério alterado pela Resolução 448 CNJ, conforme abaixo)

1º Aplicar-se-á, para os precatórios expedidos no âmbito da administração pública federal, o IPCA-E como índice de atualização monetária, no período de vigência dos arts. 27 das Leis no 12.919/2013 e 13.080/2015.

2º Na atualização dos precatórios estaduais e municipais emitidos pela Justiça do Trabalho devem ser observadas as disposições do art. 39, caput, da Lei nº 8.177, de 1º de março de 1991, no período de março de 1991 a junho de 2009, IPCA-E de julho a 09 de dezembro de 2009 e Taxa Referencial (TR) de 10 de dezembro de 2009 a 25 de março de 2015, sendo atualizados pelo IPCA-E a partir desta data.”

Extrai-se do texto da Resolução 303 CNJ acima que, além dos critérios para precatórios estaduais e municipais já citados, ela prevê;

  • A sequência de indexadores modulada para a Justiça Federal (precatórios expedidos até 25/03/2015), que denominamos CNJJFmmaaNPM (Justiça Federal, Não expurgada, Precatórios, Modulada), só aplica a TR de 10/12/2009 a 31/12/2013 e que a sequência não modulada para a Justiça Federal (precatórios expedidos após 25/03/2015), denominada CNJJFmmaaNP é equivalente à CNJJEmmaaNP (Justiça Estadual, Não expurgada, Precatórios, não modulada), que não aplica a TR em período algum;
  • A sequência de indexadores modulada para a Justiça do Trabalho (precatórios expedidos até 25/03/2015), denominada CNJJTmmaaPM (Justiça do Trabalho, Precatórios, Modulada), aplica a TR de 03/1991 a 06/2009, IPCA-E de 07/2009 a 09/12/2009, TR de 10/12/2009 a 25/03/2015 e IPCA-E a partir de 26/03/2015. Já na sequência não modulada da Justiça do Trabalho (precatórios expedidos após 25/03/2015), denominada CNJJTmmaaP (Justiça do Trabalho, Precatórios, não modulada), aplica-se a TR de 03/1991 a 06/2009 e o IPCA-E a partir de 07/2009.

A minuta de Resolução não foi explícita quanto aos critérios de atualização monetária dos débitos tributários, no entanto as ADIs 4357 e 4425, assim como o RE 870.947 estabeleceram que neste caso, pelo princípio da isonomia, devem ser adotados os mesmos critérios adotados pela Fazenda Pública para a cobrança de impostos, seja a Selic ou outro critério (há estados que utilizam IPCA-E mais 1% de juros, por exemplo). No caso de aplicação da Selic como juros moratórios, ela só pode ser adotada na forma simples, ou seja, somando os percentuais e o percentual no mês do pagamento é de 1%, nos termos da legislação própria e conforme pacificado pela jurisprudência do STJ. A Resolução 303/2019 CNJ entretanto, foi alterada em 03/2022, introduzindo o § 4º do artigo 21-A:

“§ 4o Até novembro de 2021, aos precatórios de natureza tributária serão aplicados os mesmos critérios de atualização e remuneração da mora pelos quais a Fazenda Pública remunera seu crédito tributário seguindo, a partir do mês seguinte, a regra de atualização do artigo 21 dessa Resolução. (incluído pela Resolução n. 448, de 25/03/2022)”

Tabelas de fatores de atualização monetárias descontinuadas em nosso site:

JEBRmmaaNP (Justiça Estadual, Brasil, Não expurgada, Precatórios): Descontinuamos a sua publicação, passando a publicar a partir de 03/2020 a tabela CNJJEmmaaNPM, instituída pela Resolução 303/2019 CNJ. 

JEBRmmaaNF (Justiça Estadual, Brasil, Não expurgada, Fazenda pública): Descontinuamos a sua publicação, passando a publicar a partir de 03/2020 a tabela CNJJEmmaaNP, instituída pela Resolução 303/2019 CNJ.

Por fim, examinados os diferentes critérios previstos na Resolução 303/2019 CNJ para débitos da Fazenda e precatórios, salientamos que Lei Federal 10.522/2002 estabeleceu, em seu artigo 37-A, que os créditos de fundações públicas federais, de qualquer natureza (tributários ou não tributários), terão correção e juros calculados nos termos da legislação aplicável aos tributos federais. Portanto, devem os créditos de fundações públicas federais — ainda que não tributários — necessariamente seguir o mesmo critério dos tributários.

Nova alteração da Resolução 303 CNJ pela EC 113 de 09/12/2021

No entanto, a despeito de terem sido decididos os novos indexadores e taxas de juros nas ADIs 4357 e 4425, Repercussão Geral no Tema 810 STF, RE 870947, Tema 905 STJ, e Resolução 303/2019 CNJ, a EC 113/2021 alterou tais critérios a partir de 01/12/2021 para a Selic, verbis:

“Artigo 3º — Nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente”.

O artigo 21 da Resolução 303 CNJ passou a ser 21-A e os seguintes incisos foram alterados pela Resolução n. 448, de 25/03/2022:

“…

XII – IPCA-E/ IBGE – de 26.03.2015 a 30 de novembro de 2021;
XIII – taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic) – de dezembro de 2021 em diante.”

Contudo, nos posicionamos veementemente contrários a essa Emenda, notoriamente inconstitucional, sob idênticos fundamentos julgados pelo STF nas ADIs 4357 e 4425. Além da introdução da Selic, o período de graça passou de 18 para 21 meses. Sugerimos a leitura do seguinte artigo publicado por nós no Conjur.

A utilização da Selic como indexador de atualização monetária e juros, a um só tempo, figura absurda confusão que prejudica substancialmente ao usuário da justiça.

Enquanto aguardamos os desdobramentos da ADI 7047 e outras, que tratam do tema, descontinuamos a publicação das tabelas abaixo, ficando em nosso site as tabelas referentes a 12/2021 (atualizadas até 30/11/2021):

CNJJEmmaaNP ((Débitos da Fazenda em execução e Precatórios expedidos após 25/03/2015 (Res. 303/CNJ não modulada)

CNJJEmmaaNPM (Precatórios expedidos até 25/03/2015 (Res. 303/CNJ modulada)

Nota importante: Vale salientar, por fim, que com as alterações promovidas pela EC 113 foram incluídos os seguintes artigos e parágrafos na Resolução 303 CNJ, que tratam da aplicação do IPCA-E no período de graça, que passou de 18 para 21 meses, de 01/julho para 02/abril (art. 21-A § 5º) e da base de incidência da Selic, que é o valor consolidado do principal atualizado e juros de mora até 30/11/2021 (art. 22 § 1º):

Art. 21-A

§ 5o A atualização dos precatórios não-tributários deve observar o período a que alude o § 5o do artigo 100 da Constituição Federal, em cujo lapso temporal o valor se sujeitará exclusivamente à correção monetária pelo índice previsto no inciso XII deste artigo(incluído pela Resolução n. 448, de 25/03/2022)

Art. 22. Na atualização da conta do precatório não tributário os juros de mora devem incidir somente até o mês de novembro de 2021, observado o disposto no § 5o do art. 21-A desta Resolução. (redação dada pela Resolução n. 448, de 25/03/2022)

§1o A partir de dezembro de 2021, a compensação da mora dar-se-á da forma discriminada no artigo 21 dessa Resolução, ocasião em que a taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic) incidirá sobre o valor consolidado, correspondente ao crédito principal atualizado monetariamente na forma do artigo 21-A dessa Resolução até novembro de 2021 e aos juros de mora, observado o disposto nos §§ 5o e 6o do art. 21-A desta Resolução. (incluído pela Resolução n. 448, de 25/03/2022)

§2o Em nenhuma hipótese a atualização monetária e o cálculo dos juros, previstos nos arts. 21 e 21-A, poderão retroagir a período anterior da data-base da expedição do precatório. (incluído pela Resolução n. 448, de 25/03/2022)

Aguarda-se a análise das ADIs propostas contra a EC 113.