Gilberto Melo

Histórico da legislação do SFH sobre a Tabela Price

Conquanto sabido, a política habitacional no país iniciou-se com o advento da Lei nº 4.380/64, que definiu os cânones e parâmetros de financiamentos para aquisição da casa própria.

A Lei nº 4.380/64, que criou o Sistema Financeiro da Habitação, ao prever a instrumentalização dos financiamentos a serem concedidos para aquisição da casa própria, adotou a Tabela Price como Sistema de Amortização, priorizando, desde logo, a efetiva amortização da dívida, conforme se vê da redação da alínea “c” do art. 6º, cujo teor abaixo se transcreve: “c) ao menos parte do financiamento, ou do preço a ser pago, seja amortizado em prestações mensais sucessivas, de igual valor, antes do reajustamento, que incluam amortização e juros;”

É bem verdade que a referida Lei nº 4.380/64 não diz, expressamente, que o sistema de amortização é o da Tabela Price, mas, também é verdade que o único sistema de amortização que prevê que o valor emprestado “… seja amortizado em prestações mensais sucessivas de igual valor ….” é o Sistema Francês de Amortização, também conhecido como Tabela Price. Isso não deixa qualquer dúvida de que o sistema de amortização eleito pela referida norma é, efetivamente, o mencionado acima. E um dos mecanismos adotados, para tanto, foi o de promover a amortização da prestação mensal antes da correção do saldo devedor.

Na verdade, o reconhecimento de que a Tabela Price contém juros compostos advém de normas expressas do próprio BNH – Banco Nacional da Habitação -, ao criar o PES, para o reajuste das prestações.

Vejamos. O Governo Federal, ao estabelecer, conceber e implantar sua política habitacional, o fez mediante os ditames consubstanciados na Lei nº 4.380 de 21 de agosto de 1964. Esta norma, especificamente nos seus arts. 17 e 18 assim dispuseram, dentre outras situações:

“Art. 17 – O Banco Nacional da Habitação terá por finalidade: I – orientar, disciplinar e controlar o Sistema Financeiro da Habitação (…);

Art. 18 – Compete ao Banco Nacional da Habitação: (…) III – estabelecer as condições gerais a que deverão satisfazer as aplicações do Sistema Financeiro da Habitação quanto a garantias, juros, prazos, limites de riscos e valores máximos de financiamento e de aquisição dos imóveis financiados no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação.”

Da leitura específica dos dispositivos da lei que criou e implementou o SFH, se depreende, pois, que ficou afeto ao BNH, até a sua extinção, e depois deste, ao Banco Central do Brasil, o poder de orientar, disciplinar e controlar o Sistema Financeiro da Habitação. Evidente e pertinente a consignação de que, considerando o sistema de criação de uma norma legislativa no Brasil, quando esta dita os parâmetros e bases de um programa social, qualquer que seja ele, fica a cargo do órgão competente regulamentar e disciplinar este sistema, a concessão de expedir regulamentação, segundo as diretrizes da norma maior, no caso a lei que criou tal sistema.

Caso, porventura, venha essa regulamentação por normas inferiores hierarquicamente à norma maior (lei, decreto-lei, até a CF de 1988), expedir normas contrárias aos ditames da lei maior, evidente que se estará diante de uma inadequação da regulamentação expedida e, via de conseqüência, sem valia tal disposição regulamentadora, prevalecendo os termos da lei maior, que, no caso do SFH, é a Lei nº 4.380/64.

Nessa sequência, tocante às discussões estéreis que se constatam diuturnamente acerca da existência de juros compostos na Tabela Price, pertinente a transcrição de norma editada pelo Banco Nacional da Habitação – RC nº 36/69, de 18/11/1969, que regula o reajustamento das prestações no SFH e cria o Plano de Equivalência Salarial, a saber: “(…) .3. o valor inicial da prestação, no PES será obtido pela multiplicação da prestação de amortização, juros e taxas, calculado pelo Sistema Francês de juros compostos (Tabela Price), por um coeficiente de equiparação salarial.”

Igual tratamento despendeu o BNH ao editar a RD nº 75/69, em 08/12/1969, que, em seu Anexo I, letra “A”, assim dispôs quanto à conceituação da Tabela Price: “A) Fórmula para cálculo de prestação inicial: P1 = p x c. Onde: P1 –    Prestação inicial pelo Plano de Equivalência Salarial; P – Prestação calculada pela Tabela Price (tabela de juros composto pelo método francês de amortização) e que amortiza o financiamento contratado na taxa de juros contratada e no prazo contratado; c- Coeficiente de equiparação salarial divulgado pela Diretoria do BNH, válido para os contratos assinados no trimestre a que se referiu a publicação e para o mês de reajustamento preferido pelo financiado(…)”

Observados os ditames constantes nas legislações iniciais do SFH, de que a Tabela Price tem em sua fórmula juros compostos, será, doravante, dar azo ao irracional – senão dolo com intuito de obter vantagem indevida, buscar defesa contra texto expresso de lei ou fato incontroverso, alterando a verdade dos fatos, para conseguir objetivo ilegal,

Tais considerações se fazem pertinentes para dissipar de vez a discussão acerca de juros compostos na Tabela Price. Identificado isso, e tendo presente que na legislação pátria admite-se a sobreposição de juros tão somente em leis que regulamentam programas específicos (cédula de crédito rural, comercial e industrial), no caso do SFH, observada a legislação de regência acima referida, assim como os termos do decreto da Lei de Usura e a Súmula nº 121 do STJ, por evidente que a anomalia do anatocismo no contrato deve ser afastada, observados os ditames do CDC.

Autor: Marco Aurélio Araujo da Rosa

Fonte: www.espacovital.com.br