Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
Diante desse princípio toda e qualquer interpretação que se fizer do sistema jurídico deve ser por ele orientada, portanto, o paradigma para analisar questões procedimentais sempre será aquele que implicará em economia seja de tempo de tramitação ou de custo.
Com a experiência das consequências do CPC de 1973, os estudiosos do direito e o legislador perceberam dentre outras circunstâncias que a apresentação de petições iniciais sem parâmetros claros para conduzir a uma fácil liquidação da vantagem financeira pretendida corresponde a um problema que tem levado os processos judiciais a consumirem mais tempo até seu encerramento com a satisfação do credor.
É que em razão do sistema criado muitos processos tem continuidade sem dados para que na instrução seja possível colher elementos que contribuam para no momento do julgamento determinar-se o valor da prestação que será imposta ao devedor, terminando por gerar uma sentença ilíquida. Com isso inicia-se outro processo que consumirá a mesma quantidade de tempo para fornecer ao credor um provimento judicial com valor certo, o que conhecemos por fase de liquidação.
Em virtude desse aprendizado histórico, o legislador inseriu no sistema dos Juizados especiais uma regra que proíbe o juiz de proferir sentenças ilíquidas (LJE 38, p.u.).
Art. 38. A sentença mencionará os elementos de convicção do Juiz, com breve resumo dos fatos relevantes ocorridos em audiência, dispensado o relatório.
Parágrafo único. Não se admitirá sentença condenatória por quantia ilíquida, ainda que genérico o pedido.
Observe-se que dentre os princípios que regem os Juizados Especiais há repetição do princípio da economia (LJE 2°), reforçando o comando constitucional do art. 37.
Art. 2º O processo orientar-se-á pelos critérios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade, buscando, sempre que possível, a conciliação ou a transação.
É bem verdade que se o princípio está inserido na Constituição Federal, então, sequer precisaria ser repetido na lei dos Juizados Especiais para incidir sobre o sistema, porém, a pretensão do legislador foi a de reforçar que é preciso interpretar as regras processuais sob esse enfoque.
Como dito, não seria necessária uma regra principiológica específica, pois a Constituição Federal alcança todos os sistemas processuais, portanto, os procedimentos do Código de Processo Civil também devem ser analisados com essa influência econômica.
Vejo duas razões para exigir que as petições iniciais contenham elementos necessários para conduzir o julgado a um valor certo no momento do julgamento (salvo as exceções). A primeira por uma questão técnica e a segunda por força da aplicação do princípio da eficiência (que carrega o da economia em seu interior).
Sob o primeiro aspecto deve-se lembrar que toda petição inicial deve atender a requisitos estabelecidos em lei.
Devemos nos perguntar: qual a razão desses requisitos?
Além de tornar a petição compreensível também de fornecer dados indispensáveis para que todas as repercussões jurídicas possam ser desdobradas, pois a tutela jurisdicional se desenvolve nos limites que a demanda foi proposta. Esses limites estão contidos exatamente na petição inicial.
A exigência de apresentação do fato e fundamentos jurídicos requer do redator de uma petição inicial que estabeleça ligação entre cada fato e respectiva proteção jurídica, de modo que são dispensáveis à petição fatos sem repercussão jurídica, mas continuam totalmente indispensáveis os fatos que se enquadram às previsões jurídicas.
No caso da parte que deseja receber quantia, portanto, será necessário que os fatos apresentados sejam suficientes para garantir que o juiz chegue a conclusão do valor que reconhecerá como devido, permitindo ao credor exigi-lo através de meios coercitivos.
Nesse contexto, fatos (inciso III), fundamentos (inciso III) e pedido (inciso IV) estão interligados, de modo que deve existir conexão total entre eles.
Art. 282. A petição inicial indicará:
III – o fato e os fundamentos jurídicos do pedido;
IV – o pedido, com as suas especificações;
Uma repercussão jurídica é a descoberta do valor correto da causa, que pode ter influência em relação a competência (Juizados Especiais é de 40 salários mínimos), ao procedimento (sumário é de 60 salários mínimos) e cálculo das custas devidas. Como o valor da causa deve corresponder a vantagem econômica pretendida, então, é necessária a apresentação de parâmetro no texto da petição inicial para que seja aferido pelo juiz ao recebê-la.
Art. 282. A petição inicial indicará:
V – o valor da causa;
A preocupação de que a petição inicial deva apresentar condições para que o procedimento tenha andamento sem entraves e o julgamento seja facilitado pela existência dos dados indispensáveis é estampada na norma que prevê como inepta a petição inicial que da narração dos fatos não decorra conclusão lógica (CPC 295, p.u., II).
Art. 295. A petição inicial será indeferida
Parágrafo único. Considera-se inepta a petição inicial quando:
II – da narração dos fatos não decorrer logicamente a conclusão;
Essa conclusão lógica acontecerá sempre que os elementos apresentados em relação aos fatos sejam suficientes para encontrar-se o valor certo, nos casos de pretensão de receber quantia. Se faltarem esses elementos na parte fática da petição, então, estará prejudicada a boa compreensão do que a parte necessita receber através da prestação jurisdicional.
Por uma questão lógica, o Código de Processo Civil prevê que o encerramento do processo sem solução da pretensão caso a parte seja provocada a corrigir eventual falha na apresentação de dados.
Art. 284. Verificando o juiz que a petição inicial não preenche os requisitos exigidos nos arts. 282 e 283, ou que apresenta defeitos e irregularidades capazes de dificultar o julgamento de mérito, determinará que o autor a emende, ou a complete, no prazo de 10 (dez) dias.
Parágrafo único. Se o autor não cumprir a diligência, o juiz indeferirá a petição inicial.
Á questão é lógica porque espera-se de um processo que tenha desdobramento rápido, de modo que não se pode aguardar por longo tempo que a parte promova a correção ou que o procedimento siga até a sentença sem a presença de todos elementos para que o juiz possa proferir uma sentença líquida.
Outro aspecto de ordem técnica é o da correta compreensão da norma que estabelece regras para a construção do pedido (CPC 286).
Art. 286. O pedido deve ser certo ou determinado. É lícito, porém, formular pedido genérico
I – nas ações universais, se não puder o autor individuar na petição os bens demandados;
II – quando não for possível determinar, de modo definitivo, as conseqüências do ato ou do fato ilícito;
III – quando a determinação do valor da condenação depender de ato que deva ser praticado pelo réu.
Um intérprete menos cauteloso poderia sustentar que a lei menciona que “o pedido deve ser certo”, deixando de mencionar se deve ser líquido.
Efetivamente o pedido certo pode não estar liquidado na petição inicial, porém, deve obrigatoriamente conter elementos para que durante a instrução seja possível colher os dados necessários a realização dessa liquidação e, como consequência, a sentença seja líquida, tanto que a regra do Código de Processo Civil para sentença (art. 459, p.u.) é de que ela obrigatoriamente será líquida se o pedido for certo.
Art. 459. O juiz proferirá a sentença, acolhendo ou rejeitando, no todo ou em parte, o pedido formulado pelo autor. Nos casos de extinção do processo sem julgamento do mérito, o juiz decidirá em forma concisa.
Parágrafo único. Quando o autor tiver formulado pedido certo, é vedado ao juiz proferir sentença ilíquida.
Como a sentença poderia ser líquida no caso de pedido certo se a parte não apresentar em sua petição inicial elementos que conduzam a tal conclusão? Negar esse raciocínio corresponde a desafiar a lógica Aristotélica.
Por fim temos a questão de interpretação constitucional pelo enfoque da eficiência, que corresponde ao melhor resultado com o menor custo possível.
Ora! Considerando-se o tempo que um processo consumirá para que o credor chegue ao ponto de poder usar meios coercitivos para receber do devedor, se a sentença for ilíquida teremos o dobro do tempo, pois conforma já esclarecido, o processo retomará nova discussão processual que exigirá o mesmo tempo consumido até a prolação da sentença condenatória.
Se considerado o custo também será dobrado, pois haverá desdobramento de vários atos processuais que consumirão dinheiro público para custeamento das despesas de funcionamento do Judiciário durante o desdobramento desse processo (diligências, vencimentos de servidores, magistrado e outros servidores públicos, consumo de luz, papel, tinta, desgaste de equipamentos etc).
Antes de encerrar deve ser feita observação de que nas hipóteses previstas nos incisos do art. 286, do CPC a sentença não será líquida, portanto, a petição inicial está isenta do rigor defendido nos argumentos ora expendidos.
Por conta dessa realidade, é imperioso que os juízes empreguem rigor técnico na análise de petições iniciais em pleitos que pretenda-se o recebimento de quantia, de modo que sejam trazidos ao processo os parâmetros mínimos necessários para que no ato de julgamento seja declarado o valor certo.