Gilberto Melo

Itaú se livra de uma condenação de R$ 15 bilhões

O Banco Itaú conseguiu baixar de R$ 15.047.878.895,50 para R$ 453.225,25 o valor que terá que pagar a seu ex-cliente Délcio Roberto Klein. A decisão é do 9º Grupo Cível do TJRS, num dos desdobramentos de incomum demanda judicial que tem três frentes (o próprio TJRS, a comarca gaúcha de Esteio e o STJ). A decisão unânime foi proferida em ação rescisória. O resultado matemático ficou em 0,03011% do resultado buscado pelo consumidor.

A cifra – superior a R$ 15 bilhões – pretendida pelo ex-correntista da agência do Itaú em Esteio (RS) fora apontada como decorrência de ação revisional, cumulada com repetição do indébito, julgada procedente para extirpar o anatocismo, os lançamentos indevidos e outras parcelas abusivas. 

O julgado, proferido em 17 de outubro de 2005 pela pretora Uiara Castilhos dos Reis, da 1ª Vara de Esteio (RS) determinou também que o Banco Itaú procedesse à devolução do que cobrara a mais. A sentença foi, em 23 de março de 2006, confirmada pela 18ª Câmara Cível, em julgamento de que participaram os desembargadores Mário Rocha Lopes Filho, Claudio Augusto da Rosa Lopes Nunes e André Planella Villarinho.

Para a devolução do dinheiro, o julgado – com trânsito definitivo – fixou os critérios de como deveria ser feito o cálculo do montante: “os valores debitados indevidamente, acrescidos de juros remuneratórios equivalentes àqueles cobrados dos correntistas, capitalizados mês a mês e corrigidos monetariamente pelo IGP-M, desde a data em que ocorreram os lançamentos dos débitos não autorizados”.

Para chegar ao valor que o Itaú deveria devolver, foi determinada a realização de perícia contábil. Foi aí que o valor bilionário aflorou.

Recebida a inicial da ação rescisória, foi concedida parcialmente a antecipação de tutela, determinando-se provisoriamente o prosseguimento do feito executivo pelo valor de R$ 453.225,25. 

Ao proferir seu voto no julgamento de mérito – acompanhado, por unanimidade pelos demais desembargadores do 9º Grupo – a desembargadora Elaine Hahrzeim Macedo reconheceu que a sentença de primeiro grau “mostrou-se ultra petita”. A relatora explicou que “da leitura da inicial da ação de repetição, constata-se que o autor, na única passagem em que fala acerca dos encargos, na parte do pedido, requer ´a total procedência para condenar o Banco Itaú a repetir o indébito, acrescido dos mesmos juros e correção cobrados quando da concessão de empréstimos…”.

Para o 9º Grupo, “cediço é que os pedidos devem ser interpretados restritivamente, segundo a dicção do art. 293 do CPC, razão pela qual o comando que entendeu pela condenação da instituição bancária à repetição do indébito com a aplicação de capitalização mensal mostra-se nulo”.

O acórdão também aplicou a nulidade à sentença rescindenda porque “ao alvedrio do disposto pelo art. 93, IX, da Magna Carta, estabelece a condenação sem sequer haver qualquer fundamentação a respeito”. A única passagem acerca da capitalização mensal, na sentença, é aquela do dispositivo, antes mencionada, nada sendo referido na fundamentação. “E é dessa decisão, assim lançada, que agora se discute um sedizente crédito em torno de um valor de quinze bilhões de reais” – destacou a relatora.

O presidente do 9º Grupo, desembargador Claudio Augusto da Rosa Lopes Nunes fez um comentário objetivo: “o réu da ação rescisória seria o homem mais rico do Brasil se aplicássemos o que a sentença decidiu, pois não há como uma dívida original de R$ 51 mil transformar-se em 15 bilhões de reais”.

Em nome do Itaú atuaram os advogados Ana Laura Gonzalez Poittevin, Evaristo Aragão Ferreira dos Santos, Luiz Rodrigues Wambier e Teresa Celina Arruda Alvim Wambier. Da decisão que julgou procedente a ação rescisória, cabe recurso especial ao STJ. (Proc. nº 70023970320, que tramitou sem segredo de justiça).

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Outros fundamentos do julgado

Para julgar procedente a ação ajuizada pelo Banco Itaú – reduzindo o valor da devolução de mais de R$ 15 bilhões para aproximadamente R$ 500 mil a valores de hoje – o colegiado do TJ gaúcho adotou, ainda, três outros fundamentos.

* Ao estabelecer a devolução de valores com a incidência de juros remuneratórios – explicitação ocorrida somente quando do julgamento da exceção de pré-executividade – restou violado o disposto pelos arts. 395 e 407, combinados com o art. 876, do CCB/2002, que reproduz normatização do CCB/1916, conforme arts. 964 e seguintes, na medida em que, uma vez acolhida eventual postulação acerca de repetição do indébito, somente se cogita da aplicação de juros moratórios, além da correção monetária. 
 
* Nos juros moratórios, únicos cabíveis, o percentual devido não se atrela à prática de mercado, mas sim ao disposto na lei civil, seja o CCB, limitados, sempre, ao máximo de 1% ao mês o que também vale para as instituições financeiras, também por aí se mostrando ilegal a decisão rescindenda.
 
* Ao determinar – para a repetição do indébito – a capitalização mensal dos juros, houve expressa violação ao disposto pelo art. 4º do Decreto nº 22.626/33 que, a teor do enunciado da Súmula nº 121 do STF, é proibida, exceção feita às instituições financeiras e em determinadas operações de crédito.

Fonte: www.espacovital.com.br