A Justiça Estadual é responsável por aproximadamente 80% da demanda judicial no país, conforme dados do Seminário Justiça em Números. Embora o CNJ venha promovendo excelente trabalho através do estabelecimento de metas e de outros programas, pontuamos uma lacuna estrutural na organização judiciária no país. O que pretendemos é demonstrar algumas consequências desta lacuna e alguns projetos que poderiam ser implementados.
A Justiça do Trabalho tem o CSJT – Conselho Superior da Justiça do Trabalho, que entre inúmeras atribuições, cuida da normatização dos procedimentos de cálculos judiciais. A Justiça Federal tem o CJF, composto por 5 ministros do STJ e pelos presidentes dos TRF´s. Um dos cinco ministros do STJ é o Corregedor Geral da Justiça Federal. O CJF, órgão que supervisiona a Justiça Federal de primeira e de segunda instância nos aspectos orçamentário e administrativo, dentre inúmeros benefícios à administração da Justiça Federal, normatiza os procedimentos de cálculos judiciais. O órgão tem comissão permanente para a edição do Manual de Cálculos da Justiça Federal, que uniformiza os critérios de cálculos em todas as Seções Judiciárias.
A Justiça Estadual não tem um “CJE – Conselho da Justiça Estadual”, cada Tribunal tem seu critério próprio, não há uma coordenação administrativa, não há uma padronização mínima de procedimentos. Ressaltamos que há sim vários programas do CNJ, mas subjaz na infraestrutura dos Tribunais Estaduais uma carência profunda por padronização, que não caberia, s.m.j., exclusivamente ao CNJ, é preciso que que haja uma representação nacional dos interesses atinentes à Justiça Estadual. A lacuna na jurisdição estadual provoca também uma falta de referência nos Tribunais Superiores, que muitas vezes confundem temas específicos desta jurisdição com a jurisdição federal. Exemplo típico é a atribuição equivocada de critérios de atualização monetária e cálculos judiciais da Justiça Federal para a Justiça Estadual, gerando inconsistências que levam a longas discussões.
Urge, portanto, que seja criada uma instância administrativa nacional para a Justiça Estadual, que poderá de início formar uma Comissão Permanente para a padronização de procedimentos quanto à atualização monetária e cálculos judiciais no âmbito da Justiça Estadual. Mas enquanto não existe esta instância, o CNJ vem suprindo a lacuna com várias ações. Tramitou no CNJ o Pedido de Providências 0001505-41.2009.2.00.0000 no sentido da uniformização das tabelas de atualização monetária em todas as esferas da justiça, de relatoria do Conselheiro Emmanoel Campelo, que opinou pela formação de uma comissão para debater e decidir sobre o tema.
É relevante notar que as tabelas de atualização monetária da Justiça do Trabalho e da Justiça Federal já foram implementadas, respectivamente, em 2005 e 2007. Quanto à Justiça Estadual, já foi aprovada por unanimidade pelo Colégio de Corregedores Gerais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal, em agosto de 1997, uma tabela uniforme para esta jurisdição, entretanto só foi adotada até o momento pelos Tribunais: TJSP, TJAP, TJPE, TJMA, TJRO, TJAC, TJPA, TJTO, TJMT, TJAL, TJAM, TJCE, a despeito de que há outros tribunais que utilizam pelo menos o derradeiro indexador da série, o INPC do IBGE. Como esta tabela é baseada na lei e na jurisprudência da Corte Especial do STJ, a melhor solução é a sua aplicação para todos os Estados e para o Distrito Federal, primeiro passo para a padronização de cálculos na jurisdição estadual, como recomendou o próprio voto do Conselheiro Emmanoel Campelo, no Pedido de Providências antes citado.
A diferença de critérios de atualização monetária nos diferentes estados e também nas diferentes esferas da justiça foi objeto do trabalho Isonomia na Liquidação de Débitos Judiciais, apresentado no Seminário Justiça em Números, de 29 a 30.10.2012. A aplicação desta tabela poderia ser estendida, eventualmente, a todas as esferas da justiça, a depender de análise a ser feita pela comissão a ser instituída conforme sugestão da OAB e PGR no citado Pedido de Providências.
Além da uniformização da tabela de atualização monetária, há que se proceder também a uma padronização mínima dos cálculos judiciais de âmbito nacional, tendo em vista que a falta de uniformização de critérios de cálculos transfere ao contador judicial a responsabilidade de definir critérios de cálculos, afrontando o princípio da isonomia, pois as partes, quanto a cálculos, recebem a prestação jurisdicional de formas diferentes em diferentes estados e jurisdições, gerando discussões intermináveis. Quanto a esta padronização mínima, foi protocolado ofício do TJAP no referido Pedido de Providências 0001505-41.2009.2.00.0000 o Ato Conjunto 279/2012 TJAP aprovando procedimentos mínimos de cálculos, após debate entre os Contadores Judiciais e Gilberto Melo, no curso capacitação em cálculos judiciais promovido pelo TJAP em novembro de 2012. Tal modelo, a exemplo da Instrução de Serviço 08/2011 do TJPE e da Portaria Conjunta 004/2013 do TJPA, também forjadas durante cursos de Capacitação de Contadores Judiciais ministrados por Gilberto Melo nestes tribunais, serve bem, salvo melhor juízo, para um início de padronização que poderia ser aperfeiçoado por comissão permanente instituída para tal fim.
O TJAP juntou também à sua manifestação no citado Pedido de Providências o Projeto Efetividade da Execução, em estudos para implementação no estado e já iniciado com dois cursos de Capacitação dos Contadores Judiciais e com um Workshop de Liquidação de Sentença para Magistrados e Assessores. Este projeto destina-se integralmente à jurisdição estadual e parcialmente à Justiça Federal e Justiça do Trabalho, que, como antes mencionado, já estão à frente em alguns aspectos. A íntegra do Projeto Efetividade da Execução trata da efetividade na execução e cumprimento de sentença e abrange as seguintes ações, entre outras melhor detalhadas no link retro:
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- Uniformização dos procedimentos de cálculos de liquidação
- Utilização do Resumo dos Parâmetros de Liquidação
- Desenvolvimento de ferramentas para utilização em ambiente virtual
- Capacitação dos magistrados, assessores e demais servidores
Concluímos que enquanto não existe um “Conselho da Justiça Estadual”, uma entidade que represente a Justiça Estadual, o Projeto Efetividade da Execução (e cumprimento de sentença), pode ser desenvolvido no âmbito de uma comissão no CNJ. Transcrevemos a seguir a conclusão do projeto:
“O primeiro passo desta empreitada é a uniformização das tabelas de atualização monetária de débitos em geral, para débitos da fazenda e para precatórios, na jurisdição estadual, matéria que já se encontra sob análise no Pedido de Providências 00015054120092000000 do CNJ. As demais ações poderão ser desenvolvidas em sequência, trazendo inestimáveis benefícios à efetividade da justiça, por meio do aperfeiçoamento dos pedidos, impugnações e dispositivos das decisões e demais medidas retro alinhadas, alcançando a eficiência e celeridade da justiça que tanto espera a sociedade.”
Gilberto Melo
Material relacionado:
Projeto Efetividade da Execução
Isonomia na liquidação de débitos judiciais