Gilberto Melo

Juiz breca juros exorbitantes cobrados por banco com base em duas Medidas Provisórias

Usando interessante fundamentação sobre a inconstitucionalidade das medidas provisórias, baixadas pelo governo, que autorizariam a capitalização de juros em contratos mantidos com instituições financeiras, o juiz Daniel Henrique Dummer, da 2ª Vara Cível de Novo Hamburgo (RS),  julgou procedente uma ação revisional ajuizada pelo consumidor Joel Berto da Silva, contra o Banco Panamericano S.A. (grupo Silvio Santos).

As partes haviam contratado um financiamento para a aquisição de um automóvel. O mutuário afirmou que o financiamento foi impregnado de juros e encargos financeiros absolutamente ilegais, com flagrante violação ao CDC.

A sentença tem nove comandos finais: 1) determina a revisão do contrato; 2) declara nulas as cláusulas que disponham sobre juros remuneratórios e capitalização; 3) determina a incidência de juros remuneratórios e correção monetária pela taxa Selic; 4) declara a nulidade da cláusula que prevê incidência de comissão de permanência; 5)  reduz os juros de mora a 1% ao ano; 6) determina que o banco se abstenha de incluir o nome da parte autora em cadastros restritivos de crédito até repactuação do débito, pena de multa diária de R$ 100,00; 7) defere a compensação e repetição do indébito na forma simples; 8) descaracteriza a ´mora solvendi´ até o término da demanda e repactuação do débito, com manutenção de posse do veículo em favor do autor até então; 9) defere o depósito das parcelas que o financiado entende devida, sem efeito liberatório.

O juiz fundamenta que “o artigo 5º das medidas provisórias nºs 1963/2000 e 2170/2001 que autorizariam a capitalização pretendida são flagrantemente inconstitucionais,  porque lhes falta o essencial requisito da relevância e urgência”.

Segundo o artigo 62 da Carta Magna, “em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional”.

Assim – afirma o magistrado – “medidas provisórias apenas podem ser editadas diante de tais requisitos, e faltantes razões de relevância e urgência revelam-se contrárias à ordem constitucional”.

A sentença recorda que “recentemente – e em mais do que boa hora – o STF modificou sua posição, na trilha aqui defendida, ao fundamento de haver um patente desvirtuamento dos parâmetros constitucionais que permitem a edição de medidas provisórias”. (ADI nº 4048).

No caso levado a julgamento em Novo Hamburgo, o juiz concluiu que a cobrança dos encargos foi feita com base em medidas provisórias que alteraram legislação consolidada com o passar do tempo, e que poderiam ser sujeitadas ao trâmite legislativo ordinário.

O magistrado avalia que “a matéria vertida (medida provisória para autorizar a capitalização de juros) não se revela imprescindível, não possuindo nenhum interesse público que o fundamente”. A sentença também discorre sobre o fantástico lucro dos bancos.

O julgado monocrático lembra, finalmente, que está em tramitação no STF, desde setembro de 2001, a ação direta de inconstitucionalidade nº 2316, ajuizada pelo Partido da República, que busca a suspensão da eficácia do artigo 5º, cabeça e parágrafo único da Medida Provisória nº 2.170-36, de 23 de agosto de 2001.

No Supremo foram colhidos apenas dois votos (dos ministros Sydney Sanches, relator e Carlos Velloso – ambos, agora, já aposentados. Eles liminarmente suspenderam o artigo questionado. O processo – que foi retirado do julgamento em 15 de dezembro de 2005 – nunca mais voltou à pauta do Supremo.

O julgamento fora suspenso por um pedido de vista do então ministro Nelson Jobim, que depois se aposentou. Novo relator não foi, até agora, sorteado.

Ante a sentença proferida em Novo Hamburgo, o Banco Panamericano pode interpor recurso de apelação ao TJRS. O advogado Sílvio Marcos Ferreira atua em nome do autor da ação. (Proc. nº 019/1.05.0052052-6).

Fonte: www.espacovital.com.br