Gilberto Melo

As indenizações sob a perspectiva do Superior Tribunal de Justiça

O bem jurídico tutelado deve ser protegido de qualquer ameaça ou lesão, encontrando na responsabilidade civil, por danos morais, proteção jurisdicional, cuja natureza é ressarcitória, mas, também, preventiva e coercitiva.
Introdução
A indenização por danos morais encontra seu maior obstáculo na dificuldade de fixação do seu quantum, pois, diferentemente do que ocorre com os danos materiais, os danos morais não são passíveis de reparação, estando sua determinação na esfera da compensação. Isso porque, os danos morais atingem bens jurídicos que não podem ser apreciados pecuniariamente.
 
Ademais, não se pode estabelecer uma tabela ou critérios absolutos para fixação de danos morais, sob pena de prejuízo e não compensação razoável em casos semelhantes.
 
No entanto, as peculiaridades de cada caso deverão ser observadas, como repercussão do dano na esfera pessoal, idade da vítima, condição financeira, atuação profissional. Enfim, todos os critérios devem ser observados, no momento da fixação.
 
O presente artigo tem por escopo verificar os parâmetros que vêm sendo adotados na jurisprudência, principalmente do Superior Tribunal de Justiça, de forma a facilitar a compreensão do instituto, não sem antes analisar o instituto da Responsabilidade Civil.
 
Responsabilidade Civil
Ao tratar da responsabilidade civil, necessário se faz conjugar o artigo 186 com o artigo 927, também do Código Civil, que determina que, “aquele que, por ato ilícito causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”. Essa a fórmula da responsabilidade civil.
 
Constata-se, assim, que a finalidade precípua da responsabilidade civil é restabelecer o status quo ante, de forma a reparar ou compensar o dano suportado pela vítima.         
 
Dos termos em que definimos o ato ilícito, sabemos que ele pode consistir em ação ou omissão. A enumeração do Código Civil alemão, considerando, sob o gênero ato ilícito, várias espécies de lesão à vida, à liberdade, à propriedade, à honra de outrem, além dos atos contrários aos bons costumes não parece recomendável. Bem mais previdente foi o Código francês, que o nosso seguiu, ao impor a obrigação reparatória àquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, viola direito e causa dano a outrem. (DIAS, 2006, p. 569-570).
 
Seguindo a fórmula, portanto, tem-se como primeiro requisito a ensejar a responsabilidade civil a culpa, traduzida pela ação ou omissão voluntária, que consiste no comportamento comissivo ou omissivo do agente.
 
A comissão deve ser compreendida como “a prática de um ato que não se deveria efetivar, e a omissão, a não observância de um dever de agir ou da prática de certo ato que deveria realizar-se.” (DINIZ, 2007b, p. 44).
 
Tais conceitos, ou modalidades da culpa, podem ser apreendidos da lição de Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho:
a) Negligência – é a falta de observância do dever de cuidado, por omissão.
 
b) Imprudência – esta se caracteriza quando o agente culpado resolve enfrentar desnecessariamente o perigo. O sujeito, pois, atua contra as regras básicas de cautela.
 
c) Imperícia – esta forma de exteriorização da culpa decorre da falta de aptidão ou habilidade específica para a realização de uma atividade técnica ou científica. É o que acontece quando há o erro médico em uma cirurgia em que não se empregou corretamente a técnica de incisão. (GAGLIANO;  PAMPLONA FILHO, 2010, p. 170-171).
Constata-se, dessa forma, que a obrigação de reparar/compensar o dano advém da ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, conforme artigo 186, de cuja leitura verifica-se a necessidade da prova de que o comportamento do agente causador do dano tenha sido culposo, culpa em sentido amplo, compreendendo culpa, em sentido estrito[2]ou dolo[3].
 
O dolo, como ensina Carlos Roberto Gonçalves, consiste na vontade de cometer uma violação de direito e, a culpa, na falta de diligência. Todavia, quando se fala em culpa na esfera civil, a noção abrange dolo e culpa, já que, ao contrário do que ocorre na responsabilização penal, as consequências são idênticas para fins de responsabilidade civil. ( GONÇALVES, 2005).
 
A responsabilidade, nesse sentido, apresenta-se como imposição jurídica dirigida a todo aquele que causar dano a outrem, em decorrência de ação ou omissão culposa, ou ainda, em decorrência de previsão legal, como nos casos de responsabilidade objetiva, em que o elemento culpa é prescindível.
 
O que ocorre é que o legislador ordinário, mantendo o que dispunha o Código Civil anterior, de 1916, adotou como regra geral a teoria da responsabilidade civil subjetiva, ou seja, fundada na culpa.
 
De outro modo, ampliou o rol de casos de incidência da responsabilidade civil objetiva, sem culpa, notadamente através da teoria do risco.[4]
 
Compreende-se, assim, que a necessidade de a lei especificar as hipóteses em que a culpa não será cogitada para ensejar responsabilização demonstra a natureza de exceção pretendida pelo legislador ao tratar da responsabilidade objetiva.
 
Assim, no sistema jurídico brasileiro, a culpa é regra e, por conseguinte, a regra é a responsabilidade subjetiva, da qual a exceção é a responsabilidade objetiva, na qual a culpa não precisa ser perquirida.
 
Trata-se de uma espécie de solução transacional ou escala intermediária, em que se considera não perder a culpa a condição de suporte da responsabilidade civil, embora aí já se deparem indícios de sua degradação como elemento etiológico fundamental da reparação e aflorem fatores de consideração da vítima como centro da estrutura ressarcitória, para atentar diretamente para as condições do lesado e a necessidade de ser indenizado. (STOCO, 2004, p. 149).
 
A inversão do ônus da prova, consequência da presunção da culpa, é uma tendência, que visa mitigar a perquirição da culpa, devido à dificuldade que se tem em fazê-lo, mas também pela necessidade, muitas vezes, em se objetivar a responsabilidade civil, como forma de garantir a justiça no caso concreto.
Essa tendência tenta suprir, portanto, a complicada tarefa de se precisar a culpa e atribuir à vítima esse transtorno, que muitas vezes não tem como demonstrar a culpa do agente causador desse dano, como nos casos, por exemplo, de hipossuficência técnica.
 
A flexibilização da noção de culpa, nessa perspectiva, faz com que sejam estabelecidas, na legislação brasileira e no caso concreto, inúmeras presunções e objetivações da responsabilização civil.
 
A preocupação, hoje, funda-se muito mais na lesão ao direito do outro, com a ocorrência e previsibilidade do dano e com a reprovação do cometimento de um ato ilícito que, propriamente, em investigar a intenção do sujeito que causou o dano.
 
Tanto é que a culpa, para o Direito Civil, deve ser tratada como sendo uma ação ou omissão contrária ao próprio Direito, capaz de causar um dano, como pretende estabelecer a norma civil ao conceituar o ato ilícito.
 
Quem aborda o tema com propriedade é Anderson Schreiber, ao atentar para o fato de que:
 
“a noção teórica de culpa deixa de ser vista de forma tão rigorosa pelas cortes. Suas presunções vão se aplicando de forma cada vez mais tranquila, e a avaliação negativa do comportamento subjetivo vai, gradativamente, passando de fundamento da responsabilização para um elemento ou aspecto do complexo juízo de responsabilidade. (SCHREIBER, 2007, p. 48).”
 
A culpa presumida aparece, então, como a transição entre a responsabilidade subjetiva e a objetiva, mas não pode se confundir com a última, pois, na responsabilidade objetiva não se verifica a existência da culpa, apenas a ocorrência do dano em uma relação de causalidade.
 
O dano, por sua vez, apresentado como segundo requisito para fins de responsabilidade civil é o prejuízo causado a outrem em decorrência de uma diminuição ou destruição do bem jurídico alheio. Prejuízo este que pode ser de ordem patrimonial ou moral, como nos casos de dano à vida.
 
Para ser reparável, o dano deve ser certo, decorrente de fato preciso, não em possibilidade remota[5], ainda que seja um dano futuro, mas desde que suscetível de avaliação razoável, para que possa ser reparado ou compensado. Podendo, ainda, ser um dano de natureza patrimonial ou moral, neste último caso sem repercussão na órbita financeira do ofendido.
 
Esta a regra preconizada e abaixo confirmada de que todo aquele que causa dano a outrem é obrigado a repará-lo.
 
Para realizar a finalidade primordial de restituição do prejudicado à situação anterior, desfazendo, tanto quanto possível, os efeitos do dano sofrido, tem-se o direito empenhado extremamente em todos os tempos. A responsabilidade civil é reflexo da própria evolução do direito. (DIAS, 2006, p. 25).
 
Sem a prova do dano, portanto, ninguém poderá ser responsabilizado civilmente, tendo em vista que a inexistência do dano é óbice à pretensão de uma reparação, por não haver objeto.
 
Por último, é necessário o nexo de causalidade como requisito desencadeador da responsabilidade civil.
 
A relação de causalidade consiste na ligação entre a ação ou omissão do agente e o resultado danoso. É o liame subjetivo necessário entre o dano e a ação que o produziu, de forma que se o dano não foi causado pela ação/omissão de quem se pretende responsabilizar, não há que se falar em responsabilidade do mesmo. Conforme se depreende do conceito abaixo:
 
O conceito de nexo causal, nexo etiológico ou relação de causalidade deriva das leis naturais. É o liame que une a conduta do agente ao dano. É por meio do exame da relação causal que concluímos quem foi o causador do dano. Trata-se de elemento indispensável. A responsabilidade objetiva dispensa a culpa, mas nunca dispensará o nexo causal. Se a vítima, que experimentou um dano, não identificar o nexo causal que leva o ato danoso ao responsável, não há como ser ressarcida. Nem sempre é fácil, no caso concreto, estabelecer a relação de causa e efeito. (VENOSA, 2007,  p. 45).
 
Assim, com a análise dos elementos configuradores do instituto da responsabilidade civil é possível ingressar no estudo da indenização por danos materiais e morais.
 
Indenização em caso de Morte
A indenização é encarada neste trabalho em seu sentido lato, como gênero, no qual compensação e reparação são espécies, embora o termo indenizar, nos dizeres de Sílvio de Salvo Venosa (2007, p. 274), signifique “tornar indene o prejuízo. Indene é o que se mostra íntegro, perfeito, incólume”. Noção que se confunde com a de reparação.
 
Mas a indenização pode abranger a compensação, como acontece nos casos de danos morais, em que não há possibilidade de restaurar, restabelecer o status quo ante. Nessas hipóteses a indenização serve para remediar o dano sofrido, de forma a compensar o prejuízo moral suportado pela vítima ou seus familiares.
 
Posto isso, há que se falar ainda, que tanto no caso dos danos materiais, quanto morais, a possibilidade de indenização existirá, sempre que os requisitos de responsabilidade civil forem preenchidos, quais sejam, o dano, o nexo de causalidade e a conduta culposa, que em última análise correspondem à teoria do ato ilícito.
 
Os danos materiais, que atingem a esfera patrimonial da vítima, são mais fáceis de ser demonstrados, para se ter uma ideia, o próprio Código Civil estabelece os parâmetros para fixação dos danos materiais, como pode ser observado em seu artigo 948:
 
Art. 948. No caso de homicídio, a indenização consiste, sem excluir outras reparações:
I – no pagamento das despesas com o tratamento da vítima, seu funeral e o luto da família;
 
II – na prestação de alimentos às pessoas a quem o morto os devia, levando-se em conta a duração provável da vida da vítima.”
 
A partir deste critério, o Superior Tribunal de Justiça vem estabelecendo parâmetros para a fixação dos alimentos indenizatórios (lucros cessantes) nos casos de homicídio, ainda dentro da análise dos danos materiais, como se verifica no julgado deste Tribunal:
 
“AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. INDENIZAÇÃO. MORTE DE FILHO.ACIDENTE DE TRABALHO. DANO MORAL. PENSÃO. PARCIAL PROVIMENTO.
1. A indenização por dano moral decorrente de morte aos familiares da vítima é admitida por esta Corte, geralmente, até o montante equivalente a 500 (quinhentos) salários mínimos. Precedentes.
 
2. A pensão devida à genitora, economicamente dependente do filho falecido em acidente de trabalho, é de 2/3 (dois terços) dos ganhos da vítima fatal até a data em que completaria 25 (vinte e cinco) anos de idade, passando a 1/3 (um terço) a partir de então, quando se presume que o falecido constituiria família e reduziria o auxílio dado aos seus dependentes.
 
3. Agravo regimental a que se dá parcial provimento.
 
(AgRg no REsp 976.872/PE, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 14/02/2012, DJe 28/02/2012)”
 
Verifica-se que o patamar de lucros cessantes estabelecido em dois terços dos ganhos do falecido presume que em geral um terço deles são gastos com a própria pessoa e o restante é utilizado para as despesas familiares.
 
Já a idade de 25 anos é em média a idade que comumente a pessoa constitui nova família e, portanto, presume-se que a contribuição deve ser minorada ou até cessada.
 
Como visto, o período de pagamento desses lucros cessantes observará a expetativa média de vida do indivíduo, fornecida pelo IBGE, mas, nas hipóteses em que a vítima falece após tal expectativa, entende-se que o período de pensão indenizatória deve ser de 5 anos.
 
A dependência econômica dos familiares, por sua vez, é determinante para a fixação dos lucros cessantes, e, por isso, algumas presunções são estabelecidas para respeitar este critério.
 
Assim, o falecimento de filho menor, quando membro de família de baixa renda, enseja o pensionamento, em razão da presunção de que o mesmo, por ser de família pobre, contribui para o sustento de sua família, pelo menos dos quatorze aos vinte e cinco anos, neste sentido a jurisprudência já pacificada do Superior Tribunal de Justiça:
 
“RESPONSABILIDADE CIVIL. PENSIONAMENTO. SÚMULA N. 83⁄STJ. PROCESSO CIVIL. TERMO INICIAL DOS JUROS MORATÓRIOS. JULGAMENTO FORA DOS LIMITES DA LIDE. PEDIDO EXPRESSO. PRINCÍPIO DA VINCULAÇÃO.
1. A jurisprudência do STJ é pacífica no sentido de ser devida a indenização por dano material aos pais de família de baixa renda, em decorrência da morte de filho menor, independentemente do exercício de trabalho remunerado pela vítima.
 
2. Havendo pedido expresso da parte a respeito do termo inicial da fixação dos juros, não pode o magistrado decidir diversamente, condenando o réu em quantidade superior do que lhe foi demandado, sob pena de violação ao princípio da vinculação.
 
3. Recurso especial conhecido parcialmente e, nesta parte, provido (REsp 840.320⁄RS, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, QUARTA TURMA, julgado em 09⁄02⁄2010, DJe 18⁄02⁄2010).”
 
Este também o entendimento do Supremo Tribunal Federal ao editar a súmula 491: “é indenizável o acidente que cause a morte de filho menor, ainda que não exerça trabalho remunerado”.
 
Ressalte-se, ainda, que o bem de família pode ser usado para o pagamento dos lucros cessantes relativos aos alimentos indenizatórios, pois embora se caracterizem como indenização, têm natureza alimentar, o que enseja a exceção do artigo 3º, III, da Lei 8009/90.
 
“EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. BEM DE FAMÍLIA. OBRIGAÇÃO ALIMENTÍCIA DECORRENTE DE ATO ILÍCITO. EXCEÇÃO À IMPENHORABILIDADE. ACÓRDÃO RECORRIDO EM CONFORMIDADE COM A JURISPRUDÊNCIA DO STJ. SÚMULA 168/STJ.
1. Não há como abrigar agravo regimental que não logra desconstituir os fundamentos da decisão atacada.
 
2. Ambas as Turmas que compõem a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça possuem entendimento de que “a impenhorabilidade do bem de família prevista no artigo 3º, III, da Lei 8.009/90 não pode ser oposta ao credor de pensão alimentícia decorrente de indenização por ato ilícito. Precedentes.” (EREsp 679.456/SP, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 08/06/2011, DJe 16/06/2011) 3. Não cabem embargos de divergência quando a jurisprudência do Tribunal se firmou no mesmo sentido do acórdão embargado. (Súmula 168/STJ).
 
4. Agravo regimental a que se nega provimento.
 
(AgRg nos EAg 1.232.795/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 13/03/2013, DJe 15/03/2013)”
 
O dano moral, por sua vez, como atesta Carlos Roberto Gonçalves (2005, p. 53) é aquele que no campo dos danos não afeta o patrimônio da vítima, também não se confundindo com a dor, angústia, desgosto, aflição espiritual, humilhação, pois esses estados de espírito constituem o conteúdo, a consequência do dano.
 
Nesta seara, o dano consiste na privação de um bem jurídico, na ofensa a um direito de personalidade do ofendido.
 
Os direitos de personalidade, por serem de natureza extrapatrimonial, assim como os danos morais, encontravam séria dificuldade em garantir o dever geral de abstenção aos direitos do outro. Mas foi a incorporação destes últimos, no ordenamento jurídico brasileiro, que a tutela pretendida foi consagrada para os casos de lesão a esses direitos de personalidade.
 
Mas, como se analisa, embora não haja norma específica que regulamente os danos morais nos casos de morte, o ordenamento jurídico brasileiro dispõe de normas capazes de fundamentar a compensação pecuniária para os familiares da vítima.
 
Assim, como nos demais casos de responsabilização civil, para se falar em indenização por danos morais, imprescindível a configuração do dano. Em outras palavras, inarredável a caracterização do ato ilícito, dano, culpa e nexo de causalidade.
 
Dessa forma, o bem jurídico tutelado deve ser protegido de qualquer ameaça ou lesão, encontrando na responsabilidade civil, por danos morais, proteção jurisdicional, cuja natureza é ressarcitória, mas, também, preventiva e coercitiva.[6]
 
Isso porque, em se tratando de danos morais, atinentes aos direitos de personalidade do lesado, a responsabilidade civil tem caráter compensatório, vez que não é possível restabelecer a situação anterior, como já mencionado.
 
Na responsabilidade civil por danos materiais, ao revés, é possível reparar propriamente o dano, com o ressarcimento ou a recomposição do prejuízo suportado pela vítima.
 
Nos casos de indenização por morte, os danos morais pleiteados pelos herdeiros só terão o condão de compensar o sofrimento e a dor experimentada, pois não é possível reparar a vida perdida.
 
Contudo, é importante medida preventiva, além de ter função dissuasória, no exato momento em que assume um caráter educativo, sinalizando à sociedade que a violência, é reprovada do ponto de vista ético jurídico, com o consequente estímulo ao equilíbrio das relações.
Critérios de Fixação do Quantum Indenizatório
A quantificação do dano moral, ainda hoje, é encarada com dificuldade, tendo em vista que tem por escopo compensar um dano que não é patrimonial e, portanto, não tem preço.
 
No Brasil, adota-se o sistema aberto de quantificação dos danos morais e não o sistema de tarifação, motivo pelo qual compete subjetivamente ao juiz fixar o quantum indenizatório. (GAGLIANO;  PAMPLONA FILHO, 2010).
 
Cabe ao julgador, diante de um pedido de indenização por danos morais, valendo-se das normas vigentes, dos parâmetros legais, da jurisprudência e, principalmente da peculiaridade do caso concreto, fixar a indenização adequada à compensação dos danos suportados pelos familiares da vítima.
 
Não há como pré-definir um valor, apenas diante do caso concreto o juiz poderá arbitrar uma quantia razoável. Ao mesmo tempo, a condenação do causador do dano não deverá comprometer sua dignidade, nem deixar de verificar a extensão do dano e as peculiaridades do caso.
 
Devendo o juiz, no caso concreto, agir com cautela e razoabilidade, a fim de impedir pretensões desonestas, que fogem à finalidade a que o instituto se destina.
 
Nesse sentido, observa-se que o Superior Tribunal de Justiça tem tentado estabelecer alguns parâmetros para fixação dos danos morais, especificamente com relação às indenizações por morte, como é possível verificar no seguinte julgado:
 
“RESPONSABILIDADE CIVIL. RECURSO ESPECIAL. ACIDENTE AÉREO. QUEDA DE HELICÓPTERO. MORTE DE PASSAGEIROS. PLEITOS INDENIZATÓRIOS DEDUZIDO POR DESCENDENTES E CÔNJUGE/COMPANHEIRA DE DUAS VÍTIMAS DO EVENTO.
RESPONSABILIDADE CIVIL DA EMPRESA DE TAXI AÉREO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7. TERMO INICIAL DA CORREÇÃO MONETÁRIA. MATÉRIA PRECLUSA.
LITISDENUNCIAÇÃO. RESISTÊNCIA. ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA.
1. Não se conhece de alegação de ofensa ao art. 535 do CPC quando formulada de modo genérico, sem indicação precisa do ponto supostamente omisso, contraditório ou obscuro. Aplicação da Súmula n. 284/STF.
 
2. “É inadmissível o recurso extraordinário, quando a decisão recorrida assenta em mais de um fundamento suficiente e o recurso não abrange todos eles” (Súmula n. 283/STF).
 
3. A responsabilidade civil da empresa de taxi aéreo está proclamada com base na apreciação das provas produzidas nos autos, bem como das normas regulamentares que disciplinam as exigências para sobrevoos e para a sinalização da rede elétrica. Impossibilidade de análise de normas de caráter infralegal. Incidência também da Súmula 7/STJ.
 
4. Em se tratando de danos morais, o sistema de responsabilidade civil atual rechaça indenizações ilimitadas que alcançam valores que, a pretexto de reparar integralmente vítimas de ato ilícito, revelam nítida desproporção entre a conduta do agente e os resultados ordinariamente dela esperados.
 
5. É certo que a solução de simplesmente multiplicar o valor que se concebe como razoável pelo número de autores tem a aptidão de tornar a obrigação do causador do dano demasiado extensa e distante de padrões baseados na proporcionalidade e  razoabilidade. Por um lado, a solução que pura e simplesmente atribui esse mesmo valor ao grupo, independentemente do número de integrantes, também pode acarretar injustiças. Isso porque, se no primeiro caso o valor global pode se mostrar exorbitante, no segundo o valor individual pode se revelar diluído e se tornar ínfimo, hipóteses opostas que ocorrerão no caso de famílias numerosas.
 
6. Portanto, em caso de dano moral decorrente de morte de parentes próximos, a indenização deve ser arbitrada de forma global para a família da vítima, não devendo, de regra, ultrapassar o equivalente a quinhentos salários mínimos, podendo, porém, ser acrescido do que bastar para que os quinhões individualmente considerados não sejam diluídos e nem se tornem irrisórios, elevando-se o montante até o dobro daquele valor.
 
7. A discussão acerca do termo inicial da correção monetária está preclusa, tendo em vista ter sido definida na sentença e não impugnada pelas partes. Manutenção do termo inicial da correção monetária quanto à indenização devida a Shirley Galli Taylor.
 
8. Havendo resistência da litisdenunciada, mostra-se de rigor haver condenação aos ônus da sucumbência. Incidência da Súmula 7/STJ.
 
9. Recursos especiais conhecidos em parte e, na extensão, parcialmente providos.
 
(REsp 1.127.913/RS, Rel. Ministro MARCO BUZZI, Rel. p/ Acórdão Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 20/09/2012, DJe 30/10/2012)”
Nesse caso, constata-se que para estabelecer o quantum indenizatório é necessário estipular a indenização de forma global para os parentes da vítima. Verifica-se, ainda, que o STJ, tenta fixar um teto de quinhentos salários mínimos para compensação dos danos morais em caso de morte, como forma de estabelecer um parâmetro para os julgadores, como se observa:
 
“AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL POR ACIDENTE AUTOMOBILÍSTICO. MORTE DA VÍTIMA. INDENIZAÇÃO COM VALORES NÃO EXCESSIVOS. REVISÃO VEDADA.
1. No recurso especial, rever a indenização por danos morais só é possível quando a quantia for irrisória ou exagerada, o que não ocorre quando o valor é inferior a 500 (quinhentos) salários mínimos para cada um dos autores pela morte do pai.
 
2. Agravo regimental não provido.
 
(AgRg nos EDcl no AREsp 25.258/RJ, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 21/02/2013, DJe 26/02/2013).”
 
No entanto, para se chegar aos valores, o STJ tem-se utilizado do critério bifásico, percorrendo inicialmente o valor que normalmente se fixa para casos semelhantes e posteriormente agregam-se as circunstâncias específicas do caso, majorando ou reduzindo o valor básico localizado na fase inicial.
 
Em geral, mede-se a indenização pela extensão do dano e não pelo grau da culpa. No caso do dano moral, entretanto, o grau de culpa também é levado em consideração, juntamente com a gravidade, extensão e repercussão da ofensa, bem como a intensidade do sofrimento acarretado à vítima. A culpa concorrente do lesado constitui fator de atenuação da responsabilidade do ofensor. Além da situação patrimonial das partes, deve-se considerar, também, como agravante o proveito obtido pelo lesante com a prática do ato ilícito. A ausência de eventual vantagem, porém, não o isenta da obrigação de reparar o dano causado ao ofendido. Aduza-se que notoriedade e fama deste constituem fator relevante na determinação da reparação, em razão da maior repercussão do dano moral, influindo na exacerbação do quantum da indenização. (GONÇALVES, 2005, p. 401).
 
Com a análise dos parâmetros utilizados atualmente no momento de fixação dos danos morais, nos casos de morte, percebe-se que a família da vítima terá direito a uma indenização por danos materiais e morais, os últimos como forma de compensar o dano sofrido pela perda do ente familiar, que deverá ser arbitrada pelo juiz no caso concreto.
 
Considerações Finais
Não há um critério absoluto passível de ser determinado no momento de fixação dos danos morais, uma vez que se adota no Brasil o sistema aberto de quantificação de tais danos.
 
No entanto, necessário se faz estabelecer parâmetros para facilitar e uniformizar o entendimento no que se refere à ao quantum indenizatório nos casos de morte.
 
Para tanto foram apresentadas as mais recentes decisões sobre o arbitramento dos danos morais em caso de homicídio, demonstrando que o Superior Tribunal de Justiça preocupa-se com a compensação de tais danos, sem deixar de observar as peculiaridades do caso concreto que, em última análise, determinam como a indenização deverá ser fixada.
 
Assim, é possível apontar os critérios observados pelo julgador, como por exemplo, um teto a nortear as decisões, a verificação da extensão do dano, a capacidade econômica das partes, idade e profissão da vítima e de seus familiares.
 
Enfim, o presente artigo abordou os mais recentes julgados sobre o caso e sua interpretação para facilitar a compreensão do instituto e suas peculiaridades.
 
Referências
CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de responsabilidade civil. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2005.
 
DIAS, José de Aguiar. Da irresponsabilidade civil. 11 ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2006.
 
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. vol. 7. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 2007.
 
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil. Vol III: responsabilidade civil. 8 ed. rev.  e atual. São Paulo: Saraiva, 2010. 
 
GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. 9 ed. São Paulo: Saraiva, 2005.
 
STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004.
 
TEPEDINO, Gustavo. A Evolução da Responsabilidade Civil no Direito Brasileiro e suas Controvérsias na Atividade Estatal. In: Temas de Direito Civil. 4 ed. Rio de Janeiro. Renovar, 2008.
 
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil. vol. 4. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2007.
 
Notas
[2] Negligência, imprudência ou imperícia.
 
[3] Intenção de agir, ação ou omissão voluntária.
 
[4] Noção depreendida do comando legal do parágrafo único, do artigo 927, do atual Código Civil, que estabelece que “haverá obrigação de reparar o dano independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem” (BRASIL, 2002).
 
[5] Embora não haja previsão legal, existe a responsabilização por danos morais no que se convencionou chamar de perda de uma chance, como sendo um dano futuro.  Como este tema não tem aplicação no presente estudo, aos interessados, recomenda-se a leitura do artigo de Eduardo Abreu Biondi (2009).
 
[6] Recomenda-se a leitura de Moraes (2003).
Autor (a): Luciana Fernandes Berlini, coordenadora dos cursos de pós-graduação da Faculdade Estácio de Sá, professora de Direito de cursos de graduação e pós-graduação, mestre e doutora em Direito Privado pela PUC/Minas e advogada.