Deve ser ressaltado, de início, que o objetivo do legislador, ao regulamentar a incidência dos encargos antes mencionados – atualização monetária, remuneração do capital e compensação da mora -, foi uniformizar o cômputo da correção monetária e dos juros incidentes sobre todas as condenações impostas à Fazenda Pública, haja vista que, até então, inexistia positivação acerca do índice a ser utilizado para a atualização do valor devido. No que diz respeito aos juros, a legislação e a jurisprudência estabeleciam patamares e momentos de incidência diversos para cada situação, em dependendo da natureza da condenação – artigo 167, parágrafo único, do Código Tributário Nacional; artigo 1º – F, da Lei 9.494/97, na redação anterior, dada pela Medida Provisória 2.180-35, de 2001; Súmulas 54, 188 e 204, do Superior Tribunal de Justiça; entre outras.
O primeiro questionamento acerca da nova disposição diz respeito à sua aplicação. Embora se refira a um fato procedimental – a condenação imposta à Fazenda Pública -, a norma em questão regula, na verdade, direito material: a atualização monetária, a remuneração do capital e a compensação da mora. Logo, em virtude do nítido cunho de direito material que integra a alteração legislativa objeto deste estudo, a nova disposição do artigo 1º – F, da Lei 9.494/97, apenas se aplica aos feitos ajuizados após a sua vigência – 29 de junho de 2009 -, não abrangendo os processos já em tramitação na data da publicação da Lei 11.960/2009.
Em conseqüência, nas condenações impostas à Fazenda Pública, em processos ajuizados a partir de 29 de junho de 2009, independentemente da natureza da causa, a atualização monetária do valor devido, a remuneração do capital e a compensação da mora – ou seja, o cômputo da correção monetária e dos juros – observarão única incidência, até o efetivo pagamento, dos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança: variação da taxa referencial (TR) e juros de 0,5% por cento ao mês.
Ao estipular que os encargos acima incidirão nas condenações impostas à Fazenda Pública, independentemente de sua natureza, o legislador deu sentido unívoco à interpretação do dispositivo, no sentido de que a nova sistemática de cômputo de juros e correção monetária abrange toda e qualquer sentença condenatória, sem qualquer ressalva, incluindo o principal da condenação e seus consectários – honorários de advogado, custas e despesas processuais.
Conquanto existentes respeitáveis opiniões em contrário, o raciocínio acima exposto justifica a aplicação da novel legislação também às condenações proferidas em desfavor da Fazenda Pública em matéria tributária, especialmente às relacionadas à restituição do indébito.
A justificativa para a desconsideração dos termos da Lei 11.960/2009 na restituição do indébito tributário reside na natureza de lei complementar da Lei 5.172/1966, cujos dispositivos não seriam passíveis de revogação por lei ordinária, e na existência de norma especial no Código Tributário Nacional regulamentando a matéria – artigo 167.
Todavia, renovando a vênia respeitosa ao entendimento diverso, parece-nos que a abrangência da nova redação do artigo 1º – F, da Lei 9.494/1997, que não se limita à mensuração dos juros, pois vai além para também abarcar o cômputo da correção monetária, desautoriza o afastamento de sua incidência na repetição do indébito tributário.
Na definição que já é clássica, a atualização monetária não é um plus que se acrescenta à dívida, mas sim um minus que se busca evitar. Assim, antes da incidência de qualquer encargo legalmente previsto sobre o valor devido, impõe-se a correção monetária do montante pecuniário, para que se mantenha o poder de compra da moeda.
Em conseqüência, inexistindo no Código Tributário Nacional qualquer dispositivo acerca da correção monetária do valor a ser repetido, tem a Lei 11.960/2009 plena aplicação à repetição do indébito tributário, sem que reste configurada qualquer violação à hierarquia de normas.
Contudo, corrigido o valor devido pelos índices oficiais de remuneração da caderneta de poupança, não mais há lugar para a incidência de juros de mora, haja vista que os “índices oficiais” previstos no artigo 1º – F, da Lei 9.494/1997, para a atualização do valor devido, já contêm em seu bojo o cômputo de juros, pois a caderneta de poupança é sabidamente remunerada com a variação da Taxa Referencial – TR e juros de meio por cento ao mês.
Logo, ante a impossibilidade de dupla incidência de juros – os juros já previstos nos índices oficiais da remuneração da caderneta de poupança e os juros do artigo 167, parágrafo único, do C.T.N. -, impõe-se o cômputo apenas dos encargos da Lei 9.494/97, haja vista que a sistemática legal de atualização da dívida já conta com juros em seu bojo, afastando, em conseqüência, os demais dispositivos legais que regulamentam a incidência de juros na restituição do indébito tributário.
A interpretação acima adotada também repele a discussão acerca do termo a quo da incidência dos juros. Corrigida a dívida pelos índices oficiais de remuneração das cadernetas de poupança, os encargos da Lei 9.494/1997 devem incidir desde a data do pagamento indevido, para a já mencionada preservação do poder de compra da moeda. Assim, além de impossibilitada a nova incidência de juros, pois o encargo já integra o índice de correção adotado, não há lugar para o cômputo desde o trânsito em julgado da sentença (artigo 167, parágrafo único, do C.T.N.).
Idêntico raciocínio também impede a correção da dívida pela taxa SELIC. Sendo certo que a taxa em tela, embora contenha a natureza dúplice de índice de correção monetária e de juros de mora, tem sua aplicação fulcrada nos ditames do artigo 161, parágrafo1º, do C.T.N., a prévia correção do valor devido pelos índices oficiais de remuneração da caderneta de poupança, conforme determinado no artigo 1º – F, da Lei 9.494/97, desautoriza a posterior perquirição da taxa de juros a ser aplicada, pois, conforme já mencionado, os encargos da caderneta de poupança contêm juros em seu âmago.
Em conclusão, nas condenações proferidas em desfavor da Fazenda Pública, em feitos ajuizados a partir da vigência da Lei n. 11.960, de 29 de junho de 2009, apenas incidirão os encargos previstos no artigo 1º-F, da Lei 9.494/97, ainda que se trate de restituição de indébito tributário.