Esclarecimentos do perito em audiências
*Gilberto Melo
1. Introdução
O Perito cumpre o papel de auxiliar do Juízo na prestação jurisdicional, encarregando-se de supri-lo de elementos técnicos de matéria técnica específica, para que a decisão tenha um substrato fático bem delineado e fundamentado. Diz o artigo 139 do Código de Processo Civil (CPC):
Art. 139. São auxiliares do juízo, além de outros, cujas atribuições são determinadas pelas normas de organização judiciária, o escrivão, o oficial de justiça, o perito, o depositário, o administrador e o intérprete.
Diz, ainda, o CPC em seu artigo 145:
Art. 145. Quando a prova do fato depender de conhecimento técnico ou científico, o juiz será assistido por perito, segundo o disposto no art. 421.
Definida, então, a função do perito no processo judicial, regulada em vários artigos do mesmo Código, ele atua de modo independente, imparcial e estritamente técnico, contatando e ouvindo os assistentes técnicos, fugindo de interpretação de leis e evitando formação de juízo de valor sobre questões fora de sua área de competência profissional. Todo o seu trabalho é feito por escrito, a partir de amplo acesso aos autos e a outros elementos que lhe são acessíveis conforme o artigo 429 do CPC:
Art. 429. Para o desempenho de sua função, podem o perito e os assistentes técnicos utilizar-se de todos os meios necessários, ouvindo testemunhas, obtendo informações, solicitando documentos que estejam em poder de parte ou em repartições públicas, bem como instruir o laudo com plantas, desenhos, fotografias e outras quaisquer peças.
Além dos quesitos principais a legislação processual permite, ainda, a apresentação de quesitos suplementares, desde que levados aos autos antes do protocolo do laudo oficial em juízo:
Art. 425. Poderão as partes apresentar, durante a diligência, quesitos suplementares. Da juntada dos quesitos aos autos dará o escrivão ciência à parte contrária.
Os quesitos suplementares são igualmente respondidos por escrito pelo perito, em seu local de trabalho e ainda sem contato direto com as partes ou seus advogados, mas somente com os seus representantes na matéria técnica, os assistentes técnicos. Ainda assim, em relação aos assistentes técnicos, deve o perito prudentemente ouvir as observações e as críticas ao seu trabalho e adaptá-lo ou não segundo a sua própria convicção.
A despeito de haver previsão de pedido de esclarecimentos somente em audiência (art. 435 do CPC), é possível que o Juiz determine ao perito, independentemente da realização de audiência, que faça carga dos autos e responda o pedido de esclarecimentos. Esta complementação do trabalho pericial é aceitável desde que apresentados nos autos mediante a formulação de quesitos, os quais devem ser meramente elucidativos (e não novos quesitos). O perito faz carga do processo para que sejam respondidas as indagações por escrito e protocoladas para serem juntados aos autos.
2. Esclarecimentos em audiência
Situação inusitada ocorre, entretanto, quando há a solicitação de esclarecimentos em audiência, previstos no artigo 435 do CPC, verbis:
Art. 435. A parte, que desejar esclarecimento do perito e do assistente técnico, requererá ao juiz que mande intimá-lo a comparecer à audiência, formulando desde logo as perguntas, sob forma de quesitos.
Parágrafo único. O perito e o assistente técnico só estarão obrigados a prestar os esclarecimentos a que se refere este artigo, quando intimados cinco dias antes da audiência.
O que há de novo nos esclarecimentos em audiência é o contato pessoal com o Juiz, as partes e seus advogados. Esta situação de exposição normalmente causa apreensão ao perito ainda desconhecedor das regras processuais, pois a matéria que trabalha é técnica, dependendo normalmente de um exame acurado dos autos e de outros elementos que componham a prova pericial.
Receia o perito que possa ser colocado em situação desconfortável, eventualmente sendo demandado em questões que não possa responder de pronto ou que perca suas referências técnicas ao se ver envolto nas questões processuais, matéria que não domina.
Não há, entretanto, motivo para receio ou tensão ao se prestar esclarecimentos em audiência. O Código de Processo Civil prescreve claramente os procedimentos para a produção de prova mediante esclarecimentos em audiência, fixando cristalinamente os seguintes pontos:
• O perito só é obrigado a prestar esclarecimentos em audiência se formulados através de quesitos (art. 435, caput) e desde que seja intimado pelo menos cinco dias antes da audiência (parágrafo único do mesmo artigo).
• Já que os esclarecimentos só podem ser pedidos através de quesitos e com uma antecedência de pelo menos cinco dias em relação à audiência, o perito poderá ter acesso aos autos, examinar bem a questão e apresentar a resposta por escrito, previamente protocolada ou entregue diretamente na audiência.
Ora, se a matéria é técnica, é apresentada na forma de quesitos e pode ser respondida por escrito, esvazia-se a possibilidade de desconforto do perito. O que ocorre muitas vezes é que o Juiz, mediante a apresentação dos esclarecimentos por escrito, dispensa o seu depoimento que a rigor seria a leitura do que já respondeu por escrito.
É óbvio, entretanto, que o Juiz poderá pedir ao perito alguma informação suplementar para subsidiar o seu convencimento, mas sempre haverá a possibilidade, se necessário, de que se conceda um prazo para que o perito responda questões que dependerão de um exame mais detalhado dos autos, da elaboração de cálculos ou de outros procedimentos que não poderiam ser levados a efeito de pronto, no curso da audiência.
Vale acrescentar que, tendo o perito protocolado seus esclarecimentos por escrito, o Juiz da causa abre vista para as partes após a audiência ou deixa que as considerações sobre os esclarecimentos venham nos memoriais.
3. Procedimentos durante a audiência
Outros aspectos importantes para aplacar a ansiedade do perito são previstos no artigo 436:
Art. 446. Compete ao juiz em especial:
I – dirigir os trabalhos da audiência;
II – proceder direta e pessoalmente à colheita das provas;
III – exortar os advogados e o órgão do Ministério Público a que discutam a causa com elevação e urbanidade.
II – proceder direta e pessoalmente à colheita das provas;
III – exortar os advogados e o órgão do Ministério Público a que discutam a causa com elevação e urbanidade.
Parágrafo único. Enquanto depuserem as partes, o perito, os assistentes técnicos e as testemunhas, os advogados não podem intervir ou apartar, sem licença do juiz.
O inciso II deixa claro que o Juiz, direta e pessoalmente procede à colheita das provas, só ele é quem pergunta ao perito e demais depoentes. Os advogados devem formular as perguntas ao Juiz, que entendendo-as pertinentes questionará pessoalmente o perito ou outros depoentes. O perito, por sua vez, sempre dirigirá a palavra ao Juiz, e não aos advogados ou às partes.
4. Ordem de manifestação em audiência
I – o perito e os assistentes técnicos responderão aos quesitos de esclarecimentos.
…
O parágrafo único fecha de vez a questão de que o Juiz é quem dirige os trabalhos, quando prevê que os advogados não podem intervir ou apartar sem licença do magistrado.
4. Ordem de manifestação em audiência
O artigo 452, inciso I do CPC estatui que o perito e os assistentes técnicos serão ouvidos em primeiro lugar:
Art. 452. As provas serão produzidas na audiência nesta ordem:
I – o perito e os assistentes técnicos responderão aos quesitos de esclarecimentos.
…
5. Conclusão
O que se depreende da análise dos referidos textos legais é que o perito é auxiliar do Juízo e não poderá ser submetido ao constrangimento de ter que responder de pronto a indagações sobre a prova pericial sem o exame necessário dos autos ou de outros elementos, assim como não terá que responder diretamente aos advogados, mantendo assim a oportunidade de ter o tempo necessário para as suas análises, a sua independência e imparcialidade, qualidades essenciais para o perfeito desempenho do munus.
O que se depreende da análise dos referidos textos legais é que o perito é auxiliar do Juízo e não poderá ser submetido ao constrangimento de ter que responder de pronto a indagações sobre a prova pericial sem o exame necessário dos autos ou de outros elementos, assim como não terá que responder diretamente aos advogados, mantendo assim a oportunidade de ter o tempo necessário para as suas análises, a sua independência e imparcialidade, qualidades essenciais para o perfeito desempenho do munus.
* O Autor é parecerista jurídico-econômico-financeiro, especialista em liquidação de sentença e cálculos judiciais, extrajudiciais e de precatórios, propositor da tabela uniforme de fatores de atualização monetária para a Justiça Estadual aprovada no 11º ENCOGE, engenheiro, advogado e pós-graduado em contabilidade, com site em www.gilbertomelo.com.br.