A lei, originária da Medida Provisória (MP) nº 517, de 2010, manteve os 15 artigos que tratam de precatórios e estabelecem prazos e procedimentos para essa compensação que, mesmo antes da regulamentação, já era aplicada por juízes de São Paulo, do Distrito Federal e da região Sul.
Na prática, a norma impõe que, após a condenação da União, o magistrado dará 30 dias para a Fazenda Nacional se manifestar em relação a eventuais dívidas do credor ou parcelamentos. O juiz então estabelecerá um prazo de 15 dias para que o credor possa apresentar eventuais impugnações, que só serão admitidas quando for comprovada que a dívida está suspensa, o débito extinto ou que houve erro no cálculo. Depois disso, o magistrado terá dez dias para decidir sobre os valores que poderão ou não ser compensados. Dessa decisão, ainda cabe recurso com o chamado agravo de instrumento, que impede a requisição do precatório até que seja julgado o mérito da discussão.
Segundo o advogado Gustavo Viseu, do Viseu Advogados, membro da Comissão da Dívida Pública da seccional paulista da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a norma cria praticamente uma nova fase processual para viabilizar essas compensações e deve arrastar ainda mais o fim dessas ações. Até porque o juiz deverá levar para o processo a discussão sobre outras dívidas das empresas. “O que só interessaria à própria Fazenda” afirma Viseu, lembrando que a lei já nasce ameaçada. “Se a Emenda 62, em análise no Supremo Tribunal Federal (STF), for declarada inconstitucional, de nada valerá essa regulamentação.”
O considerado excesso de prazos trazido pela lei e a possibilidade de trazer outras discussões judiciais ao processo também preocupam a advogada Luiza Perez, da Advocacia Ulisses Jung, que já assessora empresas que estão sofrendo esses encontros de contas. Para ela, essa demora pode inviabilizar a expedição dos precatórios no limite constitucional. O artigo 100 da Constituição prevê que os títulos apresentados até 1º de julho devem ser pagos no ano seguinte. Caso contrário, o precatório a ser emitido não entra na fila do próximo ano e demora ainda mais para ser pago.
Porém, nem todas as empresas deverão achar ruim esse encontro de contas, na opinião de Isabela Bonfá, do Bonfá de Jesus Sociedade de Advogados. “É claro que todas as companhias preferem receber em dinheiro. Mas isso é uma forma de eliminar pendências“, diz. Se houver alguma insatisfação, afirma ela, as empresas poderão utilizar da impugnação prevista em lei.
O advogado Renato Nunes, do Nunes & Sawaya Advogados afirma estar preocupado com eventuais lançamentos da Receita Federal durante o levantamento de dívidas. Isso porque as companhias poderão ser obrigadas a abater valores que não devem, que ainda estão em discussão judicial e administrativa. “Se isso for compensado e posteriormente a empresa ganhar a discussão, ela terá que entrar com uma nova contestação para reivindicar valores pagos a maior, que demorará anos para ser analisada“, diz.
Para a procuradora da Fazenda Nacional que atua em São Paulo e professora de direito tributário Helena Junqueira, a nova lei, porém, deve dar mais agilidade a esses processos, ao firmar prazos para cada etapa. Segundo ela, desde a edição da emenda os juízes já vinham chamando a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) para se manifestar, mas não havia limite em lei para que esses casos fossem finalizados. Nos processos em que ela atua, ainda não houve a conversão desses valores para os cofres públicos. “Acredito, no entanto, que essa possibilidade deva trazer um resultado bastante significativo em relação aos débitos em aberto com a União“, diz.
A presidente Dilma Rousseff sancionou com vetos a Medida Provisória nº 517. Foi derrubado o artigo que permitia o pagamento de dívidas com o governo usando títulos públicos antigos pelo valor integral, bem maior que o valor de mercado. Essa medida beneficiaria donos de bancos em liquidação judicial.
Esse artigo permitia que moedas podres fossem negociadas com descontos por investidores privados – em um benefício direto aos bancos. Segundo alguns senadores, a regra seria uma medida para salvar banqueiros que enfrentam processos de falência, ligados aos bancos Nacional, Econômico, Mercantil de Pernambuco e Banorte.
A Presidência justificou o veto afirmando que “a proposta ainda favorece os devedores em detrimento da administração pública” porque retira do governo a possibilidade de definir o critério de cálculo menos danoso ao erário para receber garantias do Fundo de Compensação de Variações Salariais.
Outro veto impede que sociedades anônimas, com ativos inferiores a R$ 240 milhões ou receitas brutas anuais inferiores a R$ 500 milhões, publiquem suas demonstrações financeiras na íntegra apenas na internet. Na justificativa, a Presidência diz que “os dispositivos ampliam o limite do valor do faturamento anual para dispensa da publicação da íntegra das demonstrações financeiras e demais atos societários sem apresentar mecanismos que assegurem adequadamente a publicidade e a transparência das informações aos seus acionistas e à sociedade“.
Também foi excluído da medida provisória um artigo que revogava a exigência da estimativa de renúncia fiscal para universidades inscritas no Programa Universidade para Todos (Prouni). “A revogação do dispositivo subtrai um mecanismo relevante para a avaliação do impacto dos benefícios fiscais concedidos“, argumentou a Presidência.
A MP 517 prevê entre outros assuntos a renovação por mais 25 anos de um encargo que custa cerca de R$ 2 bilhões por ano na conta de luz dos brasileiros, além de incentivo a energia nuclear e incentivo fiscal para bens de informática.
Autor (a): Adriana Aguiar
Fonte: Valor Econômico