A 3ª Turma do STJ, em voto da relatoria da ministra Nancy Andrighi, entendeu por unanimidade que procedimentos arbitrais com sede no Brasil, mesmo que regidos e administrados por instituições arbitrais estrangeiras, são considerados procedimentos domésticos. Este entendimento confere às sentenças proferidas em tais procedimentos força executiva imediata, afastando a necessidade de procedimento homologatório prévio perante o Órgão Especial do próprio STJ.
No caso em concreto, a 3ª Turma reverteu decisão anteriormente proferida em sede recursal pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJ-RJ), que havia entendido que a eleição de instituição internacional para administração de procedimento arbitral desloca a natureza de referido procedimento, mesmo que este tenha sido processado na cidade do Rio de Janeiro, tendo seu laudo final sido emitido na mesma localidade. A exemplo de outros inúmeros precedentes importantes já criados em relação à moldura legal do instituto da arbitragem no país, os ministros, em uma clara e correta aplicação do artigo 34 da Lei de Arbitragem brasileira, reverteram o julgado do tribunal estadual ao esclarecer que a eleição de instituição estrangeira não desvirtua a nacionalidade pátria do laudo arbitral produzido, quanto este for efetivamente feito em território brasileiro.
Embora o caso concreto não envolva contratos com a administração pública ou parcerias público privadas, sua fundamentação é de extrema importância para o uso da arbitragem como forma de solução de controvérsias surgidas destas relações. Tanto o artigo 11 da Lei de Parcerias Público Privadas, quanto o artigo 23-A da Lei nº 8987, de 1995, que dispõe sobre o regime de concessão e permissão de serviços públicos, facultam a possibilidade de uso da arbitragem nos contratos regidos por tais normativos, desde que a cláusula de arbitragem contida nos respectivos contratos estabeleça que a arbitragem será realizada no Brasil e em língua portuguesa.
O novo precedente do STJ deixa claro que a utilização de instituição estrangeira na administração do procedimento arbitral não desnatura o caráter doméstico de um procedimento arbitral, desde que este esteja sediado no Brasil e, aqui, seja proferida a sentença arbitral. Embora o país conte com excelentes centros locais para a administração de procedimentos arbitrais, muitos dos quais já existentes até mesmo antes da entrada em vigor da Lei de Arbitragem em 1996 e capazes de administrar inúmeros casos de alta complexidade ao mesmo tempo, investidores estrangeiros tendem a preferir a utilização de instituições com as quais estão mais habituados.
Como tem sido uma constante desde a reforma constitucional do Judiciário em 2005, quando o STJ passou a atuar mais próximo a questões relacionadas a arbitragem e em especial à homologação de laudos estrangeiros, mais uma vez nossa principal Corte infraconstitucional andou muito bem ao aplicar, de forma extremamente técnica e objetiva, os preceitos contidos no texto da Lei de Arbitragem, conferindo ao instituto a segurança jurídica necessária para a sua ampla utilização no território brasileiro.
A confirmação da possibilidade de uso de instituições internacionais arbitrais renomadas na administração de casos relacionados a investimentos em infraestrutura e contratos com o Estado brasileiro, sem que o uso de tais instituições desnature o caráter doméstico das arbitragens sediadas no Brasil, garante à comunidade internacional confiança na neutralidade e previsibilidade na condução de procedimentos que eventualmente possam surgir dos inúmeros serão feitos nesta área ao longo desta década.
Autor (es): Pedro Soares Maciel e Carlo de Lima Verona, sócios de Veirano Advogados
Fonte: Valor Econômico