Segundo o relator do caso, ministro Luis Felipe Salomão, o valor original da dívida – correspondente na época ao preço de um carro popular – alcançou, em 14 anos, o equivalente ao preço de 55.180 carros populares. Para ele, em vez de rejeitar os embargos à execução opostos pelo devedor, o juízo de primeira instância “deveria ter revisado o contrato de adesão”, para apurar eventual abuso nos encargos, conforme previsto pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC).
O devedor alega que, após a assinatura do contrato, em novembro de 1993, a CEF teria engendrado uma equação matemática unilateral e imprecisa, para chegar ao valor de mais de R$ 1,225 bilhão em 2007. O Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF5) confirmou a sentença que julgara improcedentes os embargos à execução, afirmando que caberia ao devedor ter contestado a veracidade das informações prestadas pela contadoria judicial, segundo as quais o valor cobrado pela CEF seria adequado às disposições do contrato.
CDC
A defesa do executado alegou em recurso ao STJ que seria possível a incidência do Código de Defesa do Consumidor e, consequentemente, a revisão judicial do contrato. O feito relativo aos embargos está sobrestado no TRF desde novembro de 2009, e o processo executivo foi arquivado em abril de 2012, por não haver bens para penhora, podendo ser reativado se tais bens forem localizados.
De acordo com o relator, “é pacífica a submissão dos contratos bancários às regras do CDC”. Ele acrescentou que a Segunda Seção do STJ firmou em recurso repetitivo o entendimento de que “é admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade fique cabalmente demonstrada ante as peculiaridades do julgamento em concreto”.
A Quarta Turma entendeu ainda que é possível o questionamento das cláusulas contratuais de mútuo em embargos do devedor, tanto quanto em ação revisional, porque ambas têm o caráter de demanda cognitiva prejudicial à execução. Além disso, segundo o ministro Salomão, os embargos veiculam matéria ampla de defesa – pois visam discutir a própria formação do título executivo – e excesso de execução, o que, se acolhido, acarretará a redução do débito.
Embora seja vedado ao juiz apreciar de ofício (sem provocação da parte) o caráter abusivo de cláusulas bancárias, Salomão observou que, no caso julgado, o devedor tentou caracterizar essa abusividade ao apontar excesso de execução, principalmente por causa da suposta ilegalidade dos índices de juros e correção monetária, da comissão de permanência, do IOF e dos juros moratórios.
Perícia rejeitada
Em seu voto, Luis Felipe Salomão destacou que o devedor havia requerido a produção de prova pericial, mas a CEF se manifestou contrária, ao argumento de que a planilha apresentada teria seguido rigorosamente as cláusulas do contrato. A perícia foi indeferida pelo juiz.
“Por reiteradas vezes, a contadoria judicial solicitou ao juízo fosse oficiada a CEF para esclarecer sobre a memória de cálculos apresentada, denotando, assim, não só a complexidade das contas, como também a absoluta falta de clareza na sua elaboração”, relatou o ministro. Ele comentou que os cálculos da contadoria foram de fato realizados com observância das cláusulas contratuais, “especialmente aquelas manifestamente abusivas”.
O relator apontou que a mesma dívida, em 2001, a partir das mesmas taxas de juros informadas pela CEF (37,92% a 47,01% ao mês), foi calculada em dois valores diferentes: R$ 111,9 mil e R$ 8,8 milhões. O último valor prevaleceu na execução.