Gilberto Melo

O Judiciário e o implemento de suas decisões

Não terá investidor, instituição financeira, Caixa, Santander, Real, poupador, governo que não será afetado pela próxima decisão do ministro Sidnei Beneti, do STJ.

O país será outro. Será posto a limpo. Terá virado a página definitivamente. Os planos econômicos, os verdadeiros esqueletos econômicos, sairão de seus respectivos armários processuais, e se diluirão no ar livre da justiça. Para o bem de uns, para o mal de outros. Para o melhor do Brasil.

Faz cerca de 15 dias, e quase na surdina publicidade dos diários oficiais e dos saites judiciais, que o ministro Beneti (1), mandou suspender todos os recursos, parar todos os juízes, estejam onde estiverem, em primeiras ou segundas instâncias, e que venham todos juntar-se a um só processo.

Venham compor o que ele chama de uma macro-lide. Está certo. Só a política da macro-lide pode enfrentar a política do macro-plano. Este exige aquela. Macro-plano econômico que se concretiza ou se paralisa pela micro-lide é fragmentar para desigualar. É anti democracia.

A multitude de micro-processos individualizados, a avalanche de recursos repetitivos, obriga pela racionalidade da justiça, pelo princípio da isonomia, pela eficiência processual, que tudo e todos sejam julgados de uma vez só, e de uma vez por todas.

O ministro Benetti estima que esta sua decisão afetará cerca de 500 mil processos, hoje ainda perambulando pelo Judiciário, a maioria deles levados pelas ágeis mãos de especialistas que querem o seu não julgamento.

Levados pelas mãos dos que conhecem bem a saída do labirinto judicial e dela sempre se afastam sempre quando dela se aproximam. Sísifos processuais. O que vai de tão importante ser julgado? Tudo!
Desde questões processuais como o da prescrição venenaria – isto é,  se questões que se arrastam há mais de 20 anos prescreveram ou não, até a legitimidade processual das partes, dos bancos, sobretudo.

E o mais importante. Pretende-se dar um ponto final na incerteza dos cálculos e correções nômades do Plano Collor I, Plano Collor II, Plano Verão, Plano Bresser.

Pretende-se fixar se os índices a serem aplicados nas poupanças e direitos da população são 84%, 44%, 7 %, 21%, 42% e por aí vamos. Esta sim a grande insegurança jurídica. A insegurança provocada pelos índices.

Ao juntar os processos através da indispensável inovação dos recursos repetitivos, o ministro Beneti manda ouvir todos concomitantemente, e não sequencialmente, pois aí outras dezenas de anos se passariam. Atinge assim vários objetivos de uma só vez.

O primeiro é o humano. Acaba com a agonia, com o futuro incerto, com a esperança desesperada de mais de meio milhão de brasileiros, partes, crentes e clientes da justiça de seu país.

O segundo desafoga o Judiciário, reduz-lhe os custos, aumenta o tempo profissional de milhares de juízes que antes se chocavam e se contradiziam, dizendo ou desdizendo o mesmo, esbarrando-se, desconhecendo-se e brigando nos corredores das instâncias.

Finalmente, o terceiro objetivo, e maior de todos, mostra que o real poder do Poder Judiciário não são as ameaças e as controvérsias discursivas com os demais poderes.

Mas é algo mais simples e mais precioso: a capacidade de decidir e de implementar as suas próprias decisões.

Está na eficácia da lei, mais do que na letra da lei, o grande poder recôndito dos juízes. Mais do que fixar o sentido da lei, o primeiro passo, cumpre, além disto, fazê-la obedecida e obediente à constituição.

Diante da imensa tarefa que se avizinha, e que não se enganem, não será de fácil conquista, no fundo o maior dos testes para o novo instituto dos recursos repetitivos, o ministro Sidnei Beneti ainda encontra tempo para uma reflexão filosófica.

O que teria acontecido com os planos econômicos se a justiça fosse instantânea? Decidisse a tempo e à hora? Editados o plano na segunda, na terça a sentença definitiva sobre a sua constitucionalidade? A resposta é simples. Não haveria planos.

Os planos trazem embutidos em suas políticas a lentidão judicial para se concretizarem. Não vivem sem ela.

Para terem tempo de redistribuir e realocar, penalizar e beneficiar, os desvarios da mão invisível do mercado, palpável em cada bolso.

Qualquer plano precisa de um tempo lacaniano para se fazer acreditar, acreditados, creditados ou debitado.

Autor: Joaquim Falcão
Fonte: www.espacovital.com.br