Gilberto Melo

Construtora consegue retenção de 50% do valor pago por imóvel devolvido

 

A MRV Serviços de Engenharia obteve no Superior Tribunal de Justiça (STJ) o direito à retenção de 50% do valor pago por compradora que desistiu do contrato. A decisão unânime da Quarta Turma do Tribunal reconheceu, nas particularidades do caso, justificativas para a definição desse patamar de retenção.

A ação inicialmente fora movida pela compradora Rosane do Nascimento, objetivando a rescisão do contrato de promessa de compra e venda e o recebimento da totalidade das parcelas pagas em razão de alegada exorbitância dos valores cobrados, advindos de cláusulas consideradas abusivas, pela compradora. Isso a teria levado a desistir da aquisição do imóvel. O pedido da autora fora acolhido em 1o e 2o graus.

Contra decisão do Tribunal de Alçada do Estado de Minas Gerais que determinava retenção de apenas 10% das parcelas pagas, a empresa recorreu ao STJ. O acórdão do tribunal estadual também ordenava a atualização monetária dos valores pagos a partir do desembolso de cada parcela pela compradora.

Sustentou a MRV que a retenção apontada pelo tribunal local seria incompatível com as despesas administrativas decorrentes do imóvel vendido, o que causaria enriquecimento sem causa da compradora inadimplente, ainda mais porque a cliente estaria de posse do imóvel desde 1996. A construtora também não se conformou com a condenação aos juros de mora, porque não estaria ela em atraso, mas sim a compradora. O recurso especial não havia sido admitido na origem, mas subiu ao STJ por força de agravo de instrumento.

O ministro Aldir Passarinho Junior, relator do processo, lembrou precedentes da Segunda Seção do Tribunal, que decidiu, apesar do entendimento particular do ministro, pela possibilidade da restituição dos valores cobrados em razão da impossibilidade de a compradora manter-se adimplente, o que admitiria o pedido inicial da autora.

Os mesmos precedentes definiram como razoável, para o ressarcimento das despesas administrativas – propaganda, corretagem, depreciação imobiliária de imóvel novo para usado, desgaste pelo uso, impostos, recolocação no mercado e outras – a retenção pela construtora do valor de 25% das parcelas pagas pelo comprador.

No caso específico do presente recurso, o relator destacou a particularidade de a compradora ter recebido as chaves e tomado posse do imóvel há vários anos. “Portanto, a se dar a mesma solução dos precedentes, que não trazem tal aspecto, estar-se-ia, realmente, possibilitando um locupletamento indevido em favor da promitente compradora, em detrimento da empresa-ré, cujo inadimplemento não foi reconhecido. Ao inverso, a sentença, claramente, ressalta que ‘a promitente compradora deu causa à rescisão de pleno direito do contrato, em face da inadimplência no pagamento da prestação intermediária’”, considerou o ministro.

Por essa razão e em face de precedentes da Terceira Turma, que decidiu pela autorização legal dada ao julgador para reduzir o percentual estipulado em cláusula penal para patamar justo, a fim de evitar o enriquecimento ilícito de uma das partes contratantes e o prejuízo da outra, o ministro Aldir Passarinho Junior definiu o percentual de retenção em 50% das parcelas pagas, considerando a dificuldade e onerosidade na liquidação por artigos no caso de imóvel de baixa renda.

Para o relator, também tem razão a MRV na questão dos juros moratórios, já que a inadimplência foi da compradora, que, além do mais, detém a posse do imóvel. Por isso, só haverá mora a ser compensada se, eventualmente, ao ser restituído o imóvel à construtora, as parcelas que devem ser devolvidas não o forem simultaneamente, o que deve ser apurado, se for o caso, em liquidação de sentença.

Processo:  REsp 615300

Fonte: Revista Jurídica