Gilberto Melo

Novo CPC: momento oportuno para o direito

O Presidente do Senado, José Sarney, no início desta primavera de 2009, criou uma Comissão de juristas para elaborar anteprojeto de lei destinado à reforma do Código de Processo Civil.

Sua Excelência, entre tantas justificativas para a composição desse importante trabalho legislativo, destacou que o Código de Processo Civil instituído em 1973, pela lei 5.869, no decorrer do tempo, foi alvo de vários enxertos, vale dizer, de leis esparsas, comprometendo a sistematização que deve ser inerente a toda lei codificada.

Destacou que o seu objeto principal é o de dar maior agilidade à Justiça e ampliar a proteção dos direitos fundamentais do cidadão brasileiro. Ele espera que esse diploma legal tenha a capacidade de atender aos anseios gerais por uma Justiça mais ágil e menos complicada, e que os litígios não se estendam indefinidamente em uma vereda tortuosa de recursos e embargos, onde os prejudicados são sempre os mais pobres.

Sarney parafraseou Rui Barbosa para dizer que se planta couve sabendo-se que tem curto ciclo vegetativo, diferente do de carvalho que se estende além de um século. Naquele instante, disse ele, o que estavam sendo plantadas eram sementes de carvalho, a fim de que o novo Código tenha ampla vida útil direcionada ao futuro.

Para a consecução desse empreendimento de relevante cultura jurídica nacional, foi criada a Comissão integrada pelos destacados juristas Luiz Fux, Teresa Wambier, Adroaldo Fabrício, Benedito Pereira Filho, Bruno Dantas, Elpídio Nunes, Humberto Teodoro Júnior, Jansen Almeida, José Miguel Medina, José Roberto Bedaque, Marcus Vinícius Coelho e Paulo Cezar Carneiro, cabendo ao primeiro, Ministro do STJ, a presidência.

Tudo indica e não se pode duvidar da sapiência desses notáveis juristas para a elaboração desse anteprojeto destinado à alteração do Código de Processo Civil, através de lei.

Todavia, remanesce certa preocupação ao se ter notícia de trabalhos destinados à realização de atividade do Poder Judiciário que, quando de sua construção, foram discutidos e votados, fora do Legislativo, apenas por membros exclusivamente da área jurídica.

Nas últimas décadas, em decorrência dos avanços tecnológicos desenvolvidos em universidades e adotados por empresas produtoras de bens e serviços, muitos administradores foram conscientizados a diminuir os maléficos princípios de vaidade pessoal/funcional, e acabaram entendendo que o progresso produtivo estaria dependendo da parceria porque várias matérias científicas de planejamento empresarial são decididamente interdisciplinares.

Desde o descobrimento do Brasil o desenvolvimento da atividade judiciária tem sido impulsionado pelas decisões exclusivamente de magistrados, o que tem motivado a alta taxa de congestionamento, segundo dados estatísticos publicados pelo Conselho Nacional de Justiça.

Esse congestionamento gerado ao longo do tempo, em face da morosidade com que os serviços judiciários são operados, despertou a atenção política para se criar um órgão público que tivesse a finalidade de planejar e adotar medidas administrativas capazes de alterar o curso improdutivo da prestação jurisdicional. Para isso nasceu o Conselho Nacional de Justiça e que, por tradição, acabou sendo constituído de membros, também só versados em direito.

Agora, uma Comissão destinada à apresentação de trabalho que irá se consolidar num novo Código de Processo Civil, se compõe de juristas, na expressão do presidente do Senado, ou seja, por quem é exclusivamente operador do direito, quando se pensa que o processo civil deve se realizar com a adoção de tecnologias advindas de outras ciências e artes.

Tanto o processo quanto o seu respectivo procedimento na fase de planejamento, exigem não apenas profundo conhecimento de sabedoria jurídica, mas também de administração, economia, computação eletrônica e sociologia, principalmente.

O consenso de planejamento por técnicos dessas áreas científicas, em decisões aprovadas por meio de voz e voto, tem sido a tônica exigida para o êxito de qualquer empreendimento destinado a produzir, com êxito, bens e serviços, segundo revelam os anais históricos de grandes corporações, principalmente internacionais.

Luiz Adolfo Olsen da Veiga, no livro de Aires José Rover – Informática no Direito, ao tratar da parceria do Direito com a Informática, ensina:

Se queremos uma Justiça que atenda aos reclamos da cidadania  com rapidez e eficiência, neste milênio, não podemos prescindir dos sistemas inteligentes.

E, para construirmos sistemas inteligentes, verdadeiramente adaptados à ciência jurídica e contribuindo para a efetivação do ideal de Justiça, necessitamos da participação direta do profissional do Direito, em conjunto, sem dúvida, com os profissionais da área de informática, já que a matéria é decididamente interdisciplinar [ROVER, 2001, p. 8].

Planejar antes e executar depois é o grande lema para o êxito empresarial.

O judiciário brasileiro nunca criou um órgão permanente de planejamento, tal como  reclamado pelo Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira em seu sempre lembrado artigo “A reforma processual” [Revista do IMB – in verbis. Rio de Janeiro, a. 01, p. 13, fev./mar.1996].

Com efeito, os membros dessa Comissão estão agora na fase de planejamento de um diploma legal – Código de Processo Civil -, no momento em que a comunidade jurídica nacional aponta veemente o insucesso do processo judicial no decorrer dos tempos, exatamente por ausência de técnicas que pudessem distribuir justiça em menor tempo, com baixo custo operacional e com maior produtividade.

Há quem diga: alguns renomados processualistas, juristas e filósofos do direito, que até agora atuaram como planejadores do processo judicial, seja civil ou penal, tiveram o pensamento voltado unicamente à busca de mecanismos com a capacidade de disponibilizar ao Judiciário os recursos suficientes de aplicação da verdadeira justiça, mas sem a cautela de encontrar e adotar outros instrumentos eficazes ao processo harmônico produtivo.

Numa empresa, de nada adiante os dedicados engenheiros planejarem e industrializarem ótimos produtos, até com alto custo operacional, se ao final não existe mercado consumidor por motivos de ordem econômica, por exemplo.

Existe dado estatístico de que um processo judicial gera custo de aproximadamente quinhentos reais (R$ 500,00). E nesse processamento, é comum se encontrar cobrança de valor irrisório, em torno de cinqüenta reais (R$ 50,00), inclusive ajuizada pelo Poder Público. São aspectos que devem ser previstos e examinados por quem se propõe a planejar processo judicial.

Nesse sentido, a visão do juiz mineiro, Luiz Guilherme Marques, precisa ser difundida e aceita como o bom caminho do nosso futuro processo judicial, quando afirma:

Parece-me que o ponto mais alto que poderíamos alcançar com a estrutura que tínhamos já foi alcançado, e, a partir daí, o volume de processos é superior às nossas forças. Agora, a solução é partirmos para outra etapa, diferente, num outro patamar, como aconteceu com o Direito depois dos Códigos Napoleônicos.

Entendo que ou escolhemos o caminho do “novo” ou ficaremos na posição equivocada de um Savigny, brilhante, eruditíssimo, mas que “perdeu o trem da História”, porque não enxergou o futuro [MARQUES, 2009].

Outro pensador, nessa mesma linha de raciocínio, aborda certo aspecto a merecer reflexão, quando afirma em seu precioso artigo “Processo e Administração da Justiça”:

Quem sabe não se possa incorporar ao estudo do processo a pesquisa de campo, o material estatístico e outras técnicas de investigação científica, aprimorando a percepção da realidade impactada pelas normas jurídicas? Será que o “purismo” que ainda contamina a ciência do direito continuará a impedir a utilização desses métodos? O trabalho do cientista do direito não pode mais ser resumido a exercícios de lógica jurídica. O desafio agora é construir uma Teoria Geral do Processo que não se esgote nas abstrações da lógica e que descubra o quanto pode contribuir se reconhecer a administração da justiça como objeto de estudo.

[ATAÍDE JÚNIOR, 2008].

Todos os autores que enfrentam temas relacionados com administração da justiça são unânimes em afirmar que a morosidade do serviço judiciário decorre principalmente da falta de legislação processual compatível com o assustador aumento (nas últimas décadas) de demandas ou conflitos oriundos de negócios econômicos, fisco, previdência social, meio ambiente, família, infância, juventude e pobreza.

O Código de Processo Civil necessita de reformas urgentes.

A Comissão foi instituída pelo Senado em momento oportuno para que os operadores do direito disponham posteriormente de um grande e adequando mecanismo para processar as demandas judiciais.

Mas os juristas correm o risco de apresentar ao povo brasileiro um trabalho que poderá cair na vala do insucesso, se não sentarem à mesa de discussão com técnicos dispondo do direito de voz voto e que sejam altamente graduados cientificamente nas áreas de administração, economia, informática, contabilidade e sociologia.

Referências:
ATAÍDE JUNIOR, Vicente de Paula. Processo e Administração da Justiça: novos caminhos da ciência processual. Curitiba: IBRAJUS-Instituto Brasileiro de Administração do Sistema Judiciário, 2008. 

BRASIL.Senado Federal. Presidência. Sarney cria comissão para reformar Código de Processo Civil. Teresa Cardoso/Agência Senado. Disponível em:

MARQUES, Luiz Guilherme. Agilização da Justiça cível no Brasil . Jus Navigandi, Teresina, ano 5, n. 48, dez. 2000. Disponível em:

VEIGA, Lujz Adolfo Olsen da. In: ROVER, Aires José. Informática no Direito – Inteligência Artificial – Introdução aos sistemas especialistas legais. Curitiba: Juruá, 2001. p.8.

Autor: Pedro Madalena
Fonte: www.conjur.com.br