Caberá à Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) uniformizar o entendimento da Corte sobre se a instituição bancária está ou não obrigada a arcar com o pagamento antecipado das despesas necessárias para a realização de prova pericial requerida pelo correntista, sempre que ocorrer a chamada inversão do ônus da prova. O ministro Barros Monteiro, reconhecendo caracterizada, em princípio, a discordância alegada pelo correntista entre os entendimentos manifestados nos acórdãos e nas decisões das Terceira e da Quarta Turmas, que juntas formam a Segunda Seção, admitiu os embargos de divergência interpostos pelo correntista José Eduardo Bank, do Rio de Janeiro, contra o BankBoston Banco Múltiplo S/A.
O ministro abriu vista ao Banco embargado para que se manifeste sobre a discrepância de entendimentos que o investidor alega estar existindo entre as decisões da duas Turmas do Tribunal que apreciam as causas envolvendo Direito Privado, sobre a questão de saber se o banco está obrigado ou não a adiantar o pagamento de provas requeridas pelo consumidor.
Entre as causas de competência da Segunda Seção estão os feitos que tratem de responsabilidade civil, domínio, posse e direitos reais sobre coisa alheia, direito de família e sucessões, direito do trabalho, quando o caso não for da competência específica da justiça especializada. A Segunda Seção também decide as causas que examinem questões sobre propriedade industrial, constituição, dissolução e liquidação de sociedades, comércio em geral, bolsas de valores, instituições financeiras e mercado de capitais, falências e concordatas, títulos de crédito, registros públicos, bem como os conflitos de competência referentes a essas matérias. É dela a competência para, por meio do julgamento de embargos de divergência, uniformizar entendimentos conflitantes que envolvam as duas Turmas que a compõem.
Além do presidente do colegiado, ministro Carlos Alberto Menezes Direito, participam da Segunda Seção a ministra Nancy Andrighi, presidente, e os ministros Antônio de Pádua Ribeiro, Humberto Gomes de Barros e Castro Filho, da Terceira Turma, e os ministros Fernando Gonçalves, presidente, Barros Monteiro, Cesar Asfor Rocha, Aldir Passarinho Junior e Jorge Scartezzini, da Quarta Turma.
A inversão da prova e o pagamento para sua produção
O advogado do correntista, Renato Nordi, argumenta que o acórdão da Terceira Turma, relatado pela ministra Nancy Andrighi, ao determinar que a inversão do ônus da prova não obriga a parte contrária a arcar com as custas da prova requerida pelo consumidor está em franco desacordo com a posição que vem prevalecendo na Quarta Turma. Junta, nesse sentido, várias decisões monocráticas dos ministros que a compõem, bem como acórdãos do ministro Ruy Rosado de Aguiar e do atual vice-presidente do STJ, ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, ex-integrantes da Quarta Turma, no sentido de que a inversão do ônus da prova obriga o réu a antecipar as despesas da perícia tida como imprescindível ao julgamento da causa.
O acórdão unânime da Terceira Turma, que contou, além do voto da ministra relatora, Nancy Andrighi, com os dos ministros Castro Filho e Carlos Alberto Menezes Direito, assegura o direito de a instituição financeira não pagar as despesas da prova pericial requerida contra ela pelo consumidor, embora sujeite o banco, na condição de fornecedor do serviço, às conseqüências processuais da não-realização da prova solicitada. Não participaram desse julgamento os ministros Antônio de Pádua Ribeiro e Humberto Gomes de Barros.
O que a Segunda Seção deverá decidir é a interpretação referente ao artigo 6º e seus incisos do Código de Defesa do Consumidor. Esses dispositivos do CDC garantem o direito à chamada inversão do ônus da prova, isto é, muda, em sentido contrário, princípio básico de direito segundo o qual quem entra com o processo é que está obrigado a provar aquilo que alega. No caso do Código de Defesa do Consumidor, como este é sempre a parte mais frágil na relação de consumo, a lei procurou assegurar-lhe um tratamento mais equânime e justo, determinando que seja o fornecedor do serviço ou do bem de consumo o que está obrigado a fazer prova em contrário àquilo que o consumidor alega como direito seu.
Trata-se de dispositivo legal que procura facilitar a defesa dos direitos da parte mais fraca, chamada hipossuficiente, estabelecendo a faculdade ao juiz de inverter a obrigação de provar o alegado contra o fornecedor do serviço ou do bem, desde que pareça verdadeira e plausível a alegação feita pelo consumidor. O que a Segunda Seção vai definir é se, quando o juiz entender provável o que é alegado pelo consumidor e deferir a inversão do direito de produzir a prova, a instituição, ou seja, o banco ou a financeira, deve antecipar o pagamento da produção da perícia requerida. A posição que for firmada pela Seção sobre o assunto será aplicada pelos ministros da Terceira e da Quarta Turma nos julgamentos futuros envolvendo a mesma matéria.
Fonte: www.stj.gov.br