Não deve ser dada uma nova chance ao proprietário de imóvel improdutivo para torná-lo produtivo e modificar a conclusão estatal, sob pena de se subverter a ordem jurídica e de confrontar seriamente os princípios da efetividade e da segurança jurídica.
Resumo
A desapropriação-sanção implica um microssistema normativo da reforma-agrária, cujos dispositivos não podem ser interpretados meramente a partir de parâmetros da processualística ordinária, visto que imbute valores e princípios sensíveis, consagrados expressamente na Constituição de 1988 e que devem nortear a atuação do Administrador Público, na consecução de políticas públicas, e do Judiciário, ao apreciar, processar e julgar as causas rurais, como a ora abordada. Nesse sentido, a hermenêutica constitucional e legal caminha para a predominância das políticas públicas estatais e do respectivo microssistema, do qual deriva a conclusão de que a produtividade do imóvel a ser considerada é aquela verificada pelo servidor público da Autarquia Federal INCRA, quando da elaboração subsequente do Laudo de Avaliação e Vistoria, seja pelo Administrador, para a edição do decreto expropriatório, seja pelo Judiciário ,para a sentença a ser proferida em ação anulatória, declaratória ou a própria expropriatória.
Introdução
O estudo em comento pretende expor, inicialmente, as modalidades expropriatórias tratadas pelo ordenamento brasileiro e, após, analisar o instituto da desapropriação-sanção para fins de reforma-agrária, com suas fases, rito sumário da ação judicial pertinente, imissão provisória na posse e a modalidade de indenização específica para esse instituto.
Por sua vez, o objeto central desse artigo se destina a abordar a própria produtividade do imóvel rural classificado como improdutivo pelo ente público e, assim, passível de ser expropriado e destinado à implementação de políticas públicas de reforma-agrária.
Conforme abaixo se verá, o procedimento expropriatório possui duas fases, a declaratória, necessariamente administrativa, na qual o imóvel é vistoriado e o ente estatal produz o respectivo Laudo de Vistoria e Avaliação, e a fase executória, judicial ou administrativa, quando o bem passará efetivamente ao domínio público, com a indenização do expropriado.
Ocorre que, não obstante a vedação legal para a ação de desapropriação tratar especificamente sobre a produtividade do bem, é comum que o proprietário ajuíze outra demanda, de cunhos anulatório ou declaratório, quanto ao aludido decreto expropriatório ou o próprio processo administrativo. Nessa situação, caso a discussão acerca da produtividade ou não do imóvel rural seja submetida ao crivo judicial, normalmente se fará necessária a instrução probatória do feito, da qual decorrerá a elaboração de um Laudo Pericial.
A questão tormentosa que há nessa contenda diz respeito ao período que deve ser considerado pelo julgador. Explique-se melhor. Enquanto o ente expropriante insiste que se deve levar em consideração tão-somente o intervalo em que houve a apuração, vistoria e consequente elaboração do Laudo de Vistoria, em processo administrativo expropriatório, o expropriado defende que à perícia judicial incumbe apreciar os atuais elementos, produções e índices do bem.
Todavia, não é incomum que haja uma discrepância entre tais intervalos, mormente se atentarmos para o fato de que muitas vezes o procedimento expropriatório é longo, complexo e depende inevitavelmente de recursos públicos e de pessoal para sua conclusão e que, portanto, entre tantos incidentes, o proprietário pode ter conferido efetiva produtividade ao bem, ainda mais em tempos recentes de verdadeira valorização fundiária no Brasil.
Feita essa breve introdução, cumpre sintetizar que o objeto do estudo que ora se inicia é expor os fundamentos pelos quais se faz necessária a contemporaneidade entre tais perícias, administrativa e judicial, corroborada pelas orientações hodiernas da doutrina e da produção jurisprudencial.
1. Análise geral dos tipos de desapropriação previstos no ordenamento jurídico brasileiro:
A desapropriação está prevista na Constituição da República Federativa do Brasil de de 1988 (CF) em seu artigo 5º, inciso XXIV, que assim preconiza “a lei estabelecerá o procedimento para desapropriação por necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, mediante justa e prévia indenização em dinheiro, ressalvados os casos previstos nesta Constituição.”
A desapropriação está prevista na Constituição da República Federativa do Brasil de de 1988 (CF) em seu artigo 5º, inciso XXIV, que assim preconiza “a lei estabelecerá o procedimento para desapropriação por necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, mediante justa e prévia indenização em dinheiro, ressalvados os casos previstos nesta Constituição.”
De forma geral, pode-se descrever a desapropriação como um procedimento de direito público, administrativo ou judicial previsto em lei, através do qual o Poder Público, ou seus delegados, transfere para si, mediante prévia declaração de necessidade pública ou utilidade pública, ou de interesse social, de forma unilateral e compulsória, a propriedade de terceiro, normalmente por meio de indenização prévia, justa e em dinheiro.
Sobre o caráter “prévio” da indenização, significa que deve ser ultimada antes da consumação da transferência do bem. Por sua vez, “justa” será a indenização que “corresponde real e efetivamente ao valor do bem expropriado, ou seja, aquela cuja importância deixe o expropriado absolutamente indene, sem prejuízo algum em seu patrimônio. Indenização justa é a que se consubstancia em importância que habilita o proprietário a adquirir outro bem perfeitamente equivalente e o exime de qualquer detrimento[1].”
Nesse prisma, a regra é a desapropriação ordinária, ou seja, aquela que imprescinde de demonstração da utilidade pública, necessidade pública ou do interesse social e, mais, a indenização deve ser justa, prévia e dinheiro.
Ao lado da desapropriação ordinária, há outras formas de expropriação, denominadas pelo Constituinte Originário como desapropriação extraordinária ou desapropriação-sanção e a desapropriação-confisco. Ocorrem quando se dá o inadequado aproveitamento do solo urbano, a improdutividade do imóvel rural ou a prática de crime (confiscatória) e estão previstas, respectivamente, nos artigos 182, parágrafos 3º e 4º, inciso III, 184 e 243, todos da Carta Magna, respectivamente, que têm a seguinte dicção:
Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem- estar de seus habitantes.
(…)
§ 3o – As desapropriações de imóveis urbanos serão feitas com prévia e justa indenização em dinheiro.
§ 4o – É facultado ao Poder Público municipal, mediante lei específica para área incluída no plano diretor, exigir, nos termos da lei federal, do proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, que promova seu adequado aproveitamento, sob pena, sucessivamente, de:
I – parcelamento ou edificação compulsórios;
II – imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo;
III – desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública de emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurados o valor real da indenização e os juros legais.
(…)
Art. 184. Compete à União desapropriar por interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social, mediante prévia e justa indenização em títulos da dívida agrária, com cláusula de preservação do valor real, resgatáveis no prazo de até vinte anos, a partir do segundo ano de sua emissão, e cuja utilização será definida em lei.
§ 1o – As benfeitorias úteis e necessárias serão indenizadas em dinheiro.
§ 2o – O decreto que declarar o imóvel como de interesse social, para fins de reforma agrária, autoriza a União a propor a ação de desapropriação.
§ 3o – Cabe à lei complementar estabelecer procedimento contraditório especial, de rito sumário, para o processo judicial de desapropriação.
(…)
Art. 243. As propriedades rurais e urbanas de qualquer região do País onde forem localizadas culturas ilegais de plantas psicotrópicas ou a exploração de trabalho escravo na forma da lei serão expropriadas e destinadas à reforma agrária e a programas de habitação popular, sem qualquer indenização ao proprietário e sem prejuízo de outras sanções previstas em lei, observado, no que couber, o disposto no art. 5º. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 81, de 2014)
Parágrafo único. Todo e qualquer bem de valor econômico apreendido em decorrência do tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e da exploração de trabalho escravo será confiscado e reverterá a fundo especial com destinação específica, na forma da lei. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 81, de 2014).
Ao regulamentar a regra do artigo 5º, inciso XXIV, do texto de 1988, que advêm desde a Constituição Imperial de 1824, o Decreto-Lei n.º 3.365, de 21 de junho de 1941, também considerada “Lei Geral da Desapropriação”, dispõe sobre os casos de desapropriação por utilidade pública.
Já a Lei n.º 4.132, de 10 de setembro de 1962, define os casos de desapropriação por interesse social.
Sobre a desapropriação urbanística estabelecida no artigo 182, parágrafo 4º, inciso III, da CF, está regulamentada pela Lei n.º 10.257, de 10 de julho de 2001, denominada de “Estatuto da Cidade”.
Ainda, mencione-se que o procedimento adotado para a expropriação confiscatória (artigo 243 da CF), recentemente alterado no texto constitucional, encontra-se disciplinado pelas Leis n.ºs 8.257, de 26 de novembro de 1991, e 10.279, de 12 de setembro de 2001, e pela Medida Provisória n.º 2.183-56, de 24 de agosto de 2001.
Por fim, acerca da desapropriação rural, com previsão nos artigos 184 e 191 da CF, o respectivo procedimento está tratado na Lei n.º 8.629, de 25 de fevereiro de 1993, com as alterações posteriores, e na Lei Complementar n.º 76, de 06 de julho de 1993, alterada pela Lei Complementar n.º 88, de 21 de dezembro de 1996.
Vejamos as peculiaridades da desapropriação para fins de reforma-agrária.
2. Os pressupostos e requisitos da desapropriação para fins de reforma-agrária:
Particularmente no tocante à desapropriação para reforma-agrária, tem como objeto o imóvel rural que desatende à sua função social, conforme estatuído nos artigos 5º, inciso XXIII, e 186 da Constituição, cujas redações são as seguintes:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
(…)
XXIII – a propriedade atenderá a sua função social
(…)
Art. 186. A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos:
I – aproveitamento racional e adequado;
II – utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente;
III – observância das disposições que regulam as relações de trabalho;
IV – exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.
No entanto, a regra é geral e comporta exceções, eis que o artigo 185 da Carta Magna veda a incidência desse tipo expropriatório em algumas hipóteses, como sobre a pequena e média propriedade rural, assim definida em lei, desde que seu proprietário não possua outro bem, e, logicamente, sobre a propriedade produtiva. Este é o inteiro teor do dispositivo:
Art. 185. São insuscetíveis de desapropriação para fins de reforma agrária:
I – a pequena e média propriedade rural, assim definida em lei, desde que seu proprietário não possua outra;
II – a propriedade produtiva.
Parágrafo único. A lei garantirá tratamento especial à propriedade produtiva e fixará normas para o cumprimento dos requisitos relativos a sua função social.
A ação de desapropriação para fins de reforma-agrária tem rito sumário próprio, conforme determinado pelo artigo 184, parágrafo 3º, da Carta Magna, estabelecido pela Lei Complementar n.º 76/1993.
Além de lei especial reger esta ação de desapropriação, a Lei Complementar detém status superior às demais leis ordinárias. Por isso, o Código de Processo Civil (CPC) tem aplicação subsidiária e apenas no que for compatível com a referida Lei Complementar, nos termos do seu artigo 42[2]. Esse, aliás, é o teor do recente Informativo de Jurisprudência do Colendo Superior Tribunal de Justiça (STJ), de n.º 547, de 08 de outubro de 2014, conforme se nota do seguinte julgado:
DIREITO ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. DISPENSA DE CITAÇÃO DO CÔNJUGE NA DESAPROPRIAÇÃO POR UTILIDADE PÚBLICA.
Na ação de desapropriação por utilidade pública, a citação do proprietário do imóvel desapropriado dispensa a do respectivo cônjuge. Isso porque o art. 16 do Decreto-Lei 3.365/1941 (Lei das Desapropriações) dispõe que a “citação far-se-á por mandado na pessoa do proprietário dos bens; a do marido dispensa a da mulher”. Ressalte-se que, apesar de o art. 10, § 1º, I, do CPC dispor que “ambos os cônjuges serão necessariamente citados para as ações que versem sobre direitos reais imobiliários”, o art. 42 do referido Decreto-Lei preconiza que o CPC somente incidirá no que for omissa a Lei das Desapropriações. Assim, havendo previsão expressa quanto à matéria, não se aplica a norma geral. Precedente citado do STF: RE 86.933, Segunda Turma, DJ 18/6/1979. REsp 1.404.085-CE, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 5/8/2014. (sem destaques em amarelo no original)
A ação de desapropriação para fins de reforma-agrária tem caráter preferencial em relação a quaisquer outras relativas ao mesmo imóvel rural, com respaldo no artigo 18 da Lei Complementar n.º 76/1993. Em outras palavras, esta demanda possui ritmo absolutamente célere, diante da presunção constitucional e legal de urgência (STJ, REsp 1.206.629/ES).
Como se pode perceber, ao lado das normas gerais da legislação processual civil, de aplicação subsidiária a maiores das normas de caráter especial, tem-se um microssistema normativo da reforma-agrária, cujos dispositivos não podem ser interpretados meramente a partir de parâmetros da processualística ordinária. De fato, a ação expropriatória imbute valores e princípios muito além do simples procedimento do CPC, de uma sequência objetiva e linear de atos processuais. Isso porque os fundamentos dessa medida estão consagrados expressamente na Constituição de 1988 e devem nortear a atuação do Administrador Público, na consecução de políticas públicas, e do Judiciário, ao apreciar, processar e julgar as causas rurais, como a ora abordada.
A respeito, mister recordar que as peculiaridades da ação de desapropriação, como a adoção do rito sumário, o instituto da imissão prévia na posse, o caráter preferencial e prejudicial da ação em questão, são evidências de que o ordenamento jurídico fez uma ponderação de interesses em favor da destinação imediata de imóveis rurais descumpridores da função social, para a reforma-agrária, em prejuízo daqueles especulativos, destinados ao acúmulo desordenado e desigual de riquezas.
Já se viu ser regra que a indenização seja paga em dinheiro. Entretanto, há exceção na desapropriação para fins de reforma-agrária, disciplinada através da Lei Complementar n.º 76/1993 (artigo 184 da Constituição Federal). Isso porque o maior valor devido ao expropriado, como a terra nua, deverá ser indenizado por meio de Títulos da Dívida Agrária (TDA), com cláusula de preservação do valor real, e as benfeitorias úteis e necessárias serão pagas em dinheiro.
O procedimento em questão fica sob a responsabilidade do INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA – INCRA, Autarquia Federal, vinculada ao Ministério do Desenvolvimento Agrário, criado pelo Decreto-Lei n.º 1.110, de 09 de julho de 1970, cuja representação judicial e extrajudicial incumbe à Procuradoria-Geral Federal (PGF), integrante do Ministério da Advocacia Geral da UNIÃO (AGU).
Esse procedimento expropriatório segue duas fases, sendo a primeira administrativa, de cunho declaratório, na qual o bem é declarado passível de desapropriação, no âmbito do ente expropriante, e a segunda consiste na fase executória, que pode se dar em meio judicial ou ainda administrativo.
Nesse contexto, encerrada a primeira fase, a fase declaratória, quando se tem como confirmada a intenção de desapropriar o bem, o Poder Público passa a adotar providências para efetivar a desapropriação, com o fim de transferir efetivamente o bem do patrimônio privado para o seu patrimônio público.
De outro lado, a fase executória pode ser resolvida brevemente e mediante acordo celebrado entre o Poder Público e o expropriado, de maneira que todo o procedimento se desenvolverá na seara administrativa. Nada obstante, em não havendo ajuste de vontades, seguir-se-á a fase judicial ou litigiosa, iniciada pelo próprio Poder Público, que deverá obedecer ao procedimento prelecionado no Decreto-Lei n.º 3.365/1941, também aplicado à desapropriação por interesse social fundada na Lei n.º 4.132/1962, em razão do disposto em seu artigo 5?.
Cabe registrar que a discussão na via judicial é restrita, posto que “Ao Poder Judiciário é vedado, no processo de desapropriação, decidir se se verificam ou não os casos de utilidade pública” (artigo 9º do Decreto-Lei n.º 3.365/1941).
Nesse sentido, sucintamente tem-se que, declarado o bem improdutivo, o Poder Público poderá concluir a transferência para o patrimônio público, mediante mera transação com o particular envolvido, com os pagamentos devidos em TDA´S e dinheiro. Ou, sem solução amigável extrajudicial, inicia-se uma nova fase do procedimento, agora litigiosa, na qual o Poder expropriante buscará o reconhecimento por sentença da aquisição originária do bem, por meio da desapropriação, com as anotações subsequentes.
Note-se, por oportuno, que na fase executória, mesmo na via judicial, é possível que, desde logo, as partes encerrem a lide por acordo a ser homologado em juízo. Todavia, caso isso não ocorra, seguir-se-á um procedimento judicial, com contraditório, ampla defesa, instrução do feito, enfim uma sequência de atos longa, que demanda excessiva cautela e muita atenção das partes envolvidas e do magistrado, face aos valores e interesses envolvidos, no qual merece destaque certamente os vetores da produtividade e da função social da propriedade, da equidade e da valorização das pequenas e médias propriedades produtivas, voltadas ao bem geral da Nação, em detrimento de latifúndios improdutivos e meramente especulativos.
A questão a ser abordada envolve uma controvérsia muito comum em procedimentos desse porte, principalmente quando o expropriado, antes ou ao lado dessa ação de desapropriação intentada pelo INCRA, ajuíza outra, de natureza anulatória ou declaratória, na qual discute a própria produtividade do bem ou algum vício no processo expropriatório.
Havendo em cenário, haverá provavelmente a designação de perícia judicial e a crucial divergência que se dará consiste no elemento temporal, critérios, índices, tipos de produções e cenários a serem considerados pelo avaliador designado pelo magistrado.
Explique-se melhor.
Em geral, o processo administrativo de desapropriação é muito extenso, notadamente em sua fase declaratória, na qual os servidores do ente expropriante procedem a extenso estudo sobre o local investigado, o bem, se produtivo ou não, os recursos naturais próximos, o relevo da região, a viabilidade fática, econômica e logística de se instalar um programa de assentamento para fins de reforma-agrária. Enfim, o processo merece muita cautela e precisão, em virtude do elevado número de pessoas envolvidas, direta e indiretamente, e da expectativa que gera aos eventuais expropriados e beneficiados com uma futura instalação do aludido programa. Além disso, é salutar destacar que as atividades do Executivo contam com limitações orçamentárias e reduzido número de pessoal, muitas vezes insuficiente para tal mister tão importante, além de ser comum nos dias atuais o contingenciamento de recursos públicos, o que eleva a necessidade de a decisão do administrador público ser prudente e adequada ao exercer a discricionariedade administrativa e atender à lei. Afinal, é notório que as necessidades são muitas, as políticas públicas são de extrema relevância, mas os recursos são escassos e finitos.
Cabe frisar que a vistoria do INCRA apura as condições de uso do imóvel rural em um período de tempo determinado, correspondente aos 12 (doze) meses inteiros imediatamente anteriores ao do recebimento da comunicação de vistoria preliminar pelo proprietário rural. Ainda, é imperioso registrar a premissa “de que os laudos agronômicos elaborados pelo INCRA são dotados de rigor científico e se traduzem no exercício regular de uma atividade estatal prevista pelo sistema legislativo[3].”
Desse minucioso estudo do INCRA, na primeira fase do procedimento expropriatório, resulta a produção de um Laudo de Vistoria e Avaliação (LVA), relativo ao imóvel rural classificado como socialmente desfuncionalizado.
Ocorre que, não raro, entre a feitura desse Laudo, a cargo dos servidores do INCRA, e o ajuizamento da respectiva ação expropriatória ou a propositura da ação anulatória ou declaratória supracitada decorre tempo considerável, mais ainda até a designação do perito judicial e a produção do trabalho do expert. Não se olvide que nos tempos recentes houve uma considerável valorização fundiária, com destaque para o interior do Estado de São Paulo, do que resultou grande especulação imobiliária e uma elevação extraordinária dos preços dos alqueires e subsequentes negociações. Ainda, diante da oscilação interna e externa da economia e das produções mais rentáveis, não raro há mudanças constantes de tipos de produção, seja na pecuária, seja na agricultura, como se pode exemplificar com o crescimento da indústria canavieira no interior paulista.
Logo, pode ocorrer que o cenário que o perito do juízo encontre hoje não corresponda mais àquele verificado e constatado pelos servidores da Autarquia Federal na fase inicial, administrativa.
A divergência, então, dá-se sobre qual critério deve ser aceito e considerado, isto é, os índices apresentados pelos servidores do INCRA no precitado Laudo de Vistoria e Avaliação ou aqueles mencionados pelo profissional auxiliar do juízo em seu Laudo Judicial.
Feita essa apresentação teórica, serão na sequência expostos os fundamentos teóricos e o posicionamento dos dias atuais da doutrina e da orientação pretoriana a respeito de tema tão instigante, face os reflexos sociais e financeiros que dele advém.
3. Os índices GUT e GEE – contemporaneidade das perícias judicial e do INCRA na fase declaratória
A classificação de um imóvel rural depende da obtenção simultânea de índices referentes ao Grau de Eficiência na Exploração (GEE) e ao Grau de Utilização da Terra (GUT), assim como do cumprimento da legislação ambiental, entre outras exigências legais.
Para o GEE, a lei estabelece um grau mínimo de 100% (cem porcento) de eficiência e para o GUT, o índice mínimo é de 80% (oitenta por cento) de utilização.
Isto posto, se do levantamento procedido pela Autarquia Agrária se apura que a utilização da terra, o GUT, ficou abaixo do índice mínimo de 80% (oitenta por cento), portanto, inferior ao permissivo legal para que o imóvel rural seja classificado como produtivo, não atingindo a simultaneidade preconizada em lei, consequentemente a área é IMPRODUTIVA e NÃO cumpridora de sua função social, nos termos do artigo 9º, inciso I, parágrafo 1º, da referida lei federal agrária com o artigo 186 da CF, pois o critério normativo é objetivo (mínimo de 80% (oitenta por cento) para o GUT e mínimo de 100% (cem por cento) para o GEE).
Logo, o perito judicial deve elaborar o laudo considerando os cálculos de GUT e GEE no mesmo período de referência da fiscalização pelo órgão federal executor da reforma-agrária.
Isso porque é imprescindível que haja CONTEMPORANEIDADE ENTRE AS PERÍCIAS, em ações declaratórias de produtividade, de forma que a perícia judicial deve se reportar à mesma época da vistoria de classificação fundiária feita pelo INCRA que concluiu pela improdutividade.
Os fundamentos legais para tanto estão expressos no próprio texto da Carta de 1988, como se pode verificar do supratranscrito artigo 184, e no artigo 2º, caput, parágrafos primeiro e segundo, da Lei n.º 8.629/1993. Este artigo reza assim:
Art. 2º A propriedade rural que não cumprir a função social prevista no art. 9º é passível de desapropriação, nos termos desta lei, respeitados os dispositivos constitucionais. (Regulamento)
§ 1º Compete à União desapropriar por interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social.
§ 2º Para fins deste artigo, fica a União, através do órgão federal competente, autorizada a ingressar no imóvel de propriedade particular, para levantamento de dados e informações, com prévia notificação.
§ 2º Para os fins deste artigo, fica a União, através do órgão federal competente, autorizada a ingressar no imóvel de propriedade particular para levantamento de dados e informações, mediante prévia comunicação escrita ao proprietário, preposto ou seu representante. (Redação dada pela Medida Provisória nº 2.183-56, de 2001)
Essa ilação decorre do fato de, caso não considerado o período da fiscalização estatal e apenas o momento posterior, atual, estar-se-á inviabilizando por completo o comando constitucional da desapropriação de imóvel descumpridores da função social, consagrada no inciso XXIII do artigo 5º da CF. De fato, tanto a Carta Magna quanto a Lei n.º 8.629/1993 detêm preceitos claríssimos no sentido de que o descumprimento da função social, uma vez verificado pelo órgão federal executor da reforma-agrária, é sancionado com a desapropriação do imóvel para fins de reforma.
E, mais, assim como bem ressalta o i. Procurador Federal Bruno Rodrigues Arruda e Silva[4], o próprio Texto Constitucional já considerou que a condição de produtividade tem natureza transitória, na medida em que utiliza, no artigo 184, a expressão “o imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social”, e essa dicção foi repetida no artigo 2º, parágrafo primeiro, da Lei n.º 8.629/1993. Dessa forma, entende o jurista que, com o uso do verbo no gerúndio, a Constituição prevê que o imóvel que, naquele momento da vistoria pela Autarquia, restar constatado descumprir sua função social, já será passível de desapropriação.
Ora, a Carta de 1988 não permitiu ao proprietário modificar as condições de uso para que posteriormente viesse a cumprir a função social. Pelo contrário. O rigor da Constituição Maior é manifesto, pois a sanção é inevitável para o proprietário que deixar de atender à função social do imóvel. De fato, a penalidade para tanto já foi estipulada e não é permitida a conferência de prazo extra para que o proprietário torne seu imóvel produtivo ou que se celebre eventual Termo de Ajuste de Conduta (TAC), para tentar se esquivar da pena máxima.
Em sendo assim, a consequência da improdutividade apurada pelo INCRA em um dado momento é apenas uma: a desapropriação-sanção para conferir-lhe destinação social por meio da reforma agrária, como ferramenta célere no combate à desfuncionalização social da propriedade rural. Essa foi a opção adotada pelo Constituinte e pelo Legislador[5].
Nesse diapasão, quando o expropriado propõe uma ação anulatória do decreto expropriatório ou do processo administrativo ou mesmo declaratória de produtividade do imóvel objeto da pretensão pública, o que se está a discutir em juízo é um ato administrativo que classificou o imóvel como improdutivo e, portanto, incumbe ao autor, o real interessado, buscar apontar equívoco causador de nulidade do laudo do INCRA. Essa, aliás, é a regra instituída pelo artigo 333, inciso I, do CPC, muito claro ao estabelecer que o ônus da prova quanto ao fato constitutivo do direito é do autor. Para tanto, mostra-se necessária a instrução da causa, mediante prova pericial, que se reporte à mesma época em que o imóvel foi vistoriado previamente pela Autarquia, posto ser este o ato administrativo atacado.
Com efeito, sobre o ponto nevrálgico ora explicitado, o i. Procurador Bruno Rodrigues Arruda e Silva defende que, para a anulação de um processo de desapropriação, é necessário demonstrar a existência de vício no laudo administrativo que apurou a improdutividade do imóvel em certa ocasião, devidamente demonstrada seja em sede judicial seja na seara administrativa, pois as modificações supervenientes nas condições de uso do imóvel, após a vistoria do INCRA, não invalidam as conclusões do processo de desapropriação. Nesse contexto, citem-se os seguintes excertos do artigo do jurista:
4. Problemática relacionada à prova nas ações de declaratórias de produtividade
Ante as premissas expostas e tendo em vista que as ações mencionadas visam declarar a produtividade do imóvel para anular o decreto presidencial e a própria desapropriação, quais fatos deverão ser provados para que possam servir para inquinar os atos expropriatórios? Basta ao proprietário provar as condições de produtividade no estado atual, isto é, no momento que o perito escolhido pelo Juízo se dirigir a campo e avaliar as condições de uso do imóvel? Ou seria necessário que o proprietário, autor da ação anulatória, lograsse provar que, na época da vistoria administrativa, o imóvel era produtivo, e não improdutivo? Eis a questão a ser respondida. Esse questionamento é o ponto nevrálgico a ser enfrentado, já que na grande maioria dos casos a perícia judicial é realizada muitos anos após a vistoria administrativa que ensejou a decretação do interesse social sobre o imóvel. É evidente que, em períodos tão longos, o proprietário já teria condições de alterar a realidade do bem de raiz, passando a torná-lo produtivo, especialmente mediante culturas de curta duração, como a cana-de-açúcar.
Sustentamos neste estudo que o expropriado que questiona a validade de uma desapropriação possui o ônus de demonstrar a existência de vício no laudo administrativo, o que só pode ser atendido mediante a comprovação de que suas conclusões estariam equivocadas e que, na verdade, na época da avaliação administrativa, o imóvel seria produtivo.
4.1. Do caráter transitório da função social: prova a ser exigida do proprietário rural nas ações declaratórias de produtividade
A premissa fundamental da nossa argumentação passa pela consideração de que a condição de produtividade tem caráter transitório.[8] De fato, é possível que um imóvel apresente-se como produtivo hoje, mas não amanhã. É possível ainda que volte a ser considerado produtivo posteriormente. Para que uma desapropriação seja anulada, no entanto, é necessário demonstrar a existência de vício no laudo administrativo que apurou a improdutividade do imóvel em um dado momento, vez que as modificações supervenientes nas condições de uso do imóvel, após a vistoria do INCRA, não invalidam as conclusões do processo de desapropriação.
“Destarte, esse raciocínio deve ser sopesado com uma premissa anterior, segundo a qual a de ação que questiona uma desapropriação mediante a declaração de produtividade do bem de raiz é, antes de tudo, uma ação anulatória de ato administrativo que serve de pressuposto para o Decreto expropriatório. (sem grifos no original)”
Em continuidade, o i. Procurador, que já ocupou a função de Ex-Coordenador Geral Agrário da Procuradoria Federal Especializada junto ao INCRA, também defende a imprescindibilidade de serem contemporâneos os períodos considerados no trabalho da Autarquia e, posteriormente, pelo auxiliar do d. Juízo, consoante se nota dos fundamentos reproduzidos na sequência:
“Este é o fundamento para afirmar que a perícia judicial deve guardar uma necessária relação de contemporaneidade com o laudo administrativo do INCRA que classificou o imóvel como descumpridor de sua função social, já que a vistoria administrativa é o ato efetivamente impugnado. As referidas ações não visam apenas declarar o “fato” produtividade, mas pretendem, isto sim, afirmar a consequência jurídica desse “fato”, qual seja, a nulidade da desapropriação que lhe é vinculada. A produtividade é apenas o fundamento do pedido, o meio vislumbrado pelo expropriado para impedir a sanção do Poder Público.
Dessa forma, se o objeto do questionamento em juízo é um ato administrativo que classificou o imóvel como improdutivo, o autor da ação anulatória deve buscar apontar equívoco causador de nulidade do laudo do INCRA. A única forma de atingir esse objetivo é por meio de prova, realizada em juízo, que se reporte à mesma época em que o imóvel foi vistoriado pela Autarquia. Não basta apenas provar a produtividade em momento diverso daquele analisado pelo Poder Público. A questão é demonstrar se o imóvel era ou não produtivo no mesmo período de tempo que foi objeto de avaliação pelo laudo de vistoria prévia do INCRA, já que este sim é o ato administrativo atacado.
O que ocorre hoje, contudo, é que muitos magistrados da Justiça Federal não tem atentado para o espírito da Constituição e da legislação e, por um intuitivo senso de justiça relacionado somente ao direito de propriedade, deixam de aplicar institutos processuais em favor da manutenção de proprietários rurais negligentes que só se movimentaram para alterar a realidade econômica de seus imóveis rurais após a fiscalização do INCRA.
Assim, é com muita frequência que se observam sentenças e acórdãos que anulam desapropriações baseadas em perícias judiciais que declararam imóveis rurais como produtivos baseadas em informações colhidas muitos anos após o laudo de vistoria do INCRA. São proprietários que lograram suspender desapropriações e imissões de posse para ganhar tempo e maquiar a realidade do imóvel, transformando-o em produtivo para receber o perito oficial que, então, classifica o bem de raiz como produtivo com esteio na realidade na realidade atual.
O proprietário utiliza o Poder Judiciário como via transversa para negociar uma “moratória” na qual se paralisa a desapropriação a fim de alterar as condições econômicas de uso do imóvel de forma que o perito judicial considere essa nova realidade e declare o imóvel como produtivo. Entendemos que esse artifício não pode ser acolhido pelo Poder Judiciário, já que, no fundo, são uma forma fraudulenta de anular desapropriações que não apresentam qualquer vício. A apuração de produtividade sem relação de contemporaneidade com a vistoria administrativa apenas comprova que, após determinado período de tempo desde a fiscalização do INCRA, o imóvel apresentava a condição de produtivo, mas não se demonstrou que o ato atacado (a vistoria do INCRA) estaria viciada.
(…)
Tudo isso significa dizer que o momento que deve ser considerado para aferir se um imóvel rural é passível ou não de desapropriação para fins de reforma agrária, é justamente o período que foi objeto da fiscalização estatal. Dessa forma, para que um proprietário se insurja contra um decreto expropriatório, não basta demonstrar que o imóvel é produtivo na atualidade, mas sim que ele era produtivo na época em que ocorreu a vistoria administrativa que o classificou como improdutivo. Só assim será possível demonstrar que a atuação estatal foi eivada de nulidade e só assim será possível desconstituir a presunção de validade do Decreto Presidencial e do laudo administrativo.” (sem grifos no original)
Nessa seara, os i. Procuradores Federais Natalya Caboclo e Josely Trevisan Massuqueto[6] indicam elementos importantes para a contemporaneidade acima exposta. Com efeito, segundo os i. servidores públicos federais, a prevalência do laudo de vistoria elaborado pelos servidores do INCRA está atrelada à homenagem da presunção de veracidade e legitimidade de que gozam os atos praticados por servidores públicos e, mais, nos termos ventilados no Estudo que elaboraram, faz-se imprescindível a prevalência da tese de contemporaneidade das perícias. A respeito, seguem alguns do Estudo:
“(…) a perícia judicial realizada nestes pleitos de antecipação probatória “não é contemporânea à vistoria do Incra, ou seja, não se reporta ao mesmo período de tempo avaliado pela Autarquia na vistoria administrativa. (…) É a tese da contemporaneidade das perícias, já que o cumprimento ou não da função social é uma condição transitória, podendo variar de um tempo para outro.” É inaceitável o entendimento pugnado pelos proprietários rurais pela realização de perícias atualizadas, em total desconsideração ao tempo real apurado na vistoria administrativa efetuada pela Autarquia e que concluiu pela improdutividade do bem de raiz. Mas especialmente frustrante é a percepção de que o Poder Judiciário, a quem cabe dizer o melhor direito, acolhe este tipo de argumentação, ignorando que, em não se constatando vício ou defeito no ato administrativo de vistoria realizado pelo Incra, devem prevalecer os resultados da fiscalização ali obtidos, visto que apurados por órgão encarregado da execução de um programa nacional de reforma agrária. Se um tal entendimento não encontra eco nas esferas judiciais, pelo menos a perícia judicial deveria se reportar à análise dos dados referentes ao mesmo período de tempo valorado pelo Incra, “única maneira de apurar, isto é, constatar, se naquele período vistoriado pela Autarquia o imóvel seria realmente improdutivo” (sem grifos no original)
Acolhendo essa tese da contemporaneidade, bem entendeu o juízo de primeira instância, ao prolatar a sentença nos autos n.º 0001540-24.2010.403.6108, em trâmite junto à 1ª Vara da Subseção Judiciária em Bauru/SP[7], consoante se pode inferir de partes do julgado:
“(…) Deixou o jus perito de considerar a situação existente na “Fazenda Retiro” quando da vistoria do INCRA, dado que totalmente impertinente tomar-se em consideração a situação de fato observada apenas quando da perícia judicial.
Deveras, eventual modificação das condições de exploração econômica do imóvel rural, realizada após a vistoria da autarquia agrária, é, por dicção legal (artigo 2º, § 4º, da lei de regência, irrelevante.
Frágil e insuficiente a prova produzida pela autora, e diante da presunção de veracidade dos atos administrativos levados a efeito pelos agentes do INCRA, não há como se afastar a descrição feita da área em debate, constante do laudo agronômico de fiscalização: “regeneração de vegetação nativa, brotação de eucalipto e vestígios de capim para pastagem. O pouco capim para pastagem existente nestas áreas não apresenta capacidade de suporte para o gado. Existem diversas fotos (23 a 26) que podem elucidar esta situação” (fls. 47 e 68/69 do apenso I). As fotos, diga-se, são prova concreta da inexistência de pastagens, no local.” (com negrito no original)
No mesmo sentido, decidiu o Egrégio Tribunal Regional Federal da 3ª Região, em julgados recentemente publicados e que vêm justamente a confirmar os argumentos de defesa da Autarquia Agrária, senão vejamos:
1) AÇÃO DECLARATÓRIA DE PRODUTIVIDADE DE IMÓVEL RURAL, ANTES RECONHECIDO – EM PROCESSO ADMINISTRATIVO DO INCRA – COMO IMPRODUTIVO PARA FINS DE REFORMA AGRÁRIA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. MATÉRIAS PRELIMINARES LEVANTADAS NA APELAÇÃO DO AUTOR (SUPERVENIENTE CADUCIDADE DO DECRETO EXPROPRIATÓRIO; CERCEAMENTO DE DEFESA DIANTE DA NÃO REALIZAÇÃO DE AUDIÊNCIAS E FALTA DE MOTIVAÇÃO DA SENTENÇA) AFASTADAS. PERÍCIA JUDICIAL PARA AFERIÇÃO DE PRODUTIVIDADE DE IMÓVEL RURAL DEVE LEVAR EM CONTA A MESMA ÉPOCA EM QUE O INCRA REALIZOU A SUA VISTORIA. ILEGALIDADE DA POSTERIOR ALTERAÇÃO DAS CONDIÇÕES DE APROVEITAMENTO DO IMÓVEL, FEITA PELO DONO DA “FAZENDA COLÔMBIA”, POR OFENSA AO § 4º DO ARTIGO 2º DA LEI Nº 8.629/93.RECURSO IMPROVIDO. 1. O Instituto Nacional de Reforma Agrária – INCRA com base em “Vistoria de Levantamento Preliminar de Dados e Avaliação” efetuada em 25 de setembro de 1998, expediu ofício datado de 09 de outubro de 1998 comunicando ao proprietário que “o imóvel foi reclassificado de produtivo para imóvel que não atingiu o índice previsto no parágrafo 1º do artigo 6º da Lei nº 8.629 de 25 de fevereiro de 1993, alterada pela Medida Provisória nº 1577, de 11 de junho de 1998“. Para essa reclassificação o levantamento do INCRA levou em consideração o ano civil de 1997. Em 18 de novembro de 1999 foi expedido Decreto de lavra do Sr. Vice-Presidente da República no qual declarou o interesse social, para fins de reforma agrária do referido imóvel rural, nos termos dos arts. 18, letras “a”, “b”, “c” e “d” e 20, inciso VI, da Lei nº 4.504, de 30 de novembro de 1964, e 2º da Lei nº 8.629, de 25 de fevereiro de 1993. 2. Ação declaratória ajuizada com o escopo de ser declarado que o imóvel rural denominado “Fazenda Colômbia/Fazenda Água Fria”, é produtivo, afirmando a parte autora que o mesmo não poderia ser desapropriado por interesse social para fins de reforma agrária, já que iniludivelmente se trata de imóvel insuscetível dessa constrição. 3. Em relação à suposta caducidade do Decreto Expropriatório em face do decurso do prazo de dois anos para o ajuizamento da ação de desapropriação, esta Corte Regional já decidiu que não pode valer o reconhecimento de caducidade do Decreto Expropriatório quando o obstáculo à eficácia do ato do Presidente da República deriva de atitude do expropriado. Precedente: TRF/3ª Região, 1ª Turma, AC n° 90.03.004962-9, rel. Desembargador Federal Silveira Bueno, DOE DATA:01/07/1991 PÁGINA: 77. No mesmo sentido, precedentes do STJ (REsp 779.891/MG, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 14/12/2010, DJe 30/03/2011 – RMS 11.638/BA, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 18/05/2000, DJ 19/06/2000, p. 114) 4. Na singularidade do caso, o proprietário da “Fazenda Colômbia”, ao ajuizar a ação declaratória de produtividade do imóvel, apresentou pleito incidental de suspensão do processo administrativo tendente a expropriação – inclusive suspensão dos efeitos do Decreto Expropriatório – , o que foi indeferido pelo MM. Juiz Federal de Primeira Instância, conforme se verifica de decisão datada de 8 de maio de 2000 (fls. 634/635). Entretanto, no agravo de instrumento n° 2000.03.00.024586-9, distribuído a 1ª Turma em 25 de maio de 2000, obteve do então relator singela decisão, em 6 de junho de 2000, que concedeu efeito suspensivo ativo tal como postulado no agravo para suspender o processo administrativo (fl. 266 dos autos) que se encontram em apenso. Tal suspensão vigoraria até que uma perícia judicial resolvesse se o imóvel era ou não produtivo. O recurso foi submetido a julgamento pela 1ª Turma em 11 de dezembro de 2001 e à unanimidade o colegiado deu provimento ao agravo de instrumento conforme o voto do Relator e julgou prejudicado o agravo regimental (fl. 308 do apenso). Esse acórdão enfrenta recurso especial retido ajuizado pelo INCRA. 5. Típico caso em que um obstáculo judicial oposto pelo expropriado obteve sucesso e impediu o Poder Público competente de instrumentalizar o processo expropriatório; ou seja, em favor do proprietário de imóvel declarado como improdutivo para fins de reforma agrária, já existindo Decreto Presidencial competente, as ações administrativas do INCRA foram obstadas pelo Judiciário em sede de agravo de instrumento onde se deu efeito suspensivo ativo que resultou em impedir-se o prosseguimento da expropriação até que o Judiciário resolvesse sobre a produtividade da “Fazenda Colômbia” para isso se valendo de perícia judicial. A sentença sobreveio, manteve o reconhecimento de improdutividade da “Fazenda Colômbia”, e enfrenta apelação do seu proprietário Isidoro Vilela Coimbra que foi recebida no duplo efeito (fl. 1.320) razão pela qual o comando judicial não é definitivo. Sendo assim, nem de longe se pode cogitar de caducidade do Decreto Expropriatório. Razão para isso: o Poder Judiciário não pode ser utilizado para manobras protelatórias ou que inviabilizem a implementação de direitos e obrigações previstos na Constituição e nas leis do País (REsp 779.891/MG, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 14/12/2010, DJe 30/03/2011). 6. Não tem cabimento declarar suposta caducidade do Decreto Expropriatório em sede de demanda ajuizada exclusivamente contra o INCRA – autarquia federal – porque o exame da pretendida caducidade do ato administrativo, expedido conforme permissivo constitucional, se reconhecida, resultaria em invalidar ato da Presidência da República que, de rigor, deveria ser contestado por meio de “writ” interposto em Corte Superior. Ainda, não haveria como se debruçar amplamente sobre o tema em sede de ação comum de cognição sem que a União Federal – pessoa jurídica pública diversa do INCRA – fosse chamada aos autos, o que é inviável tendo em conta o princípio da estabilização subjetiva da lide. 7. Ausência de nulidade da sentença em face da não realização de audiência preliminar e da audiência de instrução e julgamento. Matéria alegada somente após a sentença desfavorável, o que retira eficácia da argüição (STJ – EDcl no REsp 749.895/AL, Rel. Ministro CARLOS FERNANDO MATHIAS (JUIZ FEDERAL CONVOCADO DO TRF 1ª REGIÃO), QUARTA TURMA, julgado em 26/08/2008, DJe 22/09/2008). Ainda quanto a primeira: (a) se a demanda consubstancia-se em ação de conteúdo declaratório onde, a rigor, não se vislumbra direito suscetível de transação, como é o caso da matéria tratada nos autos (improdutividade de imóvel que com isso fica sujeito a expropriação-sanção), tal audiência é desnecessária (STJ – RESP n° 23.923/MG, TERCEIRA TURMA, rel. Min. NILSON NAVES, j. 10/5/93, DJU de 14/6/93); (b) não se verifica qualquer prejuízo para o autor, uma vez que o INCRA em momento algum abriu espaço para conciliação. 8. Não se entrevê nulidade na não realização da audiência de instrução e julgamento no Juízo da causa, porque a prova oral devia ser colhida por precatória (prova de fora da terra) e os demais atos próprios da audiência – no caso, os debates – não seriam essenciais para o desate da causa. 9. Sentença adequadamente fundamentada que, com análise das questões invocadas pelas partes, foi obediente ao artigo 458 do Código de Processo Civil. 10. Vistoria do INCRA realizada com base no ano civil de 1997, afirmando tratar-se de imóvel improdutivo; laudo do perito judicial que qualificou a mesma área rural como “totalmente produtiva”, conforme dados coletados em vistoria feita nos meses de julho e agosto de 2001. Prova testemunhal reveladora de que o proprietário atuou significativamente para alteração das condições de aproveitamento da fazenda depois que o INCRA a classificou como improdutiva. 11. A aferição da produtividade do imóvel tem que guardar correlação com a data em que foi feita a vistoria pelo INCRA, pois foi naquele momento que a “Fazenda Colômbia” foi considerada improdutiva, ou seja, não enquadrada nos índices de produtividade exigidos pela legislação vigente. Se na época em que foi feita a “Vistoria de Levantamento Preliminar de Dados e Avaliação” pelos técnicos do INCRA (1997) foi constatado que o imóvel não cumpria a sua função social, amoldando-se ao comando do artigo 184 da Constituição Federal (grande propriedade improdutiva), a aferição feita pelo perito judicial vários anos depois (2001) não é suficiente para fazer com que se despreze a prova técnica elaborada pela Autarquia Federal, até porque admiti-lo seria contrariar o texto expresso da lei. 12. Tem-se em demérito do pleito inicial a conduta posterior do proprietário da área, que inovou as condições de exploração do imóvel após a vistoria desfavorável feita pelo INCRA nos termos do §4º do artigo 2º da Lei nº 8.629/93. Somente o imóvel que já era produtivo ao tempo da perícia administrativa é que fica imune a expropriação-sanção; aquele que é “transformado” em produtivo anos depois, permanece sujeito aos rigores da reforma agrária 13. Matéria preliminar repelida; apelação improvida. (sem destaques no original)(AC 199961020149782, JUIZ JOHONSOM DI SALVO, TRF3 – PRIMEIRA TURMA, DJF3 CJ1 DATA:10/06/2011 PÁGINA: 296.)
2) AÇÃO DECLARATÓRIA DE PRODUTIVIDADE DE IMÓVEL RURAL, ANTES RECONHECIDO – EM PROCESSO ADMINISTRATIVO DO INCRA – COMO IMPRODUTIVO PARA FINS DE REFORMA AGRÁRIA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. MATÉRIAS PRELIMINARES LEVANTADAS NA APELAÇÃO DO AUTOR (SUPERVENIENTE CADUCIDADE DO DECRETO EXPROPRIATÓRIO; CERCEAMENTO DE DEFESA DIANTE DA NÃO REALIZAÇÃO DE AUDIÊNCIAS E FALTA DE MOTIVAÇÃO DA SENTENÇA) AFASTADAS. PERÍCIA JUDICIAL PARA AFERIÇÃO DE PRODUTIVIDADE DE IMÓVEL RURAL DEVE LEVAR EM CONTA A MESMA ÉPOCA EM QUE O INCRA REALIZOU A SUA VISTORIA. ILEGALIDADE DA POSTERIOR ALTERAÇÃO DAS CONDIÇÕES DE APROVEITAMENTO DO IMÓVEL, FEITA PELO DONO DA “FAZENDA COLÔMBIA”, POR OFENSA AO § 4º DO ARTIGO 2º DA LEI Nº 8.629/93. RECURSO IMPROVIDO. (…) 10. Vistoria do INCRA realizada com base no ano civil de 1997, afirmando tratar-se de imóvel improdutivo; laudo do perito judicial que qualificou a mesma área rural como “totalmente produtiva”, conforme dados coletados em vistoria feita nos meses de julho e agosto de 2001. Prova testemunhal reveladora de que o proprietário atuou significativamente para alteração das condições de aproveitamento da fazenda depois que o INCRA a classificou como improdutiva. 11. A aferição da produtividade do imóvel tem que guardar correlação com a data em que foi feita a vistoria pelo INCRA, pois foi naquele momento que a “Fazenda Colômbia” foi considerada improdutiva, ou seja, não enquadrada nos índices de produtividade exigidos pela legislação vigente. Se na época em que foi feita a “Vistoria de Levantamento Preliminar de Dados e Avaliação” pelos técnicos do INCRA (1997) foi constatado que o imóvel não cumpria a sua função social, amoldando-se ao comando do artigo 184 da Constituição Federal (grande propriedade improdutiva), a aferição feita pelo perito judicial vários anos depois (2001) não é suficiente para fazer com que se despreze a prova técnica elaborada pela Autarquia Federal, até porque admiti-lo seria contrariar o texto expresso da lei. 12. Tem-se em demérito do pleito inicial a conduta posterior do proprietário da área, que inovou as condições de exploração do imóvel após a vistoria desfavorável feita pelo INCRA nos termos do §4º do artigo 2º da Lei nº 8.629/93. Somente o imóvel que já era produtivo ao tempo da perícia administrativa é que fica imune a expropriação-sanção; aquele que é “transformado” em produtivo anos depois, permanece sujeito aos rigores da reforma agrária (…)” (sem destaques no original)
(TRF 3ª Região – 1ª Turma. AC 965589. Rel. Des. Fed. Johonsom Di Salvo. Julgado em 24/05/2011)
Ainda sobre o polêmico tema, citem-se relevantes precedentes, proferidos pelo Egrégio Tribunal Regional Federal da 5ª Região, a saber:
1) AÇÃO DECLARATÓRIA DE PRODUTIVIDADE RURAL. COMPETÊNCIA. PERÍCIA JUDICIAL PARA AFERIÇÃO DE PRODUTIVIDADE DE IMÓVEL RURAL DEVE LEVAR EM CONTA A MESMA ÉPOCA EM QUE O INCRA REALIZOU A SUA VISTORIA. 1. No caso, não se trata de insurgência judicial contra pura e simplesmente o ato do Presidente da República, o que poderia ser feito através do mandado de segurança, cuja competência para apreciar e julgar recairia ao STF, mas na verdade de discussão judicial sobre as conclusões do laudo administrativo realizado pelo INCRA. 2. O cerne da presente lide consiste em saber se a perícia técnica judicial realizada quase dez anos após a classificação fundiária do imóvel desapropriado, efetuada pelo INCRA, é elemento suficiente para desconstituir a conclusão administrativa acerca de eventual (im)produtividade do imóvel. 3. O que é requerido do Poder Judiciário é a análise sobre a legalidade do ato administrativo de então, sendo relevante se os fatos que embasaram tal ato são diversos dos apurados hoje. Entender o contrário seria, salvo melhor juízo, dar uma oportunidade, não prevista em lei, para todo e qualquer proprietário de imóvel, em face de desapropriação, alterar a situação fática do imóvel logo após a vistoria administrativa, de forma a forçar uma “perda superveniente do objeto” do Decreto Expropriatório. Tal situação geraria instabilidade jurídica inadmissível e desvirtuaria o propósito previsto na Constituição Federal quando dispôs sobre a possibilidade de sanção pela improdutividade de grandes imóveis rurais. 4. Consta nos autos apenas prova de safra de cana de açúcar a partir de 2002, conforme quadro detalhado (f. 375), da perícia realizada na Ação Cautelar n. 2003.83.00.022291-5. Tal informação é compatível com a informação do perito, de que seriam necessários cerca de dois/três anos para tornar a propriedade produtiva após a vistoria do INCRA em 1999 (f. 453 da Ação Cautelar). Desta feita, observa-se que não foi objetivamente refutada, com dados concretos, a avaliação para fins de classificação fundiária feita pelo INCRA em 1999 e que conduziu à inserção do imóvel no Programa de Reforma Agrária. 5. Apelação e remessa oficial providas. (sem destaques no original)(APELREEX 200383000271756, Desembargadora Federal Cíntia Menezes Brunetta, TRF5 – Terceira Turma, DJE – Data::23/08/2012 – Página::476.)
2) ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. DESAPROPRIAÇÃO PARA FINS DE REFORMA AGRÁRIA. VISTORIA REALIZADA PELO INCRA. ALEGAÇÃO DO AGRAVADO DE PRODUTIVIDADE SUPERVENIENTE. REQUERIMENTO DE NOVA VISTORIA. IMPOSSIBILIDADE. MODIFICAÇÕES POSTERIORES AO LAUDO NÃO TÊM O CONDÃO DE SUSPENDER A DESAPROPRIAÇÃO DO IMÓVEL. OBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS DA SEGURANÇA JURÍDICA E DA EFETIVIDADE. PELO PROVIMENTO DO AGRAVO. (..)
3. As modificações posteriores ao laudo do agravante não têm o condão de suspender a desapropriação do imóvel, não se tendo como inquinar de ilegal ou caduco o ato administrativo de vistoria, ante a observância dos princípios da legalidade e legitimidade que devem prevalecer na ausência de prova robusta em contrário.
4. Ademais, a pretensão do agravado esbarra no princípio constitucional da segurança jurídica e da efetividade, impedindo-se que o expropriado, após vistoria no seu imóvel que constata a improdutividade, promova atos tendentes a descaracterizar, muitas vezes temporariamente, a natureza improdutiva do imóvel, impossibilitando que o Estado promova a reforma agrária, necessária ao bem estar social, econômico e jurídico da sociedade. Precedente deste eg. Tribunal.
5. Agravo de instrumento provido. (sem destaques no original)
(TRF 5ª Região – 1ª Turma. AGTR 126264-RN. Rel. Des. Fed. Francisco Cavalcanti. Julgado em 26/09/2012. – Decisão unânime – Presentes da Sessão: Desembargadores Francisco Cavalcanti, José Maria Lucena e Manoel Erhardt)
3) ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO PARA FINS DE REFORMA AGRÁRIA. NULIDADE DO DECRETO EXPROPRIATÓRIA. PRODUTIVIDADE DE IMÓVEL RURAL. CONDIÇÃO À ÉPOCA DA VISTORIA. ADMINISTRATIVA. APELAÇÃO NÃO PROVIDA.(…) 2. O perito concluiu, na vistoria realizada em setembro de 2003, pela correta classificação do imóvel pelo INCRA como improdutivo e, ademais, a conclusão do INCRA foi corroborada pelo IBAMA, ao elaborar o Laudo de Vistoria Técnica para licença de desmatamento em novembro de 2004.3. Incabível no caso a declaração de nulidade do decreto presidencial que declarou o imóvel de interesse social para fins de reforma agrária, pois o laudo pericial que concluiu pela produtividade atual do imóvel, foi realizado em momento posterior a vistoria administrativa e ao próprio decreto expropriatório.4. Não há como inquinar de ilegais os atos administrativos de vistoria e o próprio ato expropriatório, ante a observância dos princípios da legalidade e legitimidade que devem prevalecer na ausência de prova robusta de sua ilegalidade.5. A pretensão esbarra no princípio constitucional da segurança jurídica e da efetividade, impedindo-se que os expropriados, após vistoria nos seus imóveis que constatam a improdutividade, promovam atos tendentes a descaracterizar, muitas vezes temporariamente, a natureza improdutiva do imóvel, impossibilitando que o Estado promova a reforma agrária, necessária ao bem estar social, econômico e jurídico de uma sociedade, especificamente em um país como o Brasil onde os conflitos de terra são evidentes e merecem atenção redobrada dos governantes. 6. Precedentes: TRF5, AC441897/PE, DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO BARROS DIAS, Segunda Turma, Julgamento: 08/09/2009, DJE 17/09/2009; TRF5, AC538897/PE, DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO BARROS DIAS, Segunda Turma, Julgamento: 05/06/2012, DJE 07/06/2012).7. Apelação não provida. (sem destaques no original)
(TRF 5ª Região – 2ª Turma. AC 543199-PE. Rel. Des. Fed. conv. Walter Nunes da Silva Junior. Decisão unânime. Julgado em 17/07/2012)
Conclusão
Conforme exposto neste estudo, a desapropriação-sanção visa dar efetividade às normas constitucionais e conferir predominância a princípios e valores elencados pelo Estado Democrático de Direito como fundamentais para se obter uma sociedade livre, justa e solidária, com menos desigualdades sociais e maior crescimento sócio-econômico. Para tanto, o Estado pune as propriedades improdutivas e especulativas, não cumpridoras de sua função social, e, assim, busca transformá-las em propriedades rurais economicamente produtivas, redutos de recuperação ambiental e de funcionalização social, verdadeiros vetores da tão almejada justiça social.
Como visto, a desapropriação-sanção está inserida num microssistema normativo da reforma-agrária, cujos dispositivos não podem ser interpretados meramente a partir de parâmetros da processualística ordinária, de aplicação subsidiária às normas de caráter especial, como as do rito expropriatório. Essa ilação decorre do fato de que a ação de desapropriação imbute valores e princípios muito além do simples procedimento do CPC, de uma sequência objetiva e linear de atos processuais, eis que se destina a concretizar os fundamentos consagrados expressamente na Constituição de 1988 e que devem nortear a atuação do Administrador Público, na consecução de políticas públicas, e do Judiciário, ao apreciar, processar e julgar as causas rurais, como a ora abordada.
Essa conclusão não significa desmerecer a processualística do CPC, nem conferir predominância desmesurada ao Poder Executivo e muito menos em negar acesso dos jurisdicionados expropriados ao Poder Judiciário, mesmo porque, se assim fosse, haveria arbítrio absurdo e a violação de normas de cunho constitucional.
Todavia, especificamente sobre a desapropriação-sanção para fins de reforma-agrária, a exegese constitucional e legal caminha para a predominância das políticas públicas estatais e do respectivo microssistema normativo, da qual se conclui que a produtividade do imóvel a ser considerada é aquela verificada pelo servidor público da Autarquia Federal INCRA, segundo os índices GUT e GEE então apurados, naquele momento específico, quando da elaboração subsequente do Laudo de Avaliação e Vistoria, seja pelo Administrador para a edição do decreto expropriatório, seja pelo Judiciário para a sentença a ser proferida em ação anulatória, declaratória ou a própria expropriatória.
Assim entende- seporque os dispositivos acima explicitados não permitem que se oportunize ao proprietário uma nova chance para tornar o imóvel produtivo e modificar a conclusão estatal, sob pena de se subverter a ordem jurídica e de confrontar seriamente os princípios da efetividade e da segurança jurídica. Com efeito, considerada a contemporaneidade entre as perícias administrativa e judicial, ou seja, o objeto de análise deve se referir aos mesmos elementos espacial e temporal, a única hipótese que permitiria a desconsideração e a anulação do ato estatal se daria quando demonstrado qualquer tipo de vício nulificante. Do contrário, nada há que macule o agente estatal do efetivo cumprimento do múnus constitucional de promover a punição da propriedade descumpridora de sua função social e do dever legal de conferir a plena execução às políticas públicas traçadas pelo Governante como prioritárias em determinado mandato.
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DE MELLO, Celso Antônio Bandeira de Melo. Curso de Direito Administrativo. 11ª edição rev., ampl. e atual. São Paulo: Melhoramentos, 1999;
DIDIER JÚNIOR, Fredie, SARNO, Paula, OLIVEIRA, Rafael. Curso de direito processual civil. 2ª edição. Salvador: Juspodivm, v. 2, 2008;
PUBLICAÇÕES DA ESCOLA DA AGU. Lei Complementar 76/93 comentada pela PFE/INCRA – Escola da Advocacia-Geral da União Ministro Victor Nunes Leal, Ano IV, n.º 20, Brasília: EAGU, 2012, p. 09;
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Disponível em: www.stj.jus.br. Acesso em 28 de outubro de 2014.
Notas
[1] DE MELLO, Celso Antônio Bandeira de Melo. Curso de Direito Administrativo. 11ª edição rev., ampl. e atual. São Paulo: Melhoramentos, 1999, p. 593.
[2] Art. 42. No que esta lei for omissa aplica-se o Código de Processo Civil.
[3] PROPRIEDADE PRODUTIVA E DESAPROPRIAÇÃO: UMA MARCHA LENTA RUMO À MÁXIMA EFETIVIDADE DO TEXTO CONSTITUCIONAL. Disponível no link . Acesso em 26 de outubro de 2014.
[4] A prova nas ações declaratórias de produtividade que visam anular desapropriações para fins de reforma agrária: necessidade de contemporaneidade na avaliação do estado de uso do imóvel rural. Disponível no link . Acesso em 26 de outubro de 2014.
[5] A prova nas ações declaratórias de produtividade que visam anular desapropriações para fins de reforma agrária: necessidade de contemporaneidade na avaliação do estado de uso do imóvel rural. Disponível no link . Acesso em 26 de outubro de 2014.
[6] PROPRIEDADE PRODUTIVA E DESAPROPRIAÇÃO: UMA MARCHA LENTA RUMO À MÁXIMA EFETIVIDADE DO TEXTO CONSTITUCIONAL. Disponível neste link . Acesso em 26 de outubro de 2014.
[7] Disponível neste link . Acesso em 26 de outubro de 2014.
Autor (a): Graziele Mariete Buzanello, bacharel em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (2006), procuradora federal (desde 2007) e pós-Graduada em Direito Tributário pela Universidade Anhanguera-Uniderp (Rede LFG) (2010).
Fonte: www.jus.com.br